Fabio Hernandez*
Recebo a visita de meu primo Juan Hernandez.
Publicitário.
Não que seja preguiçoso, não é. Mas está longe também de ser um soldado
da companhia que se voluntaria. Vamos colocar assim: profissionalmente,
é um francês. Você pode varar Paris as 24 horas do dia que não vai
encontrar ninguém de laptop trabalhando num café. Café e bar são para
beber, conversar, flertar para o francês. O trabalho acaba às 5 e ponto.
Revoir.
Juan tem o espírito profissional do francês mesmo tendo ascendência caribenha, como eu.
“Meu chefe é um maluco”, Juan me disse. Tratou antes de conversar de
pegar uma Stella na geladeira. “Ele pensa que a vida é trabalhar,
trabalhar e ainda trabalhar.”
“Quase todo chefe pensa o mesmo”, eu disse. “Ou não seria chefe.”
“Mas há chefes e há o meu chefe, Fabito.” Ele me chama de Fabito, não
sei por quê. É a única pessoa que me chama assim. “Sabe o que ele me
disse outro dia? Que se orgulha de não ter ido ao enterro do avô porque
tinha que trabalhar.”
“Imagino que um dia ele vá ter vergonha disso, se não for um idiota
completo”, eu disse. “Ou vai olhar para os netos e saber que eles não
vão segurar a alça na última homenagem.”
Quem glamourizou no Brasil a idéia de prioridade absoluta para o
trabalho foi o Grupo Garantia, que depois de vôos espetaculares quebrou
no ramo financeiro e acabou se dando bem, com outro nome, no território
rústico da indústria cervejeira. Era e é um conceito importado dos
Estados Unidos. Visto o declínio americano, não deve funcionar tão bem
assim esse modelo. Os banqueiros americanos estão atolados em dívidas e
em antidepressivos.
Juan me olhou com ares visionários, depois de tomar um gole interminável de sua Stella.
“Ele não vai viver o bastante para ter netos”, disse.
É uma possibilidade real, refleti. Conheci muitos casos de pessoas
que morreram de tanto trabalhar, e deixaram órfãos, viúvas e um dinheiro
não aproveitado. Viver do trabalho é bom, mas morrer do trabalho é uma
pena. Miro Juan a caminho da geladeira, para pegar mais uma Stella, e
gosto de saber que ele não vai morrer de tanto trabalhar, com certeza.
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* Escritor cubano
Fonte: DCM acesso 22/08/2015
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