quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Quioto, finalmente!

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Japão, rosas, origami, Teresa Vasconcelos 

Rosas em origami: “Coisa mais linda!”. foto © Teresa Vasconcelos

Há também alegria
na solidão
Crepúsculo de outono
(Buson, O Crisântemo branco: Antologia de Haiku.
Ed. Pedra Formosa, 1995)

Não posso deixar de sugerir o haiku japonês em epígrafe. Sabemos que o haiku remonta à forma clássica da poesia japonesa; é um poema curto, em geral de 17 sílabas. A tradição consistia em que vários poetas se reuniam e compunham poemas em conjunto. Muito belo, muito ao jeito de uma das características culturais japonesas, a vida de grupo. E estivemos no Japão em pleno outono.

Vou descrever a Quioto dos magníficos templos, das tradições e modernidade. Mas não resisto a contar a história destas duas rosas em origami. Um pouco amachucadas por causa da longa viagem, elas repousam na minha estante junto a outros objetos de estimação. Foi no comboio de alta velocidade (“bala”, como dizem os brasileiros) que nos levou de Tóquio a Quioto que, já quase à chegada, deparei com uma senhora de certa idade, muito calma e em modo concentrado, a fazer origami.

Estávamos já no corredor de saída. Comentei para o colega que estava atrás de mim: “Coisa mais linda!”. A senhora, pelo tom da minha voz, deve ter percebido que estava a falar sobre ela (a concentração faz isto, mesmo falando línguas tão opostas…) e, de um gesto, retirou de um saquinho de plástico estas duas rosas e ofereceu-mas. “Arigatô” (obrigada), só tive tempo de balbuciar com uma vénia porque as mãos estavam ocupadas com a mala…  e as rosas, e descemos do comboio. Sem pretender descrever todo o simbolismo deste gesto, ele foi um exemplo da delicadeza japonesa – pelo menos entre os mais velhos.

Esta pequena dádiva foi, para mim, um haiku.

Quioto – 1,475 milhões de habitantes – é a antiga capital do Japão, a cidade das dezenas de templos budistas ou xintoístas, dos palácios imperiais, das muitas lojas de artigos de devoção ao redor dos templos e de abundante comércio turístico, ao jeito dos nossos santuários. Muito verde no meio das avenidas modernas e cheias de movimento. A nós juntou-se então a professora Mari Mori, da Universidade de Kobe, que nos acompanhou ao longo dos dias seguintes. Erguendo-se do verde, os pináculos e silhuetas dos templos.

O magnífico Templo do Pavilhão Dourado (Templo Kinkaku) é património mundial declarado pela UNESCO. Trata-se de um templo budista do século XIV, com influência zen e com alguns elementos xintoístas.

Japão, Quioto, Templo Dourado

Templo Dourado de Quioto, Japão. Foto © Teresa Vasconcelos

Refletindo-se no lago o magnífico templo é precedido pelo pavilhão imperial também dourado. Rodeado de jardins e estátuas, o templo do “pavilhão dourado” está junto a um lago também rodeado de floresta e é literalmente um hino à vida e à profundidade espiritual do budismo zen. Em 1950, transformou-se num templo zen de orientação Rinzai. A escola Rinzai é uma das três escolas zen budistas no Japão. Foi introduzida pelo monge Eisai em 1191. Adotada inicialmente pela classe dos samurais, acentuava a disciplina monástica e a prática de koans (o koan tem, como objetivo, propiciar a iluminação espiritual do praticante de budismo zen). A escola está ainda associada ao refinamento das artes tradicionais japonesas como a caligrafia e a cerimónia do chá – de acordo com os elementos referidos na Wikipédia. A estrutura atual data de 1955.

Em oposição à paz do Templo Dourado visitámos o grande santuário xintoísta de Fushimi Inari-taisha (as suas origens remontam ao ano 1000) – património mundial, tal como o anterior –, dedicado aos deuses ligados à agricultura: o deus do arroz e o deus do saquê (a aguardente de arroz). Nos jardins em redor vimos muitas estátuas de raposas que são consideradas as mensageiras dos deuses.

