terça-feira, 15 de novembro de 2022

Mais sensível do que eu

 Fabrício Carpinejar*

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Toda menção negativa ao nome do mercado o irrita, toda promessa o desestabiliza, toda frustração lhe provoca cólera.

13/11/2022   

Eu sou poeta e sensível. Mas não chego nem perto da vulnerabilidade do mercado financeiro.

O mercado é chorão, fica magoado por qualquer discurso. A gasolina dispara, ações caem, empresas fecham. Ele quebra a casa inteira na hora em que está nervoso.

Sofre por aquilo que não aconteceu, por antecedência, vive com a cabeça e os números voltados para o futuro, não saboreia o presente, padecendo de um estágio elevado e incurável de ansiedade.

Toda menção negativa ao seu nome o irrita, toda promessa o desestabiliza, toda frustração lhe provoca cólera. Ele vive googlando o seu nome nas redes sociais, procurando desafetos.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo conhecendo a paranoia do mercado financeiro após dois mandatos, comprou uma briga desnecessária.

Em pronunciamento a parlamentares na última quinta-feira (10), criticou o teto de gastos e questionou o fato de o país ter uma meta de inflação, não de crescimento.

Esqueceu que a tal estabilidade fiscal é a mãe do mercado financeiro. Então, Lula ofendeu descaradamente a mãe do mercado.

Para quê? Em defesa da honra familiar, o mercado entrou em pânico, choramingando pelos corredores das bolsas, fazendo cena na porta dos bancos.

O dólar subiu 4,1%, a maior alta diária desde março de 2020, e encerrou o pregão a R$ 5,39. No mercado de ações, o Ibovespa caiu 3,35% aos 119.775 pontos, a queda mais acentuada desde novembro de 2021.

Lula não mediu suas palavras e errou o foco. Ele desejava defender que investimentos na área social não são gastos, mas gerou uma insegurança monstruosa para possíveis negócios no Brasil no próximo ano. Deu a entender que não cortaria despesas e tampouco prezaria o equilíbrio fiscal. Justamente o que o empresariado teme ouvir.

O bloqueio nas estradas pelos caminhoneiros foram cócegas perto do terremoto do discurso de Lula, que ainda não apresentou o nome para o Ministério da Fazenda e tampouco detalhou qual será o seu projeto na área econômica.

Tudo está enevoado, facilitando o surgimento de boatos e bichos-papões como a tarifação do Pix, por exemplo.

O mercado financeiro abomina indiretas; é afeiçoado a uma linguagem clara e objetiva, sem incitar revoluções e transformações radicais.

O economista Ricardo Amorim combateu a leviandade do petista de modo categórico: “O incrível poder de um futuro presidente de empobrecer, em um dia, a população de seu país, ainda antes de tomar posse, só expressando ignorância econômica: após falas de Lula contra estabilidade fiscal, a bolsa brasileira perdeu cerca de R$ 100 bilhões de valor de mercado hoje”.

O grande inimigo de Lula são suas metáforas, não a intervenção militar, não as passeatas e mobilizações de milhares dos apoiadores de Bolsonaro, atual presidente e candidato derrotado nas últimas eleições.

A questão controvertida que não quer calar: são apenas metáforas?

* Poeta, cronista e jornalista brasileiro

Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/carpinejar/noticia/2022/11/mais-sensivel-do-que-eu-clafsykb9000s01704f6ydgft.html

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