Juremir Machado da Silva*
Pela primeira vez, Paulo Coelho e eu concordamos em alguma coisa. Nós
nos conhecemos desde os anos 1980. Resenhei "Brida". Fiz uma entrevista
com ele numa Bienal do Livro de São Paulo. O "mago" declarou a um jornal
inglês que a obra máxima de James Joyce, "Ulisses", se torcida, não
deixa mais do que 140 caracteres, um "twit", de conteúdo. Em resumo,
disse que é pura forma. Concordo. Gosto do experimentalismo de Joyce. Ao
mesmo tempo, reconheço que é ilegível, uma masturbação de linguagem
misturando idiomas e criando neologismos como uma máquina de escrever
desgovernada. Às vezes, não passa de um engenhoso exercício de
datilografia. Escrevi no Twitter que todo escritor brasileiro medíocre e
confuso adora James Joyce. Paulo Coelho, também pelo Twitter, reagiu.
Escreveu: "@juremirm, nunca imaginei que algum dia iria me dar parcialmente razão...". Paulo Coelho admite que está a par das minhas críticas. Também pudera, figuro até mesmo na biografia dele escrita por Fernando Morais. Respondi sinceramente: "@paulocoelho, nesse caso, eu te dou total razão, embora eu goste de Joyce como experimentação formal. Já os discípulos...". Aí é que mora o horror. Os admiradores de James Joyce com pretensões literárias são muito perigosos. Produzem o pior e asseguram que se trata do melhor. Há uma safra brasileira de joyceanos. Aliás, a literatura brasileira anda pelas caronas. Fui examinar a "geração Granta", 20 figurinhas apresentadas por uma revista tribal como os melhores jovens escritores brasileiros. Espremendo todos juntos, sobram 140 caracteres. A escolha teve ajuda do paranaense Cristóvão Tezza, autor de muito livros chatos e de um único sucesso de vendas, "O Filho Eterno", título e abordagem "chupados" de Philippe Forest, em que apresenta um depoimento sofrido e sincero sobre seu filho deficiente.
A literatura é, para usar um conceito do sociólogo Pierre Bourdieu, um campo: um "espaço social estruturado", tem "dominantes e dominados", troféus, distinções, regras, etc. No Brasil, o grupo dominante reveza-se na distribuição e no recebimento dos troféus. Os mesmos ora são jurados ora são candidatos aos prêmios e aos recursos públicos ou privados (turbinados por leis de incentivo). Ganham os que seguem as regras. Um campo cria espaços de consagração e legitimação. Hoje, editoras como Companhia das Letras e Cosac Naify e eventos como a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), dominada pela Companhia das Letras e pela Rede Globo, reúnem a "geração Granta" e os seus mentores. Sempre há brechas. Num campo há mobilidade. Dominados podem tornar-se dominantes. A legitimação do campo passa pela capacidade de demonstrar um pluralismo marginal. Fica democrático.
Paulo Coelho tem muitos defeitos. Escreve mal. Mas tem uma qualidade: leitores. Conseguiu captar o ar de um tempo. O problema dos escritores brasileiros atuais é que escrevem para o próprio campo. Reproduzem-se em cativeiro. Eu prefiro Paulo Coelho à "geração Granta". Entre Paulo Coelho e Cristóvão Tezza, viro esotérico.
Escreveu: "@juremirm, nunca imaginei que algum dia iria me dar parcialmente razão...". Paulo Coelho admite que está a par das minhas críticas. Também pudera, figuro até mesmo na biografia dele escrita por Fernando Morais. Respondi sinceramente: "@paulocoelho, nesse caso, eu te dou total razão, embora eu goste de Joyce como experimentação formal. Já os discípulos...". Aí é que mora o horror. Os admiradores de James Joyce com pretensões literárias são muito perigosos. Produzem o pior e asseguram que se trata do melhor. Há uma safra brasileira de joyceanos. Aliás, a literatura brasileira anda pelas caronas. Fui examinar a "geração Granta", 20 figurinhas apresentadas por uma revista tribal como os melhores jovens escritores brasileiros. Espremendo todos juntos, sobram 140 caracteres. A escolha teve ajuda do paranaense Cristóvão Tezza, autor de muito livros chatos e de um único sucesso de vendas, "O Filho Eterno", título e abordagem "chupados" de Philippe Forest, em que apresenta um depoimento sofrido e sincero sobre seu filho deficiente.
A literatura é, para usar um conceito do sociólogo Pierre Bourdieu, um campo: um "espaço social estruturado", tem "dominantes e dominados", troféus, distinções, regras, etc. No Brasil, o grupo dominante reveza-se na distribuição e no recebimento dos troféus. Os mesmos ora são jurados ora são candidatos aos prêmios e aos recursos públicos ou privados (turbinados por leis de incentivo). Ganham os que seguem as regras. Um campo cria espaços de consagração e legitimação. Hoje, editoras como Companhia das Letras e Cosac Naify e eventos como a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), dominada pela Companhia das Letras e pela Rede Globo, reúnem a "geração Granta" e os seus mentores. Sempre há brechas. Num campo há mobilidade. Dominados podem tornar-se dominantes. A legitimação do campo passa pela capacidade de demonstrar um pluralismo marginal. Fica democrático.
Paulo Coelho tem muitos defeitos. Escreve mal. Mas tem uma qualidade: leitores. Conseguiu captar o ar de um tempo. O problema dos escritores brasileiros atuais é que escrevem para o próprio campo. Reproduzem-se em cativeiro. Eu prefiro Paulo Coelho à "geração Granta". Entre Paulo Coelho e Cristóvão Tezza, viro esotérico.
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor. Colunista do Correio do Povo
juremir@correiodopovo.com.br
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Fonte: Correio do Povo on line, 22/08/2012
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