Há muitas lojas com objetos de devoção, que não aprecio grandemente porque me fazem lembrar outras paragens. Mas o magnífico templo é em cor de laranja e é sublime o acesso com pórticos sucessivos em colunas laranja, fazendo um percurso ascendente e outro descendente. As colunas estavam repletas de inscrições em caracteres japoneses. Pensei com alguma esperança que fossem frases indutoras de um aprofundamento espiritual, mas ao fazer a descida do percurso perguntei e fui informada de que se tratava dos nomes de quem tinha contribuído para o restauro do templo e daquele túnel lindíssimo de colunatas. Enfim, também encontramos o mesmo por essa Europa fora…

Apesar das inúmeras lojas vendendo incenso, pagelas, papelinhos para deixar com pedidos ou intenções para afastar os maus espíritos, e apesar da multidão de turistas e de muitos devotos, o caminho de subida até ao templo é este fascinante conjunto de toriis  (pórtico tradicional japonês) que lembra os tradicionais portões de entrada nos templos: mas, aqui, são nada mais nada menos que cinco mil pilares!

Quioto, Santuário Fushimi
O Santuário de Fushimi, em Quioto, que remonta ao ano 1000, é dedicado aos deuses ligados à agricultura. 
Foto © Teresa Vasconcelos

 

Subi em silêncio (como que num únel), afastando-me dos meus companheiros. Depois desci, também em silêncio. Diria que esta foi uma experiência muito pessoal de busca de sentido para os três anos difíceis que antecederam o dom inesperado que tem sido esta viagem. E também a constatação de que, no meio de muito barulho e mesmo ruído, posso criar um silêncio dentro de mim e é nesse silêncio (para alguns, orante) que consigo centrar-me no essencial, ligando-me à teia de fios de vida que por vezes me enreda, outras me liberta.

Um templo em cada esquina: mágico e abundante. Foto © Teresa Vasconcelos.

No centro de Quioto antigo, por onde deambulámos, em cada esquina deparávamos com um templo ou um palácio. Mágico e abundante. A certa altura perdi-me do grupo: a multidão de turistas impedia-me de ver os meus colegas que eram os meus pontos de referência. Quis sentar-me e parar um bocadinho e tinha a indicação de um ponto de encontro à descida. Depois subi por outro lado. Nada. Voltei a sentar-me e calmamente disse a mim própria: “Tens o cartão com o nome do hotel. Se começar a escurecer apanhas um táxi e pronto. Para já estás presente ao que te rodeia…”.

Verifiquei como, “viajante empedernida” que sou, o manuseio do inglês e do francês me tem sempre ajudado. Mas aqui não: os caracteres japoneses na rua não me davam qualquer ponto de referência. Herméticos. Fui ficando. Raramente nestes locais encontramos um japonês que fale inglês. A certa altura, de dois lados opostos surgiram os meus companheiros de viagem: “Está ali!” e acenavam aliviados e surpresos com a minha calma. Expliquei-lhes o plano que “esta cabeça criminosa” já tinha elaborado, continuando assim a usufruir do instante. Estava em Quioto, a cidade dos templos, da transcendência. Todo e qualquer silêncio me sabia tão bem, mesmo sem saber o que vinha a seguir. Mas também me soube muito bem que o meu grupo bem português me tivesse encontrado.

Interessantes os pequenos oratórios espalhados pelas ruas onde figura uma pequena estátua, se colocam flores frescas e se reza aos deuses a pedir que não haja incêndios, uma vez que eles são frequentes em edifícios todos em madeira. Pelo que pude entender, os moradores de uma determinada rua revezam-se na responsabilidade de cuidar deste oratório/templo doméstico comum.

Em Quioto visitámos a Oikuen Ashita Nursery School que fora restaurada recentemente pelo arquiteto Tezuca e se estendia um pouco acima da colina onde estava um antigo templo budista. Fomos acolhidos pelo monge responsável e pelo diretor, que nos explicaram tratar-se de uma instituição de solidariedade social ligada ao templo. Impregnado da filosofia budista da veneração pela natureza e do que podemos usufruir dela, o espaço era calmo, muito simples. Ambiente repousante e tudo muito belo. O edifício, luminoso, ao jeito de Tezuca, tinha as portas das salas deslizantes, corredores protegidos e leves com modalidades engenhosas para permitir o reaproveitamento da água da chuva…

Adultos contidos e atentos e as crianças espontâneas, calmas, felizes. No início da refeição as crianças já sentadas – mesmo as mais pequeninas – baixam a cabeça e juntam as mãos. Não há palavras, mas elas sabem do que se trata: agradece-se a vida, os alimentos, o belo e o bom… Esquecemo-nos disso, aqui pelo Ocidente. Mesmo de entrar no silêncio. Senti-me elevada pelas crianças naquele momento.

