MARTHA MEDEIROS*
Já os reles mortais leem enquanto o sono não vem.
No entanto, sei de uma mulher que, em vez de ler, resolveu escrever um livro durante uma noite chuvosa. Nunca havia escrito nada antes. Fez um pacto consigo mesma: enquanto a chuva não parasse, ela não pararia de escrever – e como choveu a madrugada inteira, a cântaros, ela passou a noite em claro, com tempo mais que suficiente para fazer um inventário de sua vida amorosa e sexual, que não tinha nada de vitoriana, como a obra de Dickens, nem de engraçada, como a de Groucho Marx. Era a história de alguém que raramente conseguiu conciliar amor e sexo numa mesma relação, e resolveu por bem escolher entre um e outro. Escolheu o sexo.
O nome dela? Não sei. Não tem. É uma personagem que inventei. Escrevi essa história em 2003 ou 2004. Uma ficção curtíssima que nunca foi publicada, nem teria onde, sendo tão enxuta. Pois bem: depois de eu fazer essa personagem povoar uma madrugada inteira com suas lembranças de amores imperfeitos (todos são), calei-a. Coloquei o ponto final na obra e deixei essa mulher descansar. Ela ficou dormindo dentro do meu computador por cerca de nove anos. Esqueci dela. Até que o Ivan Pinheiro Machado, meu editor, comentou que a L&PM estava lançando uma coleção de bolso chamada “64 Páinas”, só para textos breves. Era a chance que eu tinha de deixála sair do seu quarto escuro. Acordei-a, dei uma revisada em suas confissõs ora melancóicas, ora picantes, e agora ela vai pra rua.
“Noite em Claro” já deve estar nas livrarias, supermercados e farmácias, a um preço megapopular: cinco reais. Ideal para deixar na mesinha de cabeceira, ao lado da cama, para o caso de o sono não vir. Mas espero que a leitura seja tão dinâica que não permita que você pregue os olhos antes do fim.
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* Escritora. Colunista da ZH
Fonte: ZH on line, 03/06/2012
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