sábado, 19 de junho de 2010

O CRESCIMENTO ZERO REALMENTE É NECESSÁRIO

DESAFIO BILL McKIBBEN


A sociedade sempre se sustentou localmente até a Revolução Industrial, quando teve início uma marcha inexorável rumo a economias maiores e centralizadas. Em Eaarth: making a life on a tough new planet, Bill McKibben afirma que agora o crescimento implacável está arruinando o globo, e é a manutenção da riqueza e dos recursos, e não a expansão, que deve ser o novo propulsor da sociedade, ou ela perecerá. Abaixo, o editor Mark Fischetti questiona suas afirmações.

SCIENTIF AMERICAN: Basicamente, sua mensagem é que a humanidade, precisa desistir do crescimento como modus operandi. Por que não podemos apenas crescer de forma mais inteligente?
McKIBBEN: Certamente podemos agir com eficiência, e deveríamos. Mas isso não basta. Estamos afinal atingindo os limites de crescimento sobre os quais as pessoas têm falado desde os anos 70, e o que vemos são mudanças ambientais assombrosas. Poucas pessoas conseguiram aceitar isso.

SA: Um crescimento zero, absoluto, é necessário, ou uma expansão “muito sutil” seria sustentável?McKIBBEN: Não sou um utopista. Não tenho nenhum plano sobre onde o mundo deveria se apoiar. Um número específico não faz parte da análise. Estou mais interessado em trajetórias: o que acontecerá se nos afastarmos do crescimento como resposta a tudo e rumarmos em uma direção diferente. Estivemos tão envolvidos no experimento de crescimento que tentamos pouquíssimas outras opções. Podemos medir a sociedade comm outros meios. Alguns países mensuram a satisfação. Se medirmos o mundo de outras maneiras, o acúmulo individual de riqueza torna-se menos importante.

SA: O sentido subjacente aqui é que grandes sistemas centralizados, monolíticos, de agricultura, energia e outras formas de comércio, impulsionam o crescimento. O senhor está afirmando que grande é ruim?
McKIBBEN: Construímos as coisas em grande escala porque isso permitiu um crescimento mais rápido. A eficiência foi conquistada por meio do tamanho. Não é disso que precisamos agora. Não necessitamos de um cavalo de corrida, criado primorosamente para correr o mais rápido possível mas cujo tornozelo se quebra assim que há uma falha na pista. Precisamos de um cavalo de tração, concebido para ser resistente. Nosso mantra tem de ser a durabilidade, não a expansão.

SA: O vilão é apenas o tamanho, ou a complexidade que ele gera? O senhor afirma que não apenas os bancos, mas as indústrias mais básicas são “grandes demais para fracassar”. Essas instituições devem ser dissolvidas ou extricadas de alguma forma?
McKIBBEN: Os sistemas financeiro, energético e agrícola compartilham grandes similaridades: um número muito reduzido de envolvidos, incrivelmente interligados. Em cada caso, ocorrem efeitos cascata quando algo dá errado; uma torta de frango com legumes que transmite botulismo para 48 estados. Minha casa funciona com painéis solares. Se eles falharem, tenho um problema, mas isso não derrubará a rede de energia no leste dos Estados Unidos.

SA: Então o senhor defende uma volta à dependência local. Mas desde o lançamento do livro O negócio é ser pequeno, de E. F. Schumacher, em 1973, pessoas dedicadas vêm tentando implantar sistemas locais de produção de alimentos e energia ao redor do mundo. Entretanto, muitas regiões ainda enfrentam dificuldades. O que significa “local” em termos dimensionais?
McKIBBEN: Descobriremos o tamanho. Pode ser uma cidade, uma região, um estado. Mas, para encontrar a resposta, precisamos eliminar do nosso atual sistema os subsídios, que distorcem incrivelmente. Eles emitem todo tipo de maus sinais sobre o que deveríamos fazer. Com relação à energia, aprovamos o combustível fóssil durante muito tempo. A situação é ainda mais escandalosa na agricultura. Uma vez que o fluxo de subsídios sequer, poderemos descobrir que escala industrial faz sentido.

