Entrevista com David Harvey
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A crise do neoliberalismo está fazendo os bancos capturarem a riqueza coletiva por meio do endividamento e os Estados promoverem guerras e devastação ambiental. Nesta entrevista, o teórico marxista David Harvey reflete sobre o papel geopolítico dos EUA, Rússia e China e aponta para um novo horizonte frente a barbárie para garantir moradia, educação e saúde para todos.
A entrevista é de Estefanía Martinéz, publicada por Jacobin, 24-02-2023. A tradução é de Rôney Rodrigues.
Em todo o mundo, uma gigantesca quantidade de mais-valia é criada através de guerras, expansões extrativistas (e devastadoras) e megaprojetos – totalmente desconectada do bem-estar coletivo e que pode conduzir o mundo a um ponto crítico. É o que aponta nesta entrevista à Jacobin América Latina o geógrafo britânico David Harvey, professor da Universidade da Cidade de Nova York e agraciado com o Prêmio Vautrin Lud, o Nobel da Geografia, em 1995, e autor de livros emblemáticos como Condição pós-moderna e A produção capitalista do espaço.
Mas enquanto recursos são despejados no bolso das elites econômicas, o endividamento explode. Um estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI), mostra Harvey, apontou que se as dívidas do mundo inteiro fosses somadas e depois divididas pela população global, cada homem, mulher e criança que habitam este planeta teria uma dívida de 86 mil dólares. Ou seja, há um novo apartheid: de um lado os credores e, de outro, os devedores, que cada vez mais perdem renda, trabalho e poder de compra devido à inflação.
Paralelamente a isso, o sistema capitalista se transmuta. “Agora há Jeff Bezos em vez de Henry Ford”, lembra o geógrafo, o capital já não cria coisas, mas experiências e o neoliberalismo, agora aliado ao neofascismo, longe de estar esgota, firma-se como uma forma de “restauração e contínuo crescimento do poder de classe” – uma classe mesquinha, truculenta e que insiste numa “expansão exponencial” e autofágica de lucros e dividendos. Elon Musk, por exemplo, em apenas um ano ampliou sua riqueza de 25 bilhões para 145 bilhões de dólares.
Como então resgatar o Estado através de governos progressistas, como alguns que retornam ao poder na América Latina, e reorientá-lo para o bem-estar coletivo? Harvey aponta que o conselho de Lênin sobre o que fazer, ou seja, destruir o Estado capitalista e implantar outra organização política é impossível no atual momento histórico. Mas isso não significa resignação: é possível tentar transformar alguns de seus aspectos. Em sua análise, os Departamentos do Tesouro e os Bancos Centrais formam a “âncora do poder pró-capitalista dentro do aparelho estatal” – seria imprescindível, portanto, de alguma forma contê-los, e apostar mais nas agências de educação do que nas instituições financeiras.
Isso requer também um planejamento regional, principalmente voltado para o desenvolvimento de tecnologias, a preservação ambiental e a soberania agrícola e alimentar – sem cair na fantasia de se dissociar totalmente do sistema global. “Porque muitas coisas não têm sentido, como o Equador importando tomates da Holanda e aipo da Califórnia”, diz ele. Além disso, três problemas – ou montanhas a serem a serem escaladas no contexto global, como sugere a China – tornam-se preponderante: Moradia, Educação e Saúde – universal e gratuitas.
“Eu ficaria muito feliz se algum governo aparecesse e dissesse: ‘foda-se o resto, vamos nos concentrar apenas nessas três coisas [Educação, Moradia e Saúde para todos]’, que é o que Xi Jinping e [Franklin D.] Roosevelt disseram. Por que não pegamos toda a massa de lucro e redirecionamos para essas coisas, algo que só pode ser feito por meio de políticas sociais?”, questiona o geógrafo. “Por que não simplificamos e simplesmente dizemos que essas são tarefas que o Estado vai ter que fazer, que vamos assumir o controle do Estado capitalista para parar a crise atual e reorientar completamente o Estado mediante a realização desses três objetivos?”.
David Harvey. (Foto: Wikimedia Commos)
Eis a entrevista.
