quarta-feira, 5 de junho de 2013

O direito de tirar sarro

 Martha Medeiros*
 
As pessoas sonham em ser famosas, sem perceber o tamanho da encrenca. O Neymar, por exemplo. Por ser um fazedor de gols, ganhou muito dinheiro, o que é ótimo, e também ganhou fama, que nem tanto. A fama não permite que você seja apenas aquilo que sonhava: no caso dele, um craque. Você passa a ser considerado um exemplo de magnanimidade e a ter todas as suas ações julgadas. Pois o Neymar, coitado, que drible esta: mal colocou os pés em Barcelona, o Observatório contra a Homofobia da Espanha pediu que o jogador se desculpasse por causa de um comercial gravado para uma empresa de roupa íntima, em que ele aparece de cueca ao fundo de uma loja, se exibe para as garotas, mas foge quando aparece um cliente grandão. Foi considerada uma atitude homofóbica. Tudo agora é homofóbico. O Neymar gosta de mulher, não de homem, quem não sabe? Se amanhã aparecer um comercial mostrando um gay fazendo cara de nojo para a Gisele Bündchen, será que não acharemos graça? Será o caso de nos sentirmos ofendidos também?

Compreendo que está em curso uma luta ainda nova, difícil e que precisa se fortalecer com o combate a todas as reações culturais impregnadas na sociedade e que limitam os direitos dos cidadãos homossexuais. O movimento tem em mim uma aliada: não faço nenhuma restrição ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e inclusive apoio a adoção – como alguém pode acreditar que uma criança viverá melhor num orfanato do que dentro de um lar, sendo amada por duas pessoas que a escolheram?

No entanto, há que se deixar um espaço para vazar o que não é violento, o que não é repressor, e sim uma manifestação saudável de preferência, senão viveremos uma caça às bruxas às avessas. Os héteros não podem agora se sentir constrangidos por valorizarem o sexo oposto em detrimento do seu, ainda mais quando se trata de uma situação claramente bem-humorada, sem depreciar ninguém. Me vem à lembrança aquele episódio da Porta dos Fundos, programa cômico veiculado na internet, em que um atendente de uma loja de conveniências desestimula uma freguesa a procurar seu nome na lata de refrigerante, já que os disponíveis são Patricia, Renata, Mariana... O dela, Kellen, tsk, tsk,sem chance. Quem não assistiu talvez fique horrorizado. Que preconceito! Pois assista no YouTube, divirta-se com a sinceridade atrevida do personagem e entenda que não ganhamos nada com o paternalismo que confunde galhofa com ofensa, ou pegação de pé com bullying. Se engessarmos as possibilidades de riso que as diferenças ofertam, viraremos uma sociedade extremista na defesa do igualitário e asfixiada pelo politicamente correto, essa chatice que caiu nas graças de quem não a tem.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 05/06/2013
Imagem da Internet

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