SA: Os produtos locais não custam mais caro?
McKIBBEN: Teríamos mais fazendas, que poderiam ser mais intensivas em termos de trabalho, mas isso criaria novos empregos e o fazendeiro ficaria com uma fatia maior do rendimento. Economicamente, propriedades locais eliminam muitos intermediários. Comprar vegetais de empreendimentos agrícolas sustentados pela comunidade (CSA, na sigla inglês) é o meio mais barato para conseguir alimentos. A carne ainda pode ser mais cara, mas, francamente, consumi-la mais moderadamente não é o fim do mundo. A melhor notícia em meu livro é a disseminação, nos últimos anos, de todos os tipos de técnicas agrícolas de pequena escala, engenhosas e eficientes, ao redor do mundo em desenvolvimento.

SA: Parece que a chave, pelo menos para a agricultura local, é ensinar as pessoas a aumentar o rendimento sem utilizar fertilizantes...
McKIBBEN: Sim, e isso depende de onde a pessoa está. Não haverá um único sistema que se espalhará por todo o mundo, do jeito como tentamos difundir a agricultura industrial, baseada em fertilizantes sintéticos. As soluções são muito mais inteligentes que isso. Em vez de disseminar substâncias químicas, que provocam todos os tipos de problemas, estamos desenvolvendo métodos alternativos e meios para difundi-los.

SA: Certo. Mesmo que uma agricultura local funcione, como isso promove a durabilidade em vez do crescimento?
McKIBBEN: Provavelmente, os bens mais importantes que poderemos ter para atingir uma estabilidade em longo prazo, em particular em uma era de revolução ecológica, são solos de boa qualidade. Terras que permitam produzir uma boa quantidade de alimentos, que consigam absorver muita água, já que os índices de chuva estão aumentando de forma constante; solos capazes de reter essa umidade durante os prolongados períodos de seca que estão se tornando mais comuns. Um solo bom é precisamente o que uma agricultura local, de baixo impacto e poucos insumos, constrói e é exatamente o que a agricultura industrial destrói
SA: A dependência local parece atraente, mas de que forma países como os Estados Unidos saem de enormes dívidas sem crescer? O Departamento do Tesouro americano afirma que a única solução indolor é crescer. Necessitamos de um período de transição em que o crescimento elimina a dívida para depois adotar a durabilidade?
McKIBBEN: Bem, “indolor” é apenas adiar. Você sabe: “Pague-me agora ou pague-me depois”. A principal questão política é: podemos fazer com que as mudanças ocorram rápido o bastante para evitar colapsos generalizados, não apenas plausíveis, mas prováveis? Como promoveremos essas transições mais rapidamente do que elas podem ocorrer?

SA: Qual é a primeira e mais importante medida a ser tomada?
McKIBBEN: Mudar o preço da energia para refletir os danos que ela provoca no meio ambiente. Se o combustível fóssil incluísse esse custo, veríamos que esses novos sistemas e transições ocorreriam muito mais rapidamente. Um teto de carbono que eleve seu preço é uma condição sine qua non, indispensável, para conseguir fazer qualquer coisa.

SA: Um preço para o carbono é de difícil persuasão...
McKIBBEN: Não existe uma saída fácil para nossos problemas. Mas o mundo que somos capazes de criar tem qualidades compensatórias, inclusive um senso comunitário muito mais forte e uma conexão mais íntima com outras pessoas... e com o mundo natural. Temos trocado assiduamente, e durante muito tempo, o relacionamento pelo consumo. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos têm se concentrado em construir casas maiores e mais distantes umas das outras. Isso destruiu a comunidade. O americano médio hoje tem metade dos amigos íntimos que um indivíduo há 50 anos. Não é de espantar que, sob qualquer medida, estejamos menos felizes com nossa existência, embora nosso padrão de vida material tenha triplicado. Essa compreensão torna possível imaginar o tipo de mudança de que precisamos. Desistir do crescimento em troca de durabilidade não significa perder tudo. Haverá alguma perda, e haverá algum ganho.
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Para saber Mais sobre essa entrevista visite o site: www.ScientificAmerican.com/mckibbenQA
Fonte: Revista SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL - junho 2010, pp.40/41.

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