Eu queria voltar à ideia do imperialismo capitalista, não como o imperialismo de uma nação, mas do capital em geral.
Eu realmente não gosto de discutir o imperialismo porque acho que inclui algumas questões muito, muito críticas. E esses problemas nos consumirão se não os controlarmos. Tenho escrito muito recentemente sobre a teoria de Marx da taxa de lucro decrescente e da massa de lucro crescente. Todos prestam atenção no primeiro; já eu, no segundo. E o problema é a disposição da massa crescente de valor, um problema realmente sério.
Se analisarmos todas as informações sobre o Produto Interno Bruto (PIB) global, veremos que estamos em uma espécie de expansão exponencial onde a massa e sua absorção estão se tornando um problema crítico. Mesmo na ausência de Covid-19, é problemático despejar uma grande quantidade de mais-valia no oceano por meio de guerras e investimentos em megaprojetos que não fazem sentido em termos de bem-estar da massa da população.
Só para dar um exemplo disso, o Fundo Monetário Internacional [FMI] fez um estudo muito interessante sobre o endividamento internacional, propondo que se as dívidas do mundo inteiro fossem somadas e depois divididas pela população mundial, o resultado seria que cada homem, mulher e criança no planeta teria uma dívida de 86 mil dólares. Há um grande aumento do endividamento. E não devemos esse dinheiro aos marcianos, mas a nós mesmos. Mas há certas pessoas que são credores e outras que são devedoras, que estão alimentando os primeiros. E adivinha quem são os credores? Se observarmos o que aconteceu com a distribuição de renda durante a pandemia de Covid-19, o que veremos é um aumento maciço na riqueza e no poder da oligarquia. Elon Musk aumentou sua riqueza de algo como 25 bilhões para 145 bilhões de dólares em um ano. E o que diabos vai acontecer com todo esse endividamento? Porque na realidade a demanda na economia global foi alimentada por esse crescimento do endividamento, porque se não existisse a demanda teria colapsado e a economia global teria afundado.
Entramos também na produção de todos os tipos de novas mercadorias, agora que o capital não cria coisas, mas experiências. Meu modelo para apontar isso são as linhas de cruzeiro. Um navio de cruzeiro é muito dinheiro e capital fixo, onde há 2 mil pessoas empregadas para atender 3 mil hóspedes. E o produto, a experiência de velejar na água, é consumido instantaneamente. Uma das coisas que aconteceu com a Covid-19 foi que os navios de cruzeiro foram fechados e houve uma confusão terrível porque uma das grandes respostas para 2007-2008 foi construir uma economia global baseada no turismo, com a qual o volume de viagens internacionais passou de 800 milhões para algo como 1,4 bilhão em quatro ou cinco anos após 2009.
Então, de repente, há esse tipo de orquestração onde podemos perguntar quem são os ricos ou os bilionários hoje e de quais setores da economia eles vêm, porque antes eles costumavam ser do setor de automóveis ou do aço, mas agora há Jeff Bezos em vez de Henry Ford. A classe capitalista mudou. Meu argumento sobre o neoliberalismo é que se trata da restauração do poder de classe, o crescimento contínuo desse poder de classe.
Quanto ao tipo de economia que seria necessário para mudar essa situação… Como vamos desalavancar ou deflacionar a dívida? Uma das maneiras, curiosamente, é a inflação. Se você é um devedor, você quer inflação e espera que ela seja uma loucura, desde que sua renda suba com ela, o que permitiria que você se livrasse de todas as suas dívidas estudantis, por exemplo. Portanto, a deflação da dívida está na agenda. Portanto, essa inflação atual pode ser um sinal de deflação excessiva da dívida. Estou muito preocupado com esta questão da massa crescente e gostaria que um economista marxista passasse mais tempo falando sobre o problema de eliminar a massa crescente.
Você poderia nos dar uma definição aproximada de massa crescente?
