quarta-feira, 2 de junho de 2010

'Se não pode espalhar, está morto'


Em visita ao Brasil, Henry Jenkins, professor de Ciências Humanas e coordenador do Programa de Estudos de Mídia Comparada do prestigiado Massachusetts Institute of Technology (MIT), se curva ao celular iPhone e ao computador tablet iPad, ambos da Apple. Mas, ao mesmo tempo, faz um alerta: “A minha preocupação é que a nossa comunicação migre para uma plataforma fechada”. Tido como uma referência quando o assunto é a comunicação em diferentes mídias, ele, autor do livro “Cultura da Convergência”, acredita que, como as empresa perderam o controle sobre seu conteúdo, elas não devem criar barreiras de acesso, limitando a informação.

Eis a entrevista.

Como o consumo de conteúdo está mudando com os celulares, como o iPhone?
Essas novas plataformas estão desempenhando papel fundamental na integração do fluxo de mídia em nossas vidas enquanto nos movemos ao longo do dia. A combinação de convergência e mobilidade é sedutora. Comprei um iPhone há um ano. Como tenho apenas um plano local (que funciona apenas nos EUA), tenho ficado perdido. Isso me fez perceber o quanto eu confio naquela ferramenta. Eu era cético de que poderia haver uma “caixa preta” que permite a convergência de mídia. Mas eu acho que não há apenas uma única “caixa preta” que satisfaça as necessidades de mídia de todos os consumidores. Nós temos que misturar e combinar os aparelhos.
O iPhone chegou perto; e do que eu vi do iPad, ele pode chegar ainda mais perto. Mas, na rede, o conteúdo, amador e o feito por empresas de mídia, pode ser bloqueado pela Apple ou por uma outra grande companhia.
É assim que eu me preocupo com a neutralidade da rede. A minha preocupação é que a nossa comunicação migre para uma plataforma fechada. Essas são as questões que precisamos confrontar assim como pensamos a forma que os produtos da Apple então contribuindo para o nosso ambiente de mídia.

Apesar de o conteúdo migrar para todas as plataformas, muitas empresas estão fechando o seu conteúdo. Essa é a tendência?
Nosso lema básico é “se não pode espalhar, está morto”. As empresas já perderam o controle sobre a circulação de seu conteúdo. O público pode fazer o que quiser com o que é produzido e feito.
As empresas podem processar, mas só vai fazer o público ficar mais unido e determinado. E o que as empresas têm de fazer, porém, é voltar para o jogo, envolver o público e facilitar o que eles querem. A essência é descobrir para onde o público está indo e, em seguida, gritar “siga me”. Não vejo como fazer isso com a plataforma fechada, embora eu entenda que se possa querer limitar a circulação de algum conteúdo premium.

Já é possível saber como o público reage com o conteúdo nas redes sociais?
Os consumidores são ativos de diferentes formas através de diferentes canais em torno de diferente conteúdos, mas ainda não há um perfil desses diferentes tipos de público. É evidente que a maioria de nós, de alguma forma, se diverte sendo “passiva”, consumindo conteúdo em vez de produzir. Mas há uma valorização maior de quem é participativo. O conteúdo do Twitter é valorizado porque vem de pessoas como nós porque podemos participar se quisermos. A cultura é diferente no mundo que conhecemos.
Nós podemos participar a qualquer momento (na rede), e escolher quando não fazer, mas, fora da rede, vivemos em uma cultura em que nem todas as vozes são ouvidas.

Mas como as empresas podem perceber isso?
As empresas devem estar atentas ao que os consumidores estão fazendo com o conteúdo de mídia e porquê. É preciso ficar atento ao uso ilegal do conteúdo, mas não para perseguir os piratas e sim identificar sites nos quais a oferta de conteúdo legal não chega.
Essas situações exigem respostas rápidas e flexíveis. Veja o que a ABC fez com o episódio final de Lost (a emissora liberou rapidamente a exibição do episódio em outros países para evitar que o público perdesse o interesse). Num mundo global, não se pode esperar um mês ou dois para transmitir o episódio final porque havia todas essas conversas na internet. As pessoas querem ter acesso ao material ao mesmo tempo em todo o mundo.
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A entrevista é de Bruno Rosa e publicada pelo jornal O Globo, 02-06--2010.

Fonte: IHU online, 02/06/2010

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