Ao subir a longa escadaria até à creche e jardim de infância, podíamos ver, entre as casas, quase sem espaço a dividir, a silhueta do cemitério budista e suas campas, algumas floridas. Quando viajámos para fora de Tóquio, de comboio, perto dos aglomerados de casas ou prédios, viam-se os cemitérios lado a lado com os apartamentos. Em geral os corpos são cremados, pelo que as campas não têm grande extensão. As cinzas são apenas guardadas para manter a memória vida daqueles que morreram. No budismo, a morte é simplesmente o final do ciclo na terra, quando termina a missão de cada um: “Quando nascemos já nascemos com a morte, vivemos tendo consciência dela”. A morte faz parte da vida. Por isso os mortos coabitam ao lado dos vivos.

Cemitério budista. Foto © Teresa Vasconcelos

De Quioto a Kobe

O comboio de alta velocidade deixou-nos em Kobe. Trata-se de outra enorme cidade a trepar pela montanha acima (monte Rokkô) com vista para a baía de Osaka.

Subindo no teleférico do monte Rokko vê-se a extensão da cidade até ao mar. No cimo do monte existem umas termas de águas sulfurosas: terra vulcânica, bem o sabemos! À descida os maravilhosos jardins – “Herb Gardens” –, um ex-libris da cidade: flores, hortas de legumes, ervas aromáticas, numa espécie de escadaria até ao sopé do monte. Lembrei-me dos “jardins suspensos da Babilónia” ou do nosso Douro vinhateiro, mas com o mar ao fundo.

O escritor japonês Junichirô Tanizaqui (1886-1965), no livro Elogio da Sombra, (1933), fala-nos na luz “que há na sombra”, evitando tudo aquilo que brilha (bem ao contrário dos vizinhos chineses) e nomeia a palavra kairakuen para “um parque para ser gozado em companhia” (p. 12). Foi isso que os mais lestos puderam fazer enquanto dois ou três de nós tivemos de regressar no teleférico: do alto contemplávamos os patamares e os degraus organizados ao milímetro, repletos de plantas, ervas e flores.

Assim usufruímos de um magnífico kairakuen, ainda que a partir de diferentes perspetivas. E lá em cima, como gostei de estar sentada sozinha numa mesa a beber chá verde (num prosaico copo de papel que guardei na mochila) fitando a baía de Osaka ao longe. Penso que talvez os meus efusivos companheiros de viagem ficassem levemente surpreendidos com a necessidade de silêncio e alguma solidão desta companheira de viagem, mas eu tinha de digerir tanta beleza em silêncio, com o olhar bem longe, louvando a Deus pela criação.

Os “Herb Gardens” ex-libris da cidade. Foto © Teresa Vasconcelos.

Uma parte da cidade antiga de Kobe foi destruída pelo tremor de terra de 1995. Milhares de pessoas ficaram sem as suas casas, sobretudo as que viviam na zona antiga da cidade, onde as casas são em madeira. É notável a resiliência deste povo que vive – literalmente! – em cima de vulcões. Tudo recomeça a seguir. Tudo e todos se “levantam” novamente. Fazem-se filas para continuar a vida ordeiramente, ainda que as pessoas possam ter de ficar alojadas temporariamente em pavilhões que resistiram ao sismo ou mesmo em tendas. Sem lágrimas ou autocomiseração. Uma imensa dignidade. Coerentes com a mentalidade budista: “quando nascemos já nascemos com [o perigo, a insegurança], vivemos tendo consciência de[les]” (adaptado).

Ainda conseguimos visitar o Taisan-ji, um dos templos xintoístas mais antigos, este bem no centro da cidade. Aí adoram-se os deuses, fazem-se ofertas, espera-se a sua proteção para as intempéries da vida. E confia-se no que vier. Sublinho novamente: não há ponta de autocomiseração, antes uma enorme dignidade. Não há queixas, tão vulgares entre nós. Nem gemidos. Passe-se as variadas e antigas práticas religiosas (lá como cá…) – que se mantêm apesar da “invasão” da tecnologia mais sofisticada –, senti  o valor da fidelidade ao grupo a que se pertence, na certeza de que, visceralmente, precisamos uns dos outros para viver (ou sobreviver). A propósito sublinho aqui o grande amor, respeito e gratidão que merecem os mais velhos. São cuidados pelas famílias e trabalham enquanto podem. Mesmo doentes e dependentes a sua missão não terminou. É apenas diferente… um outro modo de ver. Tive bem consciência do que poderia aprender com tudo isto.