Bem, Marx em O capital e nos Grundrisse disse que o objetivo do capitalista é tentar dispor de cada vez mais e mais riqueza, na forma de massa, de produto, massa de dinheiro. E a taxa de exploração da força de trabalho é um dos meios pelos quais os capitalistas aumentam sua massa, construindo um poder que se torna significativo. Por exemplo, o que você prefere ser? Alguém que tem um ativo que está ganhando 20% mas sobre 100 dólares ou alguém que está ganhando 2% sobre 10 milhões de dólares? A massa cria massa, é disso que se trata. Se você controla massa suficiente, pode controlar a política. Elon Musk tem tanta massa que pode comprar o Twitter, e os irmãos Koch criaram uma organização para financiar pessoas que colonizem conselhos escolares nos Estados Unidos, já que eles desempenham um papel enorme na política eleitoral.
Então é disso que se trata a massa. E é por isso que é tão importante quem a controla. Claro que internacionalmente os EUA têm maior massa e podem impor condições ao Equador, por exemplo. Mas agora há uma competição com a China pela massa crescente, porque quanto maior a parte que se obtenha dela, mais massa pode se fazer com ela.
Todo mundo fala sobre a taxa decrescente de lucro, mas esquecem da massa crescente. E fico muito zangado com os economistas marxistas porque eles se recusam a falar sobre as implicações disso, quando a maioria dos nossos problemas atuais têm a ver com a massa crescente.
Um dos conceitos-chave em seu trabalho é o de acumulação por despossessão, que também foi desenvolvido por Rosa Luxemburgo. Em relação à América Latina, qual foi o papel da região nesses ajustes espaciais e na dinâmica do endividamento? E que papel você atribuiria à América Latina na fase atual?
A América Latina é uma área potencialmente muito rica, uma parte do mundo com recursos abundantes, organizada coletivamente, onde também existem certas formas de governança nas populações indígenas que têm grande potencial para reorganizar o funcionamento do Estado em relação à economia. Se um radical assume o comando de um Estado capitalista, como o presidente Gabriel Boric no Chile, a grande questão é: o que fazer com esse Estado capitalista? O conselho de Lenin era destruir o Estado capitalista e reconstruir alguma outra organização política. Não acho que isso seja viável ou possível agora. Então é preciso de alguma forma tentar transformar certos aspectos do Estado capitalista.
Uma das coisas que gosto de fazer em relação à teoria do Estado é sugerir que devemos desagregar o que é o Estado. Há algo que chamo de nexo financeiro do Estado, que é o Tesouro e o Banco Central, que formam a âncora do poder pró-capitalista dentro do aparelho estatal. Então, uma das coisas que temos que fazer é tentar conter o poder do nexo financeiro do Estado e do Departamento do Tesouro e aumentar o poder das agências de educação, por exemplo.
Recentemente fiz um podcast sobre as oito liberdades de Roosevelt (todo mundo fala sobre quatro liberdades, mas na verdade são oito) e três têm a ver com acesso adequado à moradia, educação gratuita e assistência médica para todos. Na década de 1960, eles tentaram fazer algo nesses campos, mas tudo isso desmoronou na revolução neoliberal dos anos 1970 e 1980. E é interessante que o presidente chinês Xi Jinping, antes do surgimento do vírus, tenha anunciado que seu grande projeto era criar um mundo de qualidade e prosperidade comum, para o qual as três montanhas a serem escaladas seria uma casa e um entorno de vida decente, acesso gratuito à educação de qualidade para todos e assistência médica universal.
Eu ficaria muito feliz se algum governo aparecesse e dissesse “foda-se o resto, vamos nos concentrar apenas nessas três coisas”, que é o que Xi Jinping e Roosevelt disseram. Por que não pegamos toda a massa de lucro e redirecionamos para essas coisas, algo que só pode ser feito por meio de políticas sociais? Aqui em Nova York temos um grande boom da construção, mas são prédios para as classes altas. E ninguém nos EUA está preparado para aceitar que metade da população estadunidense já não pode mais se dar ao luxo de viver no país do jeito que o sistema de livre mercado funciona.
