Entrevista: Eduardo Vidal-Abarca
A leitura é frequentemente associada aos livros, mas hoje aprender passa por diversos dispositivos e plataformas. Para falar mais sobre os fatores que impulsionam o aprendizado, em especial a leitura, entrevistamos Eduardo Vidal-Abarca, da Universidade de Valência. Psicólogo e pesquisador de renome internacional, o professor é especialista em psicologia da educação e dificuldades de aprendizagem. Confira abaixo o que o ele tem a dizer sobre educação, tecnologia e principalmente, o prazer de aprender.
Dados do Pisa indicam que os estudantes que prestaram o exame em 2009 gostam menos de ler do que o alunos que prestaram o exame em 2000. O senhor acredita que ocorre algo especial com a geração atual?
Eduardo Vidal-Abarca - Os dados do Pisa efetivamente indicam que na maior parte dos países há uma diminuição da leitura entre os adolescentes entre 2000 e 2009, embora essa queda seja mais aguda entre os meninos do que entre as meninas. Por sua vez, o Pisa e outros estudos constatam que a frequência e o gosto pela leitura têm um impacto positivo na capacidade de leitura dos jovens. A pontuação no Pisa manteve-se possivelmente devido a outras melhoras educacionais que devem ter compensado a diminuição da frequência e gosto pela leitura dos nossos adolescentes. Se os hábitos de leitura tivessem sido incrementados durante esse tempo, muito possivelmente a pontuação em leitura, que é um indicador da qualificação do leitor, também teria aumentado.
Pesquisas indicam que os jovens preferem ler em movimento, em computadores ou tablets. Isso lhe parece um problema? Por quê?
Vidal-Abarca - Eu não diria que é um problema. Os computadores, os tablets e os livros eletrônicos possivelmente serão os meios de leitura do futuro. Mais ainda, eu diria que para muitos adolescentes e jovens já são o meio de leitura do presente. Isso apresenta uma questão interessante: a capacidade de leitura no papel é transferível para computadores ou tablets? Em parte sim, mas uma parcela da leitura que não é transferível. A leitura online apresenta a necessidade de outros conhecimentos como, por exemplo, avaliar a credibilidade de suas fontes. Esse é um problema mais grave na leitura digital do que na impressa devido à facilidade da edição de documentos.
Estatísticas do Pisa também apontam que aos 15 anos as meninas costumam ler mais que os meninos. É possível explicar essa diferença?
Vidal-Abarca - Não há uma explicação única e simples para essa diferença. É possível que haja diferenças culturais associadas ao gênero: os meninos são mais fãs dos esportes do que as meninas. Além dessa explicação, todos os testes psicológicos indicam que as meninas têm maior qualificação verbal e os meninos mais competência viso-espacial. É possível que essa maior qualificação verbal leve-as a entender as narrativas melhor, e que esse maior prazer anime-as a ler mais, o que resulta no aumento de sua qualificação verbal? Eu diria que sim. Isso pode se manifestar de outras formas. Por exemplo, as meninas costumeiramente conversam mais com as amigas que os meninos.
Você crê que hoje os estudantes têm novos hábitos de leitura? Como os professores podem trabalhar e incentivar a leitura a partir dos novos hábitos?
Vidal-Abarca - A leitura é um hábito muito recente na história da humanidade. Há não muitas décadas, saber ler era privilégio de poucos. Estamos chegando a uma situação em que saber ler se tornou imprescindível para fazer muitas coisas que hoje nos parecem normais. Eu diria que se lê "por necessidade" mais do que nunca, embora nem sempre se leia por prazer. Hoje é necessário ser um leitor competente, embora não se leia muito literatura. Eu diria que junto da leitura por prazer, os professores devem preocupar-se em incrementar as situações de leitura funcional de seus alunos. Criar situações em que seja necessário ler, compreender e usar as informações com propósitos muito variados deveria ser um objetivo central do ensino.
O hábito da leitura dos jovens no Pisa foi relacionado diretamente com o êxito profissional. Como a leitura pode ajudar na carreira adulta?
Vidal-Abarca - Qualquer trabalho, e não só aqueles que têm uma notável carga intelectual, requer o manuseio de documentos escritos. A tecnologia está cada vez mais presente em todos os trabalhos. Que trabalho não requer o uso de um computador? Eu creio que poucos ou nenhum. Se uma pessoa não sabe usar esse tipo de informação não pode fazer quase nada. A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), consciente dessa questão, promoveu um programa para idade adulta chamado PIAAC (Programa Internacional para a Avaliação das Competências dos Adultos, na sigla em inglês). Os resultados do programa seguramente poderão ser conhecidos no final de 2013. A leitura se converteu na qualificação básica no mundo de hoje.
Os tablets podem romper ou terminar com a leitura tradicional de livros?
Vidal-Abarca - Como dizia antes, eu creio que a leitura em dispositivos digitais vai ser a leitura do futuro porque dá uma infinidade de possibilidades de interação que a leitura no papel não permite: ir de uma fonte de informação a outra, consultar dados online ou fontes documentais. Acessar documentos de forma rápida está se tornando uma possibilidade que, uma vez experimentada, dificilmente será deixada de lado. Me parece que cada dispositivo cumpre uma função diferente. O interessante, do ponto de vista da alfabetização, é que os tablets requerem uma alfabetização específica que os e-books não requerem. A escola deveria preocupar-se com a alfabetização nesses novos meios de leitura.
Como os pais e as mães podem desenvolver e impulsionar o gosto pela leitura nas crianças pequenas?
Vidal-Abarca - Os pais e as mães farão muito bem se lerem com seus filhos desde cedo. Se os filhos virem que os pais gostam das histórias, entrando na pele de personagens, vivendo a vida de outra pessoas, eles mesmos se afeiçoarão à literatura. Essas práticas poderiam ser complementadas com situações funcionais para as crianças. Os pais poderiam mostrar a utilidade da leitura em todas essas situações, lendo conjuntamente com seus filhos. Acho importante que os pais ensinem aos seus filhos seu gosto e sua utilidade. Ambos, gosto e utilidade, se complementam.
Vidal-Abarca - Como dizia antes, eu creio que a leitura em dispositivos digitais vai ser a leitura do futuro porque dá uma infinidade de possibilidades de interação que a leitura no papel não permite: ir de uma fonte de informação a outra, consultar dados online ou fontes documentais. Acessar documentos de forma rápida está se tornando uma possibilidade que, uma vez experimentada, dificilmente será deixada de lado. Me parece que cada dispositivo cumpre uma função diferente. O interessante, do ponto de vista da alfabetização, é que os tablets requerem uma alfabetização específica que os e-books não requerem. A escola deveria preocupar-se com a alfabetização nesses novos meios de leitura.
Como os pais e as mães podem desenvolver e impulsionar o gosto pela leitura nas crianças pequenas?
Vidal-Abarca - Os pais e as mães farão muito bem se lerem com seus filhos desde cedo. Se os filhos virem que os pais gostam das histórias, entrando na pele de personagens, vivendo a vida de outra pessoas, eles mesmos se afeiçoarão à literatura. Essas práticas poderiam ser complementadas com situações funcionais para as crianças. Os pais poderiam mostrar a utilidade da leitura em todas essas situações, lendo conjuntamente com seus filhos. Acho importante que os pais ensinem aos seus filhos seu gosto e sua utilidade. Ambos, gosto e utilidade, se complementam.
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Fonte: http://www.clicrbs.com.br/especial/rs/precisamosderespostas/pagina,0,0,0,0,Eduardo-Vidal-Abarca.html
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