segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Brachindians

ALEXANDRE HOHAGEN*
Imagem da Internet
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A educação é uma das
últimas fronteiras do conhecimento
onde não há inovação
há décadas

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ZEITGEIST é um termo em alemão que significa "espírito de um tempo". E é nesse sentido que o Google realiza, há cinco anos, uma reunião para discutir tendências nos mais diferentes campos. Tive a oportunidade de participar de todas essas reuniões. Ouvi desde Martin Sorrell, Bill Clinton, Will.I.Am, Carlos Slim até o relato emocionante do ex-terrorista de origem paquistanesa Maajid Nawaz, que depôs armas para ajudar jovens propensos a entrar na guerra islâmica.
E é assim que o Google organiza essa incomum cesta de ideias, numa curadoria próxima do impecável -é possível conferir todo o conteúdo no site www.zeitgeistminds.com.
A reunião deste ano foi no Arizona, há algumas semanas. Foi a que mais me chamou a atenção, pela diversidade de temas e pela politização das ideias.
Uma ideia da complexidade e riqueza dos temas: o que tem a ver Robert Lang, especialista em origami, com Steve Cousin, fundador da Willow Garage, empresa de pesquisa e robótica? Pois é, a milenar arte da dobradura é responsável por grandes contribuições ao desenho de peças de robótica, pela precisão e encaixe minucioso que se presta.
O economista Nouriel Roubini e o ex-presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, ajudaram a dar o tom politizado das discussões.

"Já Wolfensohn criticou duramente o
sistema educacional americano,
que, segundo ele, é responsável
pela baixa competitividade diante dos asiáticos,
principalmente China e Índia.
 Segundo ele,
os chindians (corruptela de chineses e indianos, em inglês)
estão tomando um espaço até então intocável
dentro da mecânica desenvolvimentista americana."

Roubini, que é conhecido pelo estilo catastrófico, acertou ao associar a tecnologia da inovação como a responsável pela migração de poder para os países emergentes. E citou o caso da mecanização da agricultura como fator de potencial desenvolvimento do continente africano.
Já Wolfensohn criticou duramente o sistema educacional americano, que, segundo ele, é responsável pela baixa competitividade diante dos asiáticos, principalmente China e Índia. Segundo ele, os chindians (corruptela de chineses e indianos, em inglês) estão tomando um espaço até então intocável dentro da mecânica desenvolvimentista americana. "Se a educação dos jovens ocidentais não melhorar, certamente seremos incapazes de competir com nações cujo foco tem sido a inovação e a melhoria do sistema educacional", afirmou.
Geoffrey Canada, educador americano, cresceu no South Bronx, bairro pobre e violento de Nova York. Apesar de todas as dificuldades, concluiu seu mestrado na Harvard School of Education e hoje é um dos responsáveis pela renovação do sistema educacional na região do Harlem. Ele veio falar com o grupo influente de executivos e propor algo que parece óbvio, mas é desafiador: a educação é uma das últimas fronteiras do conhecimento onde não há inovação. O sistema é o mesmo há décadas, professores têm estabilidade em seus empregos, alunos estudam as mesmas matérias. A escola fecha cerca de três meses por ano.
As aulas têm exatamente a mesma estrutura há anos... e por aí vai.
Realmente, quando pensamos no que aconteceu com nossas vidas nos últimos 15 anos em termos de inovações em pesquisas (Google), comércio (Amazon), entretenimento (iPod), redes sociais (Facebook) e comparamos com o que tivemos de inovação no campo da educação, percebemos que há um abismo. E esse abismo é repleto de oportunidades. Mas é fundamental ter vontade política e muito foco.
A Índia deu o exemplo, transformando a educação efetivamente em um direito básico a todas as crianças até os 14 anos. A diferença é que o Estado controla com rigor a qualidade e a metodologia de ensino.
Apesar de ser um mercado estimado em mais de US$ 50 bilhões, as instituições privadas têm menos autonomia e mais preocupação com a qualidade do que o que observamos no Brasil, com a proliferação de centenas de cursos, de escolas e de faculdades a cada esquina.
Como bem disse Nizan Guanaes em sua coluna desta semana, o brasileiro já tem um DNA capaz de impulsionar a inovação. Imaginem o potencial que o Brasil tem se conseguir aliar esse DNA inovador do nosso povo a um sistema eficiente e moderno de educação.
Certamente entraríamos no grupo de povos reconhecidamente capazes de competir com as grandes nações e quem sabe teríamos os brachindians!
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*ALEXANDRE HOHAGEN, 42, jornalista e publicitário, fundou a operação do Google no Brasil em 2005 e desde 2009 é presidente da empresa na América Latina. Escreve mensalmente, às quintas, nesta coluna.
Fonte: Folha online, 02/12/2010

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