Nesse contexto, metade da habitação nos EUA deveria ser socialmente fornecida, porque alguma versão de habitação pública é necessária para que todos possam ter uma casa decente e um entorno de vida decente. Mas agora temos uma crise habitacional que afeta o mundo inteiro e temos que fazer algo a respeito. E a única maneira de consertar isso é através do público. E ele tem que ser socialista para fornecer, de uma forma ou de outra, um esquema de habitação pública para todos que necessitam. Por que não simplificamos e simplesmente dizemos que essas são tarefas que o Estado vai ter que fazer, que vamos assumir o controle do Estado capitalista para parar a crise atual e reorientar completamente o Estado mediante a realização desses três objetivos?
No que diz respeito à América Latina, uma das coisas que me vem à mente tem a ver com o papel particular do Estado capitalista latino-americano, que tem uma dinâmica de desenvolvimento geográfico desigual, principalmente pelo fato de a maioria dos países da região serem dependentes da extração de recursos naturais. Lembro que quando estávamos fazendo nossa pesquisa no Equador, um dos debates que tivemos durante o governo de Rafael Correa era sobre como criar políticas sociais e redistribuir riqueza. Há também algo interessante aqui em relação ao papel que a China desempenhou no Equador, ajudando a superar um pouco das pressões dos Estados Unidos.
Creio que há um conjunto de possibilidades limitadas atualmente dentro do que é chamado de globalização. E me parece que há um lado negativo nisso, que é que, se você for para a autarquia completa, provavelmente acabará na pobreza mais miserável. Portanto, a autarquia completa não é uma possibilidade viável. Mas creio que há uma chance de começar a pensar em planejamento regional, em soberania agrícola e alimentar e muitas outras questões.
Porque muitas coisas não têm sentido, como o Equador importando tomates da Holanda e aipo da Califórnia. Portanto, há algumas inovações que são possíveis nessas áreas, reformulando as relações globais. Também me surpreendi, por exemplo, que o Equador estivesse importando tantos alimentos em uma área fértil e climaticamente favorável, onde o abastecimento poderia ser garantido por meio de ações locais. E assim deve ser, mas sem cair na fantasia de se dissociar totalmente do sistema global.
Minha pergunta se referia mais às implicações de qual papel a América Latina vai desempenhar neste novo contexto em que há diferentes potências econômicas hegemônicas. Porque no caso do Chile ou Equador, países exportadores de recursos naturais, podem aproveitar essas situações geopolíticas para exportar mais e gerar mais recursos.
Creio que a ideia do que tradicionalmente chamamos de imperialismo ou globalização ou o que quer que seja é que beneficia toda a população dos países capitalistas avançados. E creio que esse é um argumento errôneo, pois geralmente é para o grande benefício de um grupo muito pequeno da classe capitalista. Assim, a base de classe da globalização é parte do problema. Porque isso significa que se um governo de esquerda chegar ao poder em um determinado país – Equador, Bolívia ou qualquer outro lugar – será muito limitado, tanto pelas condições externas quanto pelo fato de que a economia doméstica continua sendo dominada por uma classe capitalista de determinado tipo.
Então, se terá um governo de esquerda que deve negociar com as atividades práticas de produção e as atividades de distribuição que são organizadas pelo capital. E isso significa que, em um certo ponto, ou se decide que vai socializar tudo ou de alguma forma encontra uma maneira de disciplinar o que a classe capitalista faz em termos de produção, distribuição e consumo.
Agora parece estar na moda falar do fim do neoliberalismo. O que você acha disso?
Tenho uma resposta muito simples. Depende muito da sua definição de neoliberalismo, é claro. Vejo o neoliberalismo como uma tentativa de recuperar e fortalecer o poder de classe e não vejo que isso esteja ameaçado. Na verdade, o que aconteceu é que nas primeiras duas ou três décadas de neoliberalismo houve uma boa quantidade de consentimento popular. Mas acho que muito desse consentimento evaporou depois de 2000 e realmente caiu entre 2007-2008, porque, como eu já apontei em meus trabalhos, não poderia durar sem entrar em aliança com os neoconservadores e se converter em autoritário.