Digo-vos que muitos do oriente e do ocidente
virão reclinar-se à mesa,
com Abrão, Isaac e Jacob, no reino dos Céus (…)
(Evangelho segundo Mateus 8, 11, leitura de 28 de novembro de 2022, versão de Frederico Lourenço)

Gosto deste convite: reclinarmo-nos à mesa. É importante deter-me na comida japonesa. Não falei ainda dela, para não me mostrar demasiadamente gourmet, coisa que sou. Mas a comida japonesa é, como todos sabemos, um hino à beleza, à saudável frugalidade, repleta de interessantes rituais: o silêncio, a lentidão, as cores e formas, a atenção focalizada que leva a saborear os alimentos devagar, apenas no presente, bem como o cuidado na organização dos mesmos e sua decoração. Todos os sentidos se envolvem neste saborear que é também uma experiência com/para uma dimensão espiritual, contemplativa – pelo menos para mim. Movimentos leves por parte de quem nos serve. Come-se não para nos empanturrarmos mas sim porque precisamos de comer para viver. Sobretudo legumes sazonais, algas, peixe cru. O sushi. Arte, contemplação e beleza acima de tudo, estão na essência da cultura e da alimentação dos japoneses.

“Arte, contemplação e beleza acima de tudo, estão na essência da cultura e da alimentação dos japoneses.” Foto © Teresa Vasconcelos.

 

Junichirô Tanizaki afirma de uma forma muito bela: “A cozinha japonesa, houve quem o dissesse, não é coisa para se comer, mas para se olhar (…) para se olhar e, melhor ainda, para se meditar!” (in: Elogio da Sombra, 1933, p. 28).

A cozinha japonesa é isso tudo, mas também é sazonal, dá importância ao ciclo das estações e das colheitas. O arroz branco é a base de toda a alimentação, especialmente na modalidade sushi, que é o arroz comprimido com vinagre de saquê e enrolado em folhas de alga, usando uma pequena esteira, recheado de peixe cru, legumes, etc. Até a cor e disposição dos legumes ou peixe dentro do sushi é estética e intencionalmente bela. O tofu também está frequentemente presente. Come-se muito peixe, sobretudo peixe cru – estamos em múltiplas ilhas – e o peixe é fresquíssimo, mas também se come carne e galinha. A massa, também base da alimentação, é originária da China e em geral é servida num caldo de peixe, ou então frita (uma delícia!). Muitos e variados legumes.

No nabo apimentado
que me trespassa
o vento de outono
(Bashô)

Sim, experimentei o saboroso nabo cru de que fala o haiku. Flores e suas pétalas coloridas para saborear ou enfeitar. E, claro, o sempre presente molho de soja que traz sal à comida, mas também vinagre de arroz ou a célebre pasta picante verde, o wasabi. O wasabi é uma pasta de cor esverdeada feita de uma parte da planta com o mesmo nome cuja raiz e caule estão submersos em rios. Muito picante é servido não apenas para temperar mas também para evitar intoxicação com bactérias (o que pode acontecer quando se come peixe cru).

Pauzinhos com o respetivo suporte para os pousar, toalhinhas húmidas para limpar as mãos antes da refeição. Mostro aqui apenas duas fotos de diferentes restaurantes, partilhadas entre o grupo.

Foto © Teresa Vasconcelos.

Kobe é internacionalmente conhecida pela excelente carne. Gado criado ao ar livre em pastagens bem verdes. Houve muitos habitantes desta cidade que emigraram para o Brasil. Será que trouxeram para “casa” o “cultivo” em grande ou pequena extensão de gado? Se tiverem emigrado para o sul do Brasil é óbvia a influência alemã. Num restaurante a que fomos, curiosamente só de carne e salsichas, tudo estava apresentado à maneira japonesa: pequenas porções, dispostas de uma forma sempre bela com molhos picantes ou wasabi. Luzes veladas, tudo favorável à interioridade. Nada de iluminações frenéticas. Meia luz, saboreando, cheirando, vendo, contemplando… O requinte estético, o tempo lento, a conversa em surdina.

