José Eustáquio Diniz Alves
Os autodenominados céticos do clima – aquelas pessoas que acham que não
existe aquecimento global e que os ambientalistas são, simplesmente,
falsos profetas com visões apocalípticas – vivem dizendo que existe
muito espaço no mundo e argumentam que esta história de problema de
população é invenção dos neomalthusianos malvados que querem controlar a
população e, especialmente, limitar a prole do proletariado. Os céticos
do clima costumam dizer que toda a população mundial caberia dentro,
por exemplo, da cidade de São Paulo. Será?
Vamos então fazer as contas. O mundo tem atualmente 7,1 bilhões de
habitantes. A cidade de São Paulo tem uma área de 1.552,986 km2 ou
1.552.986.000 m2 (um bilhão e quinhentos e cinquenta e dois milhões e
novecentos e oitenta e seis mil metros quadrados). Fazendo a divisão,
temos 4,7 pessoas por metro quadrado. Se pussermos estas pessoas em pé,
uma bem do lado da outra, como em um show de um cantor popular ou no
réveillon de Copacabana, poderíamos sim colocar toda a população
mundial, metro por metro, na área da cidade de São Paulo (inclusive nos
morros, no rio Tietê, no parque do Ibirapuera, no aeroporto de
Congonhas, na represa de Guarapiranga, etc.). Mesmo que a população
mundial aumente para 14 bilhões de habitantes ainda caberia na cidade de
São Paulo se todas ficassem juntinhas (9 pessoas por metro quadrado)
como no metrô, em horário de pico. Portanto, os céticos estão certos,
pois toda a população mundial caberia na vertical, ombro a ombro, no
território paulistano.
Mas daí tirar a conclusão de que o mundo não está lotado e que tem
muito espaço vazio no Planeta é um sofisma ou brincadeira sem graça. O
cálculo mostra que toda a população mundial cabe em São Paulo se
colocarmos, teoricamente, 5 pessoas em pé em todos os metros quadrados
da cidade. Mas evidentemente isto só seria possível se houvesse uma
grande terraplanagem para eliminar toda a vegetação, as águas e os
declives dos diversos terrenos. Além disto, ninguém poderia se deitar
para dormir, nem ir ao banheiro e todo mundo precisaria viver de brisa.
Ou seja, mesmo que coubesse, seria irreal e surreal colocar toda a
população mundial em São Paulo. Primeiro porque cada pessoa precisa de
uma cama para dormir, se possível um quarto, no mínimo, poderia
compartilhar um banheiro, uma cozinha, uma sala, uma dispensa, etc. Ou
seja, as pessoas precisam de moradia e toda construção ocupa espaço. As
pessoas também precisam de escola, hospitais, mercadinhos ou
supermercados, farmácias, lojas diversas, áreas de lazer, ruas,
estradas, etc. Ainda tem a energia proveniente das refinarias, do
carvão, dos lagos das hidrelétricas, dos insumos agrícolas para o
biocombustível, etc.
Além disto, o alimento da população mundial vem da agricultura, da
pecuária, da pesca, do extrativismo vegetal e tudo isto requer um espaço
enorme, um território muito superior ao ocupado pelas pessoas. Só de
animais terrestres a humanidade consome por ano 60 bilhões de criaturas
sencientes que são criadas e mortas para satisfazer o apetite humano. A
agricultura precisa de muito terreno para oferecer a ração diária para
os seres humanos e para os animais que viram comida humana.
Há ainda as áreas de mata e de florestas que são responsáveis pela
renovação do ar puro, ao fazer a fotossíntese, transformando o gás
carbônico em oxigênio, essencial para a vida. Por fim, existem áreas que
não são habitáveis como: desertos, montanhas, pântanos, brejos,
mangues, gelos, geleiras, calotas polares, etc. Portanto, não basta
considerar o espaço físico para uma população em pé, colocada lado a
lado.
“A Terra tem o
suficiente para a necessidade de todos, mas não para a ganância de uns
poucos”.
(Mahatman Gandhi)
O mundo tem 510 bilhões de km2 de área total, sendo 148,9 bilhões de
km2 de terra e 361,1 billhões de km2 de água. Portanto, a densidade
demográfica é de menos de um habitante por km2 no mundo, mas como vimos,
nem toda área terrestre é habitável ou pode ser usada para agricultura e
pecuária. Também devem existir áreas destinadas à preservação florestal
e à biodiversidade.
Segundo cálculos da Footprint Network o mundo tem 12 bilhões de
hectares globais de biocapacidade para atender todo o impacto das
atividades antrópicas (equivalente a 120 bilhões de km2 dos 148,9
bilhões de km2 da área terrestre do globo). Porém, a pegada ecológica da
humanidade, de 2,7 hectares globais (gha) per capita, em 2008, já não
coube nas fronteiras planetárias. Ou seja, a população mundial – com seu
consumo e suas atividades econômicas – já ultrapassou os limites da
Terra, pois a pegada ecológica per capita da humanidade era 50% superior
à biocapacidade do Planeta, em 2008.
Desta forma, mesmo que toda a população mundial pudesse caber em pé
na cidade de São Paulo, na prática, não tem cabido nos espaços
biologicamente disponíveis do planeta Terra, quando se considera os
impactos do atual modelo de produção e consumo, excludente e poluidor.
Como disse Mahatma Gandhi, na década de 1940, época em que a população
mundial era de cerca de 2 bilhões de habitantes: “A Terra tem o
suficiente para a necessidade de todos, mas não para a ganância de uns
poucos”.
-------------------------------------
*José Eustáquio Diniz Alves,
Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor
titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da
Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus
pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte: http://www.ecodebate.com.br/2012/08/15/
Nenhum comentário:
Postar um comentário