segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

O melhor que posso fazer pelos jovens de hoje é sair de cena

Lucy Kellaway*
Quando eu estava perdendo tempo, na semana passada, com o deplorável site de Davos, me deparei com dados estatísticos graves. Nos próximos dez anos haverá 1,2 bilhão de jovens procurando emprego e apenas 300 milhões de postos de trabalho disponíveis. Ao lado desses dados havia um convite para escrever um ensaio que resolvesse o problema.
Por algum tempo fiquei empolgada e comecei a apontar meu lápis, uma vez que estou certa de ter a resposta perfeita para a questão do desemprego entre os jovens. Mas, infelizmente, após um exame mais acurado, constatei que a competição não está aberta a pessoas como eu, mas à "Young Global Shapers Community" ("Comunidade dos Jovens Formadores Mundiais"), que diz respeito a "indivíduos extraordinários" na faixa dos 20 e poucos aos 30 e poucos anos.
Mas, por mais extraordinárias que sejam essas pessoas, garanto que seus ensaios não serão bons. Os jovens receberam um título para orientar seus ensaios: "O que eu e a comunidade mundial podemos fazer para criar empregos para a minha geração?" Mas não há muito o que eles possam fazer porque nós, os velhos, estamos atravancando seu caminho.
Em vista disso, decidi levar adiante minha inscrição, sem considerar a faixa de idade. Meu ensaio é bem curto - o que, espero, será um alívio para os jurados. O que eu faria pode ser resumido em duas palavras: pedir demissão.
Essa verdade inescapável e embaraçosa vem sendo reiteradamente repetida na minha cabeça nos últimos meses, uma vez que continuo conhecendo pessoas de 20 e poucos a 30 e poucos anos desesperadas por um emprego em jornalismo - e pelo meu, em particular.
Eu tento enrolá-los com superficialidades sobre o quanto o mercado de jornalismo é difícil, mas ninguém se deixa enganar. O verdadeiro motivo pelo qual eles não podem fazer meu trabalho é o fato de eu mesma o estar fazendo. Isso se encaixa em quase todas as profissões. Os jovens não conseguem avançar, umavez que em todo lugar encontram minha geração, serena e autoconfiante, "in situ". Assim, a única maneira de resolver o problema é fazer com que todas as pessoas de determinada idade, digamos, de mais de 50 anos, puxem o carro.
"Ter pessoas na ociosidade num período
em que elas estão cheias de energia
e dispõem do volume máximo
 de massa cinzenta é
um desperdício tremendo."


Antes que eu prossiga, tenho de deixar claro uma coisa. Esta não é uma carta de demissão - pretendo segurar meu emprego com todas as forças. O problema é que não consigo resistir à tentação de chamar a atenção para o óbvio, embora isso não atenda aos meus interesses. Romper o impasse à força não apenas faria muito para solucionar o desemprego entre os jovens mas também teria outras finalidades.
A questão é definir se é melhor as pessoas vivenciarem uma década de depressão e subemprego no começo ou no fim da carreira. A resposta é fácil: certamente é melhor ser mais ativo no começo. Ter pessoas na ociosidade num período em que elas estão cheias de energia e dispõem do volume máximo de massa cinzenta é um desperdício tremendo.
De qualquer maneira, a minha geração gozou de muitas vantagens por tempo demais. Compramos casas quando elas ainda eram financeiramente acessíveis, embora com certo esforço. Tivemos ensino e aposentadorias gratuitos. Foi tudo muito bom, mas é hora de começar a pagar.
Uma das maiores vantagens dos jovens é que eles são baratos. Mudar dos velhos para os jovens reduziria os salários e resolveria o problema da remuneração dos executivos com uma só cajadada. Quase todas as pessoas que ganham valores grotescos têm mais de 50 anos - livrar-se delas significará que os vencimentos dos principais executivos cairão. O diretor do Royal Bank of Scotland (RBS), Stephen Hester, estava um ano atrás de mim na universidade - o que significa que ele deve estar com mais ou menos 51 anos.
É uma pena, Steve, mas seu tempo acabou também. Testei esta ideia com vários contemporâneos e todos eles disseram que é bobagem. Eles resmungam sobre esse "exemplar de falácia trabalhista" com um olhar de pânico. Depois dizem: pense na perda de experiência. Respondo que a experiência pode estar sendo superestimada; de qualquer maneira, não estou defendendo dar enormes cargos a crianças, mas a pessoas de 40 e poucos, com 15 ou 20 anos de experiência, período certamente tão bom quanto 30 ou mesmo 40 anos de experiência.
Em seguida, eles protestam que os ocupantes dos cargos máximos estão ali porque são bons, e se desvencilhar de gente boa é burrice. Isso, até certo ponto, é verdade, mas seguramente há pessoas mais jovens que são boas também. De qualquer maneira, eu poderia dar um jeitinho para alguns superastros de certa idade - dos quais há pouquíssimos - continuarem onde estão.
Diante disso, o que faria o restante de nós, desempregados de 50 e poucos e 60 e poucos anos? Poderíamos vender nossa experiência como consultores. Poderíamos começar de novo fazendo uma coisa diferente como nos tornar empreendedores, viver dos lucros que arrecadamos em casa ou ser frugais e economizar - e ir para a universidade. Sempre pareceu um desperdício pessoas de 20 e poucos anos tirarem títulos acadêmicos inúteis em inglês e história, quando as de 50 aproveitariam muito mais.
Continuo dizendo que não gosto da ideia. Simplesmente acredito nela e a estou apresentando como meu ensaio para disputar o prêmio. Sei que o ganhador receberá €10 mil. Espero que eu não ganhe, mas, se ganhar, vou precisar do dinheiro.
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* Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
Fonte: Valor Econômico on line, 06/02/2012
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