sábado, 4 de junho de 2011

Escolas disputam professores estrangeiros para serem globais

Ensino executivo:
Diretor do MBA da Reims Management School
fala sobre a dificuldade de se encontrar e contratar
um Ph.D experiente disposto a dar aulas.

Luis Ushirobira/valor
Ouellet diz que escolas estão preocupadas em ter Ph.Ds
para ganhar pontos junto às agências de acreditação

Preocupadas em desenvolver um conteúdo mais internacional no currículo de seus cursos de MBA - e assim atender à demanda de alunos cada vez mais globalizados -, as grandes escolas de negócios dos Estados Unidos e da Europa decidiram investir na contratação de professores estrangeiros. Embora o custo de se contratar um Ph.D no exterior seja maior, eles podem adicionar às suas pesquisas um certo grau de regionalismo que contribui para a construção de um conhecimento mais universal.
Essa opinião é de Raymond Ouellet, diretor do MBA da Reims Management School, escola de negócios francesa fundada em 1928. Instalada na charmosa região de Champagne, a 45 minutos de trem de Paris, ela figura entre as 50 melhores da Europa, segundo o ranking do "Financial Times". Persuadir um doutor a mudar de país para ensinar, mesmo que seja em uma cidade tão agradável como Reims, com apenas 230 mil habitantes, é difícil.
Em entrevista ao Valor, durante uma recente passagem por São Paulo, o canadense, que se diz quase francês, destaca que para as agências de acreditação das melhores escolas de negócios do mundo, ter Ph.Ds com publicações acadêmicas relevantes conta muito a favor da instituição. Por isso, a disputa pelos mais renomados é grande. Os que já estão nesse estágio da carreira, porém, são caros, exigem mais tempo para estudar e nem sempre querem ensinar. "É preciso cuidado porque o Ph.D sozinho pode não formar um bom professor", afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Como a globalização influencia as escolas de negócios?
Raymond Ouellet: As escolas de negócios estão se tornando mais globalizadas em todo o mundo. Existe hoje a necessidade de se formar líderes com uma visão mais ampla, que não olhe apenas para o seu próprio país. Os estudantes devem sair de seus países para estudar em outros lugares.

Valor: Essa preocupação em oferecer uma visão mais global se reflete atualmente na composição do quadro de professores?
Ouellet: Sim, acredito que isso seja uma tendência. Uma vez que os estudantes estão se movendo por todo o mundo e tendo novas experiências, tornou-se essencial para as grandes escolas da Europa e dos EUA identificar professores de outras nacionalidades. Isso porque eles trazem um conhecimento diferenciado. No nosso MBA, temos 15 professores, sendo que 10 são estrangeiros ou realizaram parte de seus estudos em outros países.

Valor: É imprescindível que o professor de MBA seja um Ph.D?
Ouellet: Para nós, o importante é que ele tenha credibilidade e experiência prática. Os estudantes desses cursos são do mercado. No MBA "full time" eles têm entre três e quatro anos de experiência. No MBA executivo é necessário ter entre cinco e dez anos de atuação. O papel do professor mudou. É certo que um Ph.D faz pesquisa e pode trazer um novo conhecimento para a classe. Ao mesmo tempo, é preciso que ele seja uma pessoa com habilidade natural para traduzir e dividir essa experiência. Os melhores professores são aqueles com Ph.D, mas que também trabalharam em companhias. Eles são capazes de entender os dois mundos.

Valor: Em seu curso existem muitos professores com Ph.D?
Ouellet: Temos uma mistura, quase 60% são doutores. É preciso ter cuidado, pois o Ph.D sozinho pode não formar um bom professor.

Valor: Então porque existe tanta preocupação em ter doutores nas escolas de negócios?
Ouellet: As agências que fazem a acreditação das melhores escolas de negócios dão muita ênfase na publicação acadêmica dos professores. Contratar alguém sem o título pode colocar a instituição em uma posição difícil, que pode comprometer a sua acreditação no futuro. Nosso curso é acreditado pela Association to Advance Collegiate Schools of Business (AACSB), Equis e Association of MBAs (Anamba).

Valor: Existe muita disputa entre as escolas por esses doutores?
Ouellet: Sim. Essa necessidade de contratar doutores, inclusive, faz com que o preço deles suba. Quanto mais eles publicam, mais caro custam. Claro que o salário varia de escola para escola e depende muito da disciplina. Quem ensina finanças vai ganhar mais que outro da área de recursos humanos ou de marketing. Na nossa escola, a remuneração anual varia entre € 40 mil e € 70 mil.

Valor: Um professor de outro país vai sair ainda mais caro. Mesmo assim vale a pena?
Ouellet: Sem dúvida existe um custo a mais. Ele vai precisar se mudar e isso encarece o processo. Mas existe também muita demanda por professores internacionais. Quando vai para uma escola, o professor quer saber sobre as oportunidades que ela oferece, independentemente de onde ela está localizada. Ele quer ter contato com outros professores internacionais e fazer pesquisas sem o fardo de ter que dar aulas o tempo todo. Eles analisam tudo antes de decidir. Não é fácil convencê-los nem encontrá-los.

Valor: Convencer os mais jovens é mais simples?
Ouellet: Se eu encontro um candidato no início da carreira, por exemplo, que foi treinado em certo país e ainda não publicou, eu sei que ele levará um tempo até produzir textos relevantes. Vou contratar, mas precisarei ter paciência. O Pd.D é apenas um tíquete de entrada na vida acadêmica, eles vão ter que publicar para crescer. Então, para os jovens, é importante trabalhar em uma escola onde seja possível pesquisar e publicar. Só assim eles vão poder se desenvolver e se tornar mais valiosos para o mercado. Convencê-los de que isso é possível é um grande desafio.
Valor: Apenas o fato de ele ser de outro país faz valer essa espera?
Ouellet: Assim como temos que encontrar estudantes ao redor do mundo, também queremos professores internacionais que tornem o programa mais atraente e valioso.

Valor: Quais são os planos da Reims no Brasil?
Ouellet: Em um primeiro momento, queremos organizar uma semana de estudos em São Paulo dentro do nosso MBA executivo, alternando anualmente com a África do Sul. Os alunos visitariam empresas, entenderiam aspectos culturais e realizariam estudos acadêmicos. Já fizemos essa semana de estudos na China, nos EUA e na África do Sul. Está nos nossos planos agora incluir o Brasil e depois ter a Índia alternando com a China anualmente. Gostaríamos de ter parcerias por aqui também. Por enquanto, queremos atrair candidatos para o nosso MBA "full time" de um ano.
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Reportagem por Stela Campos De São Paulo
Fonte: Valor Econômico on line, 01/06/2011

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