Claro que isto não se verifica em todos os restaurantes – apenas fomos a dois ou três mais requintados, convidando os/as diretores das escolas que visitámos. Mas um bom número deles mantém esta prática de uma estética culinária ancestral. Frequentemente serve-se chá verde – tive pena, mas não assisti a nenhum ritual do chá – mas nós preferimos beber o célebre saké (ou saquê), aguardente de arroz, deixando que os seus vapores eflúvios nos preparassem para a refeição. Para beber “à saúde” diz-se: kampai e fixam-se os outros nos olhos. Várias vezes recorri à possibilidade de beber copos grandes com um pouco de saquê, muito gelo e rodelas de limão ou laranja. Mesmo agradável!

“A cerimónia japonesa do chá (chanoyu 茶の湯, lit. “água quente [para] chá”; também chamada chadō ou sadō, 茶道, “o caminho do chá”) é uma atividade tradicional com influências do Taoísmo e do Budismo Zen. O chá verde em pó (matcha抹茶) é preparado cerimonialmente e servido aos convidados. O matcha é feito da planta chamada chá, camellia sinensis” (citado da Wikipedia).

O “caminho dos bambus”, em Kobe. Foto: Direitos reservados.

Não foi só em Tóquio que vi a responsabilização pelo lixo que se faz ao longo do dia. Uma notícia recente (Público, 24/11/2022) dizia: “Apoiantes da seleção nipónica já estão a deixar a sua marca em Doha (Qatar) e arredores, para espanto dos muitos adeptos adversários [depois do desafio contra a Alemanha os adeptos japoneses limparam cuidadosamente o estádio]. A limpeza e a arrumação são como uma religião no Japão”. A notícia não me surpreendeu: responsabilidade pelo lixo que fazemos; não sei se  introduziria a palavra “religião”, mas lá que é cidadania, isso é. E aprende-se desde pequenino, isto é, em casa, na creche e no jardim de infância, na escola.  Nada mais digo ao pensar no estado dos nossos estádios depois de um desafio de futebol ou nas ruas depois de uma celebração ou mesmo de uma manifestação. Manter tudo belo à sua volta, como que numa oração…

Vem a propósito apresentar aqui a beleza de um suporte para pauzinhos que nos foi oferecido num dos jardins de infância visitados: um complexo trabalho de origami – sob orientação de um adulto, claro! Como expliquei anteriormente e vi ser feito em vários jardins de infância (um adulto com duas ou três crianças), o origami é uma atividade manual bem japonesa e com fortes implicações na destreza manual e capacidade de concentração. A arte do origami é também de natureza contemplativa: lenta e paciente, minuciosa e rigorosa. Só assim os origamis ficam perfeitos. Como quem borda ou faz malha. Uma intensa atenção e, simultaneamente, a plena descontração da mente. Sim, ouso falar em meditação.

Gostaria ainda de falar de um local onde não pude estar, mas dois companheiros de viagem puderam fazê-lo. Trata-se também de um dos locais mais emblemáticos de Kobe, o “caminho dos bambus”. Tive mesmo pena de não poder ir mas rien n’est parfait, diz-nos o Petit Prince. Quando me mostraram as fotos fiquei feliz por eles e apenas pude visitar as fotografias por eles tiradas… De certo modo, acompanhei-os na pequena odisseia entre as altas canas de bambu. O sentido das coisas e das experiências também se faz ao “retardador”, saboreando e encantando-nos com aquilo que outros experimentaram, em vez de ficarmos “gulosos” e carentes porque não tivemos a mesma experiência. Este era um corredor complementar ao corredor laranja de Quioto que, esse sim, pude percorrer no meu silêncio habitado por múltiplas vozes…

Também podemos viver do desejo…. e isso é lindo.

*Teresa Vasconcelos é professora do Ensino Superior (aposentada) e participa no Movimento do Graal. Contacto: t.m.vasconcelos49@gmail.com

Fonte:  https://setemargens.com/quioto-finalmente/?utm_term=Papa+p%3Fue+em+evid%3F%3Fncia+a+atualidade+de+S.+Francisco+de+Sales%2C+patrono+dos+jornalistas&utm_campaign=Sete+Margens&utm_source=e-goi&utm_medium=email

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