domingo, 20 de novembro de 2022

O Ser humano no mundo

Frei Marcos Sassatelli*

 


O que é o Ser hu­mano? De onde ele vem? Para onde ele vai? São estas as per­guntas fun­da­men­tais (in­da­ga­ções) que todos e todas nos co­lo­camos. Po­demos dizer que, de ime­diato, o Ser hu­mano per­cebe-se (des­cobre-se) a si mesmo como um “ser-no-mundo” (“ser mun­dano” parte in­te­grante do mundo). En­quanto tal, per­cebe-se também como um “ser-no-es­paço” e um “ser-no-tempo”. A “mun­da­ni­dade” - “es­pa­ci­a­li­dade” e “tem­po­ra­li­dade” - é a con­dição exis­ten­cial do Ser hu­mano e de todos os seres. O que sig­ni­fica, porém, para o Ser hu­mano “ser-no-mundo" (“ser-mundo"), “ser-no-es­paço” (“ser-es­paço”) e “ser-no-tempo” (“ser-tempo”)?

Por “mundo” en­ten­demos a Terra (a Irmã Mãe Terra Nossa Casa Comum) com tudo o que nela existe ou o Uni­verso com tudo o que nele existe, in­cluindo a Terra (hoje, hi­po­te­ti­ca­mente, fala-se até de “Mul­ti­verso”: um con­junto de uni­versos pos­sí­veis, in­cluindo o nosso, ou de “Mul­ti­versos”).

Seja num caso como no outro, a pa­lavra “mundo” tem vá­rios sig­ni­fi­cados, mas todos fazem re­fe­rência a uma to­ta­li­dade:

- à to­ta­li­dade das coisas exis­tentes (qual­quer que seja o sig­ni­fi­cado de exis­tência) e neste sen­tido a pa­lavra em­prega-se sem ad­je­tivos;

- à to­ta­li­dade de um campo ou de mais campos de in­ves­ti­gação (de ati­vi­dade) ou de re­la­ções como quando se diz 'mundo fí­sico' ou 'mundo his­tó­rico' ou 'mundo ar­tís­tico' ou 'mundo dos ne­gó­cios' ou também 'mundo sen­sível', isto é, atin­gível pelos ór­gãos sen­so­riais ou 'mundo in­te­lec­tual', isto é, atin­gível pelos ins­tru­mentos in­te­lec­tuais. Neste sen­tido fala-se também de 'mundo am­bi­ente' para in­dicar o con­junto das re­la­ções de um ser vi­vente com as coisas que o cir­cundam ou a si­tu­ação em que se en­contra. Mas a pa­lavra não tem sig­ni­fi­cado di­verso de am­bi­ente;

- à to­ta­li­dade de uma cul­tura como quando se diz 'mundo an­tigo' ou 'mundo mo­derno' ou 'mundo pri­mi­tivo' ou 'mundo civil';

- a uma to­ta­li­dade ge­o­grá­fica como quando se diz 'novo mundo' (...) ou 'velho mundo' (...)" (Ab­bag­nano, N. Mundo. Em: Di­ci­o­nário de Fi­lo­sofia. Mestre Jou, São Paulo, 1982, p. 657.

Os sig­ni­fi­cados da pa­lavra "mundo" apre­sen­tados e ou­tros podem ser re­du­zidos aos dois pri­meiros: o mundo como to­ta­li­dade de tudo o que existe (na Terra ou no Uni­verso) e o mundo como to­ta­li­dade par­ti­cular ou to­ta­li­dade de campo: a to­ta­li­dade do mundo fí­sico, a to­ta­li­dade do mundo bi­o­ló­gico, a to­ta­li­dade do mundo hu­mano etc. Uma to­ta­li­dade cul­tural ou uma to­ta­li­dade ge­o­grá­fica é também uma to­ta­li­dade par­ti­cular ou de campo. As to­ta­li­dades par­ti­cu­lares ou de campo são as mais di­versas e - quanto ao con­teúdo - podem ser mais ou menos abran­gentes.

Por exemplo, o "mundo hu­mano" - como vimos - é uma to­ta­li­dade par­ti­cular ou de campo, mas, no mundo hu­mano, temos to­ta­li­dades mais par­ti­cu­lares ainda como o "mundo so­cial" (so­ci­o­e­conô­mico, so­ci­o­po­lí­tico, so­ci­o­e­co­ló­gico, so­ci­o­cul­tural, so­ci­or­re­li­gioso) e o "mundo in­di­vi­dual" (cor­póreo, bi­op­sí­quico, es­pi­ri­tual ou pes­soal) com suas re­la­ções so­ciais.

Por­tanto, para o Ser hu­mano - en­quanto to­ta­li­dade par­ti­cular ou de campo - “ser-no-mundo", “ser-mundo” (“ser-na-Terra”, “ser-Terra” ou “ser-no-Uni­verso”, “ser-Uni­verso”), sig­ni­fica ser na to­ta­li­dade das coisas exis­tentes, ser parte in­te­grante dessa to­ta­li­dade.

Como já dis­semos, o mundo, por ser uma re­a­li­dade con­creta, é uma re­a­li­dade es­pa­cial e tem­poral. A "es­pa­ci­a­li­dade" e a "tem­po­ra­li­dade" fazem parte da "mun­da­ni­dade" e, por isso, são também cons­ti­tu­tivas do Ser hu­mano e de todos os seres exis­tentes.

O que sig­ni­fica, pois, “ser-no-es­paço” (“ser-es­paço”) e “ser-no-tempo” (“ser-tempo”)? Para o Ser hu­mano e todos os seres, “ser-no-es­paço” (“ser-es­paço”) sig­ni­fica ser em todos os es­paços de sua exis­tência; “ser-no-tempo” (“ser-tempo”) sig­ni­fica ser em todos os tempos de sua exis­tência.

Por fim, o mundo como a to­ta­li­dade de tudo o que existe (na Terra ou no Uni­verso), é uma re­a­li­dade ob­je­tiva, con­creta; tem uma cons­ti­tuição ou es­tru­tura com con­sis­tência pró­pria, com fun­ci­o­na­mento pró­prio e com sen­tido ou valor pró­prio, in­de­pen­den­te­mente da cons­ci­ência do Ser hu­mano.

A to­ta­li­dade ma­te­rial e or­gâ­nica do mundo existe, fun­ciona e tem sen­tido. "Antes" (do ponto de vista ló­gico e não ne­ces­sa­ri­a­mente cro­no­ló­gico) do Ser hu­mano ter cons­ci­ência de “ser-no-mundo". O Ser hu­mano no mundo, por ser ra­ci­onal, pode (como ve­remos) dar um novo sen­tido ao mundo ou des­res­peitar e “pro­fanar” o sen­tido que o mundo já tem.

No pró­ximo ar­tigo re­fle­ti­remos sobre o Ser hu­mano como um “ser-com-o-mundo” (“ser-com-o-es­paço” e “ser-com-o-tempo”).

*Marcos Sas­sa­telli é frade do­mi­ni­cano e teó­logo. 

Fonte:  https://correiocidadania.com.br/2-uncategorised/15290-o-ser-humano-no-mundo

Nenhum comentário:

Postar um comentário