Veteranos do Partido Comunista temem que religião possa causar 'divisões ideológicas' no país
Aumento no número de religiosos gera
preocupações e desconforto para
o Partido Comunista
Houve uma época na qual Devon Chang teve dificuldades para conciliar suas duas fés: o cristianismo, que ele abraçou em 2005, aos 19 anos, e o Partido Comunista Chinês, que o abraçou um ano antes. Sua submissão a um Deus todo poderoso não significava que ele deveria renunciar ao clube dos ateus de Marx e Mao?
Não necessariamente. Um palestrante da universidade, também convertido, sugeriu que se todos os membros do Partido Comunista encontrassem Jesus, o cristianismo poderia dominar a China. “Logo, é bom que eu me torne um cristão”, pensou Chang.
O partido não vê a situação da mesma forma. Embora pessoas se juntem ao partido por razões muito mais profissionais do que ideológicas, a religião ainda é proibida entre os membros. Na prática, essa vem sendo, por anos, uma espécie de política “não pergunte, não conte” chinesa. Mas sinais cada vez mais fortes indicam que o partido está pronto para ser mais duro com seus fiéis, e a ideia de Chang, do cristianismo como um cavalo de Tróia, pode estar por trás disso.
Se você não pode vencê-los…
Especialistas afirmam que, do 1,3 bilhão de habitantes da China, algo em torno de 250 mil agora são religiosos praticantes (embora o governo somente reconheça cem mil religiosos). A vasta maioria dos religiosos é de budistas e taoístas. Estima-se que o número de cristãos deva variar entre 50 e cem mil (o número é difícil de ser precisado, pois muitos frequentam “igrejas secretas”). Por todo país, governos locais reconstruíram templos e aproveitaram para lucrar em cima do turismo religioso. Nas áreas rurais, templos e igrejas ajudaram a levar educação e saúde, com a bênção não-oficial dos líderes locais do partido. Alguns desses líderes também são chefes de igrejas.
"O país precisa do partido, e indivíduos
precisam de sua fé,
dizem eles."
Na ausência de figuras religiosas “oficiais” dentro do partido, especialistas ocidentais e chineses costumam citar uma pesquisa de 2007 realizada pela Horizon, uma empresa de pesquisas de Pequim, em cooperação com acadêmicos norte-americanos. A pesquisa aponta que 1/6 dos membros do partido têm crenças religiosas. Isso seria equivalente a mais de 13 milhões de pessoas. A vasta maioria é de budistas. Cerca de 2 milhões são cristãos.
Os sinais de uma abordagem mais dura vêm de Zhu Weiqun, vice-ministro da Frente Unida do Departamento de Trabalho do partido, um influente ideólogo, que alertou para o perigo do crescimento religioso nas fileiras do partido em dezembro. Se membros do partido puderem ter crenças religiosas, escreveu Zhu, isso resultará “num abalo e na perda da posição do marxismo, e na divisão ideológica e teórica do partido”. Zhu também alertou para o perigo de figuras religiosas tomarem o controle das políticas relativas à religião. Isso minaria a luta do partido contra o “extremismo religioso no oeste chinês”, especialmente contra seguidores do Dalai Lama. Zhu é conhecido como um feroz crítico na oposição do partido ao líder tibetano, a quem se refere como um “desagregador”, que é “mau” e “traiçoeiro”.
A relação do partido com religiosos não-afiliados é bastante complicada. Eles têm o direito de acreditar em uma das religiões aprovadas pelo Estado (budismo, taoísmo, islamismo, além do cristianismo católico e protestante) e frequentar locais de adoração. Na zona rural, o partido tolera as religiões tradicionais chinesas, apesar de uma proibição das superstições. A principal preocupação do governo é com o separatismo, que poderia ser alimentado pelo budismo no Tibet e pelo islamismo no noroeste. Mas igrejas católicas leais ao papa e algumas das igrejas protestantes mais desafiadoras também são fortemente controladas.
Ameaças contra a estabilidade social estão abalando o partido, e os últimos quatro anos viram uma sucessão de crises que deram força à ala linha-dura e conservadora do partido, onde o preconceito com a religião é mais evidente. Chang e outros dois membros do partido que frequentam a mesma igreja em Pequim insistem que as duas crenças podem coexistir. O país precisa do partido, e indivíduos precisam de sua fé, dizem eles. Membros cristãos do partido lembram que Jesus ensinou a seus seguidores a darem “a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. O dízimo partidário de Chang custa US$ 1,60 mensais, e ele pretende continuar pagando regularmente a seus correligionários.
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