sábado, 12 de maio de 2012

NARCISISMO DIGITAL

BRUNA AMARAL

O fascínio pela própria nudez

O caso Carolina Dieckmann ilumina uma prática que ganhou força com a tecnologia: fotografar-se para apimentar um relacionamento ou apenas pelo prazer de contemplar o próprio corpo. E o perigo de os registros caírem na internet apenas impulsiona o “autovoyerismo”

A facilidade de ter uma câmera na mão e não passar pela inconveniência de ter de revelar as fotos para ver o resultado parece ter popularizado o hábito de fazer registros cada vez mais íntimos.

E não é coisa de gente estranha, não. Carolina Dieckmann fez, Scarlett Johansson fez, Rihanna fez e ninguém garante que sua vizinha ou colega de trabalho, entre quatro paredes, também não se inebrie com a própria imagem, como no mito de Narciso.

A atriz brasileira, assim como em casos parecidos de famosas e desconhecidas, teve seus registros pessoais jogados na web sem a sua permissão. A repetição dessas “polêmicas” envolvendo registros pessoais de nudez leva a crer que não só ainda não sabemos lidar com os novos meios de comunicação e seu impacto na privacidade, mas também que fotografar-se sem roupa é uma prática mais natural e corriqueira do que aparenta ser.

Ver-se em imagens como veio ao mundo fascina a humanidade, e não é de hoje. Segundo Robson de Freitas Pereira, da Associação dos Psicanalistas de Porto Alegre, esse voyeurismo de si mesmo apenas ganhou força com a tecnologia.

– O corpo nu sempre foi uma evidencia de mistério e fascínio para as pessoas. Não é por acaso que os sites de nudez, de filmes pornôs, são os mais acessados na internet. Com a facilidade de se tirar fotos e compartilhá-las rapidamente, fica mais fácil o ato de olhar e ser olhado, que faz parte da subjetividade humana e organiza nossa sexualidade – explica.

Carla*, 25 anos, fez sua primeira sessão de fotos sem roupa há cinco anos a pedido do então namorado. Ao dar fim ao relacionamento, a jornalista apagou todos arquivos do computador do parceiro por medo de acabar exposta. Hoje solteira, ela produz fotos sozinhas em casa e apaga logo depois de ver.

– A maioria das mulheres tem uma vontadezinha de ser modelo de fotos nua um dia ou outro. As fotos caseiras são uma maneira de brincar com isso. Ajuda a se aceitar melhor, a se gostar mais. A gente vai percebendo como certos detalhes do corpo são bonitos e desejáveis. Acho que faz bem para a vida sexual – pondera.

Apimentar o relacionamento foi o motivo pelo qual a servidora pública Juliana*, 25 anos, começou a fazer imagens com o namorado Guilherme*, 28 anos. Os dois sempre tiram fotos, além de ligarem a câmera à TV para assistirem a si mesmos durante o sexo. Em quase um ano de namoro, eles colecionam cerca de 10 vídeos caseiros e uma centena de fotos que ficam guardadas no HD dele.

– Faço isso porque confio muito na índole dele. Já terminamos e voltamos algumas vezes e nunca tive nenhum problema com isso. Na verdade, acho que só o perigo de poder ser tornado público deixa tudo mais excitante ainda – confessa.

Intimidade serve como um presente

Seja para quem faz fotos sozinha ou com namorado, a adrenalina de estar fazendo algo perigoso é um dos atrativos de se expor aos flashes sem roupa. Contudo, no caso das mulheres que se fotografam para si mesmas, de acordo como psicanalista, o importante é conferir como está o próprio corpo. Já no caso das que se deixam fotografar pelos parceiros, há muita cumplicidade e confiança em jogo. Mas Pereira acredita que o impulso vai além disso:

– Essas fotos são como uma forma de presentear o parceiro com algo que, por ser caseiro, é mais mais íntimo e mais verdadeiro – avalia.

Para Juliana, as fotos que o namorado faz são quase um elogio.

– Claro que eu me sinto mais desejada e bonita por ele querer me fotografar. Por isso, quando estive viajando, até mandei umas fotos minhas para ele, para deixar com um pouco mais de saudade – conta.

Diferentemente do que muitos podem pensar, o psicanalista alerta que ver e fazer fotos nus não é sintoma de doença, perversão ou distúrbio:

– Patologia é se aproveitar da imagem de uma pessoa nua e tentar chantagear. Aí não tem nada de libido, é só falta de caráter e tem que ser punido. Mas, infelizmente, a única maneira de ter total certeza de que as fotos não vão parar na rede é não fazendo. E esse é um “bom senso” que os apaixonados normalmente não têm.

*Os nomes foram trocados para preservar os entrevistados

As fotos íntimas, feitas pela atriz com o celular, teriam sido surrupiadas de um computador no conserto. Ela chegou a ser chantageada em R$ 10 mil antes de as imagens vazarem no dia 4 de maio.

Como reagiu?

Carolina ameaçou processar o Google, se o site não retirasse as fotos do mecanismo de busca, e veículos que publiquem as imagens. Ela se pronunciou apenas em depoimento à polícia.
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bruna.amaral@zerohora.com.br
Fonte: Zero Hora on line, 13/05/2012
Imagem da Internet

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