RICARDO MARIANO*
A guinada conservadora católica, o acelerado declínio numérico da filial
brasileira da Santa Sé e a avalanche pentecostal acirraram a competição
entre católicos e evangélicos a partir de 1980. Essa peleja deflagrou
uma disputa religiosa pelo espaço público e uma desenfreada ocupação
religiosa da mídia e da política partidária.
Desde então tele-evangelistas, padres-celebridades e cantores gospel
tornaram-se onipresentes na mídia eletrônica, emissoras de TV
pentecostais e católicas brotaram como cogumelos, rebanhos religiosos
viram-se tratados como currais eleitorais, igrejas passaram a formar
bancadas parlamentares, a expandir seu poder nos Legislativos e a
controlar partidos, discursos moralistas reacionários de inspiração
bíblica tomaram de assalto as eleições.
A ocupação religiosa do espaço público, sobretudo nas capitais e nas
regiões metropolitanas, tornou-se ainda mais monumental, mais
espetacular e mais triunfalista.
Tudo por um maior impacto evangelístico, gerar maior visibilidade
pública e revestir seus líderes e suas organizações religiosas de maior
poder, status e legitimidade.
Foi por isso que católicos, liderados por carismáticos e suas
comunidades, e neopentecostais, turbinados pela famigerada teologia da
prosperidade, trataram de investir pesado em megaeventos, megashows,
megamarchas e megamissas e torrar fortunas na construção de imponentes
santuários e catedrais.
Não é à toa que a inauguração do maior templo católico da América Latina
ocorra nesse contexto de vigoroso ativismo religioso e de midiatização
da religião intensificado por uma concorrência inter-religiosa sem
precedentes na história nacional.
Autor do slogan "sou feliz porque sou católico" e líder religioso mais
popular do país, padre Marcelo Rossi foi o idealizador do Santuário
Theotokos - Mãe de Deus. A fim de resgatar as ovelhas desgarradas do
rebanho e de impedir o "avanço das seitas", o sacerdote multimídia,
multitarefa e workaholic tem trabalhado, em ritmo toyotista anos a fio,
como cantor, ator, escritor, radialista e tele-evangelista, militado no
Twitter e no Facebook e, de quebra, acolhido romarias de políticos às
missas em busca da bênção nas urnas. Em reconhecimento a seus feitos, o
papa Bento 16 lhe deu o Prêmio Van Thuân, em 2010.
No novo santuário, Marcelo Rossi ocupará um palco muito maior e mais
reluzente para cantar seus louvores e baladas, coreografar a "aeróbica
do Senhor", receber celebridades, agitar, entreter e emocionar as
multidões de seguidores, benzer seus objetos pessoais e lançar-lhes
baldes de água benta ao fim de cada show-missa.
Assim ele vai contribuindo para configurar um catolicismo de massas
alegre, corpóreo, sensorial, emotivo, mágico, midiático, terapêutico,
taumatúrgico, moral e teologicamente conservador. Mais popular, mas
menos intelectualizado e menos atento aos problemas socioeconômicos.
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