Então agora temos um tipo de neoliberalismo autoritário, que está beirando o neofascismo em certos lugares. De fato, se observamos todos os dados sobre desigualdade de renda, fica claro que a desigualdade de renda acelerou em vez de diminuir. Então, desse ponto de vista, dada a minha definição de neoliberalismo, é algo que ainda está em marcha.
O que podemos esperar do próximo período? Quais são as previsões sobre o que poderia acontecer? Porque vimos que também há um grande aumento do puritanismo, do nacionalismo e uma escalada de conflitos que fazem o panorama futuro parecer bastante sombrio.
Sim, obviamente não sei qual será o resultado, mas há muitas forças em conflito. Eu reconheceria isso como uma aparência superficial, embora existam alguns problemas-chave que, do meu ponto de vista, terão de ser resolvidos a longo prazo. Um deles se concentra nessa questão da massa crescente: da dívida, da produção e até da população (embora agora esteja diminuindo um pouco e haja 50 ou 60 países no mundo que têm taxas negativas de crescimento populacional, inclusive a China).
Então eu creio que a maioria dos problemas que existem em termos de degradação ambiental são danos colaterais da massa crescente, ou seja, a razão pela qual há uma concentração crescente de CO2 tem tudo a ver com a massa crescente das atividades econômicas. E nós realmente não falamos sobre as questões ambientais, mas elas são cruciais e totalmente conectadas a essa questão de massa crescente. Portanto, precisamos começar a controlar o aumento da massa e encontrar maneiras de acomodá-lo para que as tensões econômicas que estamos vendo não irrompam. Para mim, é um problema subjacente ao qual não se presta atenção.
O segundo ponto que quero destacar é que devemos ter cuidado ao imaginar que tudo é em benefício da classe capitalista. A classe capitalista está dividida em facções e a facção por trás do complexo industrial militar está muito feliz neste momento, o que não quer dizer que alguém que está na produção de alimentos esteja. É claro que todos os capitalistas tirarão vantagem, se puderem, de algo como a inflação de preços. Todo mundo está subindo os preços agora porque os demais estão fazendo isso.
Isso é muito interessante, porque o neoliberalismo costuma ser pensado como um acordo político da classe capitalista internacional…
O capitalismo industrial não era a luta de longo prazo do capitalismo porque poderia derivar no socialismo. Parte disso começou a surgir no final da década de 1960, quando a classe capitalista decidiu adotar uma forma de capitalismo onde isso não era possível. Essa forma de capitalismo era, é claro, a das finanças. Os banqueiros de investimento nas décadas de 1950 e 1960 tinham muito pouco poder e estavam tão desacreditados pelo que havia acontecido na década de 1930 que ninguém queria ouvi-los. Então eles começaram a ficar muito inquietos no final da década de 1960 e planejaram um golpe contra o capitalismo internacional dizendo que o capital financeiro governaria o galinheiro. E, efetivamente, o capital financeiro é o que impera agora.
Mas foi um movimento de classe que argumentou que a classe capitalista industrial era incapaz de controlar a situação adequadamente. Havia modelos privilegiados, sindicalização, partidos social-democratas e até comunistas. Toda essa configuração não era do gosto da classe capitalista. Então eles procuraram uma forma de capital que realmente lidasse com a questão trabalhista, com a questão nacional, com a globalização e todas essas coisas.
Os representantes do capital financeiro arquitetaram a desindustrialização dos Estados Unidos. Hoje, os Estados Unidos se beneficiam do capitalismo, mas se formos às cidades industriais destruídas em Ohio, veremos o vício em opioides que afeta populações inteiras. Uma coisa muito interessante é que o cálculo da riqueza nacional não incluía finanças, seguros e imóveis até a década de 1990. A partir de então, o Goldman Sachs poderia afirmar ser a instituição mais produtiva da economia dos EUA, porque ganha muito dinheiro sem fazer nada. Assim, Londres e Nova York aparecem de repente como as cidades globais onde toda a atividade acontece e os centros mais produtivos das economias, quando na verdade não estão fazendo nada.
Fonte: https://www.ihu.unisinos.br/626511-estamos-vendo-uma-reconfiguracao-da-ordem-mundial-entrevista-com-david-harvey
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