Johnson inspirou-se na leitura de dois livros de
Paulo Coelho,
bastante populares, que
o inspiraram a fazer a peregrinação
de Santiago de Compostela, em 1999,
para dar nome a seu fundo.
Desde o começo dos anos 2000, o mundo enfrenta uma constante batalha
entre forças deflacionárias e inflacionárias. As forças de mercado, se
deixadas livres, certamente puxariam os preços para baixo de forma
acentuada, promovendo o que para alguns é um necessário ajuste de contas
depois de anos de crescimento baseado em endividamento e uma
desregulamentação financeira que permitiu a criação e concessão de
crédito "do nada".
No entanto, os mercados não são completamente livres de influências.
Os bancos centrais do mundo lutam contra essa força deflacionária. Sua
resposta tem sido justamente a inflação, sob as mais variadas formas:
inflam seus balanços, e tentam inflar os preços de ativos, a demanda, a
concessão de crédito. Tanto quanto podem, procuram influir sobre a
confiança do consumidor e do empresariado.
O presidente de um novo fundo de hedge, Santiago Capital, baseado em
San Francisco, encontrou uma forma interessante de ilustrar essa
batalha. Em um vídeo (disponível em http://www.zerohedge.com/news/gold-and-grand-theft-economics),
Brent Johnson, que tem 40 anos, metade dos quais vividos no setor
financeiro, com passagem pelo Credit Suisse e outras casas
especializadas em gerenciamento de grandes fortunas, mostra que as
forças de deflação e inflação são como placas tectônicas. Estão sempre
se atritando e, de quando em quando, sem o menor aviso, uma se sobrepõe à
outra e o resultado é um terremoto de proporções devastadoras.
Um exemplo é a crise de 2008. As autoridade monetárias acreditavam
que tinham tudo sob controle. "Este é um sistema bancário seguro, um
sistema forte. Esta é uma situação bastante gerenciável", disse Hank
Paulson, então secretário do Tesouro dos Estados Unidos, em 20 de julho
de 2008.
De repente, as coisas mudaram: "O mercado de crédito ainda está
frágil e congelado. A segurança financeira de todos os americanos
depende da nossa capacidade de restabelecer nossas instituições
financeiras". A frase é do mesmo Paulson, em 19 de setembro de 2008.
Paulson já saiu de cena, mas é possível dar outro exemplo de alguém
que ainda está na ativa. Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve
(Fed), dizia em 16 de julho de 2008: "Fannie Mae e Freddie Mac [grandes
instituições do sistema hipotecário americano] vão passar pela
tempestade, sem perigo de tombar. Estão adequadamente capitalizados". Em
8 de setembro, as manchetes anunciavam que Fannie Mae e Freddie Mac
tinham sido nacionalizadas.
O que Johnson faz em seu vídeo é lembrar que terremotos massivos não
são precedidos por alarmes ou avisos prévios. Não é o caso de acreditar
que "desta vez é diferente", título com um toque de ironia do livro em
que Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart recontam 800 anos de insensatez
financeira. Os dados sobre a Grécia são particularmente interessantes.
Na avaliação de Johnson, o sistema financeiro não foi projetado para
lidar com deflações, ou seja, aumentos expressivos nos balanços dos
bancos centrais, resultado de injeções de recursos na economia, têm de
continuar indefinidamente, para manter o sistema acima da linha d'água.
"Vivemos em um tempo no qual o balanço dos oito maiores bancos centrais
subiu para US$ 7 trilhões e a base monetária, em dólares, subiu 300% em
quatro anos", diz.
Só ó Fed, desde 2008, ampliou seu balanço em US$ 2,5 trilhões. E o
mercado está sempre na expectativa de nova elevação, porque a economia
continua mostrando fraco dinamismo. Além do Fed, o Banco Central Europeu
(BCE) anunciou no começo de setembro que também fará uso da impressora
de euros para lidar com distorções no mercado secundário de dívida
governamental.
A pergunta que se coloca é: qual força tectônica será mais poderosa?
Para Johnson, basta entender que a inflação é necessária para o
sistema sobreviver, e a resposta se torna um pouco mais fácil.
"Redesenhar o sistema para um ambiente deflacionário seria admitir o
fracasso", justifica, lembrando que uma deflação acentuada no preço dos
ativos seria o mesmo que decretar a falência do sistema.
A posição de Johnson pode ser tachada de radical, mas há outros
agentes de mercado com visão semelhante. O expoente é Kyle Bass, que
ganhou fama ao apostar contra o sistema "subprime" americano [créditos
hipotecários de alto risco] e ficar rico, junto com seus investidores do
fundo Hayman Capital. Bass também previu, ainda em 2008, o colapso da
Grécia.
Como Johnson, Bass acredita que as coisas vão piorar muito e ambos
têm a mesma resposta para a pergunta: como se proteger disso tudo?
Simples: compre ouro. Bass também recomenda a compra de armas de fogo,
pois acredita que a dissolução do sistema vai gerar tumulto social sem
precedentes. Ele é uma figura um tanto polêmica. Há uma interessante
descrição sua num livro de Michael Lewis - "Boomerang: Travels in the
New Third World" -, no qual a autor passeia pelos países europeus em
crise e traz boas explicações sobre o que levou a zona do euro para a
beira do abismo.
"As coisas podem se mover
do impossível
ao inevitável
sem
nunca parar
no provável".
- filósofo Alexis de
Tocqueville -
Voltando a Johnson, da Santiago, seu argumento é simples. O ouro
serve de proteção tanto no caso de uma explosão inflacionária quanto em
um terremoto deflacionário. Além de ativo real, o metal é a forma de
dinheiro mais antiga. Seu preço já subiu cerca de 500% nos últimos 12
anos, exatamente a janela de tempo no qual essa briga entre inflação e
deflação está mais evidente.
Outra vantagem do ouro, neste momento, é a relação entre risco e
retorno. Há de se tomar mais risco para ter maior retorno. No momento,
Johnson avalia, essa relação foi quebrada. O ouro pe o ativo de maior
retorno potencial, embora seja o de menor risco conhecido.
"É simples: você acredita em mágica ou em matemática? É impossível
sair de uma crise de dívida tomando mais dinheiro emprestado." Com essa
proposta, Johnson montou seu fundo no começo de 2012 e já tem cerca de
US$ 7 milhões de investidores individuais. O fundo tem sempre 50% de seu
capital em ouro físico. A outra metade é distribuída entre prata
física, ações de mineradoras e dinheiro. O ouro e a prata ficam em
cofres na Suiça e em Cingapura.
Bass, do Hayman Capital, também tem simpatia pelo ouro. Em seu livro,
Michael Lewis ilustra bem o que se quer dizer com "ouro físico". Ao
perguntar o que sua mãe deveria comprar para se proteger da tempestade
vislumbrada pelo gestor, Bass abre a gaveta e joga sobre a mesa uma
barra de ouro.
Como americano, Johnson jamais teve contato com a hiperinflação que
ele prevê, mas diz ter uma boa ideia do que seja isso, pelos relatos de
um "amigo carioca", que contou a ele como se relacionavam o recebimento
do salário e a ida ao supermercado nos anos 1980 aqui no Brasil.
Johnson inspirou-se na leitura de dois livros de Paulo Coelho,
bastante populares, que o inspiraram a fazer a peregrinação de Santiago
de Compostela, em 1999, para dar nome a seu fundo. Mas o lema da casa
tem origem mais nobre. Vem de palavras do filósofo Alexis de
Tocqueville: "As coisas podem se mover do impossível ao inevitável sem
nunca parar no provável".
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