Card. Gianfranco Ravasi*
(...) Todos nós vivemos (...) sob o mesmo céu, mas nem todos temos o mesmo horizonte. Por isso, o dia-lògos é necessário, ou seja, o entrecruzar-se (dià) dos percursos e dos discursos do lògos
[racionalidade], para assim realizar aquela dupla de verbos que Pascal
entretecia de modo original, precisamente num dos seus pensamentos mais
"teológicos", (...) ritmado sobre o chercher-trouver
[procurar-encontrar]. Como ensinava a antiga sabedoria oriental, a
verdade é semelhante ao diamante: é uma só mas tem várias faces.
Exatamente por isto, uma vez "encontrada" uma destas
facetas da verdade, é necessário tomar o caminho da "procura", como
sugeria Jean Cocteau, no seu Journal d'un inconnu: «Primeiro encontrar, depois procurar». (...)
Crentes e não crentes estudam aqueles perfis de ângulos
diferentes; uns como outros têm os pés bem fixos num dos seus
"átrios" de procura e de descoberta. Mas o diálogo força cada um a ser methòrios,
como o filósofo judeu Filão de Alexandria definia de modo iluminador o
sábio, isto é, aquele que está sobre a fronteira, bem radicado no seu
território, mas com o olhar que se estende para além dos confins e o
ouvido que escuta as razões do outro.
A riqueza dos horizontes que se abrem diante de nós
impede qualquer forma de fundamentalismo e exclusivismo; a luz límpida
da verdade convida, contudo, a superar também todas as formas de um
vago acordo minimalista e sincretista. É o que afirmava claramente o
senhor Gabriel de Broglie, chanceler do Instituto de França, aquando da
inauguração oficial em Paris do Átrio dos Gentios, em março de 2011:
«O diálogo deve nascer na clareza, sem confusão, sem
falso irenismo; não deve esconder mas sobretudo sublinhar a identidade
específica de cada um dos dialogantes; deve, por fim, ter lugar sobre o
único terreno onde todos se podem encontrar, o da humanidade comum.»
Neste terreno o cristão deve apresentar-se com o
estatuto epistemológico rigoroso da sua teologia, com a sua visão
antropológica elaborada pelos séculos em torno aos temas fundamentais
da pessoa, com o património criado pela cultura, pela arte e pelo
próprio ethos do Ocidente cristão. Esta enorme bagagem de saber
e de experiência, de verdade e de beleza, deve ser posta sobre a mesa
perante o "Gentio" que, por sua vez, encherá essa mesa com o seu
incessante "procurar" e com os altos resultados "encontrados" à luz da
razão e da verificação. (...)
Parece-me sugestiva uma afirmação de Jean Guitton: o
que ele afirmava do culto vale também para a procura desta sessão
[Átrio dos Gentios em Marselha, junho 2013]. Se ela é autêntica,
encontra-se constantemente com o numen e com o lumen,
ou seja, com o mistério e com a demonstração, com o infinito e o
definido, com a pergunta e a inteligibilidade, precisamente com o
procurar e com o encontrar. (...)
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* Presidente do Pontifício Conselho da Cultura
In L'Osservatore Romano
In L'Osservatore Romano
Fonte: http://www.snpcultura.org
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