sexta-feira, 5 de julho de 2013

Política tomou lugar da religião como fonte de esperança, diz Pondé

 
 A franco-iraniana Lila Azam Zanganeh na mesa "O Prazer do Texto", na Flip 2013, em Paraty
Em uma palestra intitulada "Dez Mandamentos como Ética Contemporânea", o filósofo e colunista da Folha Luiz Felipe Pondé falou, nesta sexta (5), sobre o impacto que as regras anunciadas no Velho Testamento tiveram na articulação da sociedade da época e sobre a função política que as religiões exerceram desde suas origens. 
 
"A esperança sempre foi uma virtude teologal, ou seja, algo que vinha de Deus. Hoje, a esperança é uma virtude política", disse Pondé durante a conversa, que aconteceu na Casa Folha, em Paraty.
"A relação com a política hoje é religiosa na raiz: a gente espera que a política conserte o mundo. A política está no lugar da religião." 

Apresentado pelo mediador, Alcino Leite Neto, editor do selo Três Estrelas, como um intelectual "de posições muito independentes, anticonsensuais" e "um dos principais pesquisadores brasileiros da religião", o filósofo pernambucano afirmou que a criação dos mandamentos foi "um momento civilizacional".
 
"É a tábua a partir da qual o povo vai construir seu comportamento, são vistos como a pedra filosofal a partir da qual o povo vai constituindo uma identidade. E isso através de regras, porque, sem regras, você não vive." 

Pondé falou ainda sobre a introdução do conceito cristão que seria o 11º mandamento, "ama o teu próximo como a ti mesmo". 

"A introdução dessa variável do amor se torna um diferencial importante entre o cristianismo e o judaísmo. O cristianismo dá uma virada na imagem do Deus um tanto duro do judaísmo." 

Este Deus do Antigo Testamento, que "mata bastante", é um grande personagem, segundo Pondé. 

"Só um Dostoiévski ou um Shakespeare seriam capazes de pensar um personagem assim. Imagino o que era para Adão e Eva viver com esse cara. Ele é dono de tudo, sabe o que você pensa, e, ainda por cima, não é metido, como qualquer um de nós seria com um poder desses." 


O palestrante citou sua preferência por alguns dos livros poéticos e sapienciais do Velho Testamento --"Provérbios", "Eclesiastes", "Jó", "Cânticos dos Cânticos"-- e falou sobre a importância do culto aos ancestrais. 


"A relação com o passado é importante, porque os ancestrais nos legaram uma herança. A grande questão é: o que nós vamos deixar de legado para as próximas gerações?", perguntou ao público que lotou a Casa Folha. 


"A modernidade parece um adolescente de 17 anos, que acha que entende tudo sobre o mundo e que o passado não vale nada. Quando você aprende a respeitar o que veio antes de você, ajuda a baixar a bola sobre o que pensa de si mesmo." 

Segundo Pondé, a discussão sobre "o caráter contemporâneo dos dez mandamentos", tema da palestra, vai ser tratado também em seu próximo livro pelo selo Três Estrelas, do Grupo Folha. 

"Uma das vantagens que a gente aprende quando estuda religiões é que elas são entidades muito antigas, a literatura produzida é de uma sabedoria imensa sobre o ser humano. Como é muito antiga, essa literatura religiosa tem uma reflexão abissal sobre o ser humano." 

Provocado pelo mediador a criar um novo mandamento que pudesse ser acrescentado aos dez originais, Pondé apresentou sua sugestão: "Não serás ressentido". 
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Fonte: Folha on line, 05/07/2013

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