sábado, 4 de fevereiro de 2012

Quase de graça

Juremir Machado da Silva*

Crédito: ARTE JOÃO LUIS XAVIER
Não consigo perder essa mania de falar de livros. Mas não só do conteúdo das obras. Gosto de falar de preços. Elio Gaspari citou, outro dia, uma jovem de 27 anos que, depois de ter sido recusada por 50 editoras, publicou seus livros na Internet a preço baixo e vendeu 1 milhão de cópias, lucrando 2 milhões de dólares. Admiro esse tipo de iniciativa. Defendo o respeito a direitos autorais. Sei, contudo, que o modelo atual de negócios de livros deve ser repensado. Já está em transformação acelerada. Paulo Coelho defende a pirataria por ser rico e diz que a cópia virtual gratuita ajuda a vender livro impresso. No caso dele e de outros até pode funcionar. É uma espécie de resíduo do papel, uma questão de geração. Um menino que tenha 6, 8 ou 10 anos de idade hoje nunca terá no futuro a tentação ou a necessidade de sair do virtual para o papel. As livrarias que vendem obras em papel vão rarear. Em Nova Iorque, começou a quebradeira.

"McBue é mais radical:
 dentro de
dez anos só se lerá em tablets."



Aos poucos, escritores e autores estão acordando para a imperiosa necessidade de baixar preços. A Amazon está vendendo e-books a US$ 0,99. Isso mesmo. Alguém poderá dizer que não pode pagar e que, portanto, terá de fazer download gratuito e talvez ilegal. A promoção da Amazon envolve diferentes editoras e autores contemporâneos. Por exemplo, George Pelecano, roteirista da série "The Wire", da HBO, é autor de 18 livros impressos, o mais bem-sucedido tendo vendido 29 mil exemplares. Um selo da Amazon ofereceu recentemente a US$ 0,99 livros de Ed McBain. Se dá certo, os preços aumentam um pouco com o passar do tempo, indo, por exemplo, a 4,99 dólares. No mercado convencional, o preço começa alto e depois, se tudo dá errado, cai. A estratégia agora é começar baixo e, se tudo der certo, subir um pouco. Uma revolução. Esses dados são de uma matéria do Wall Street Journal. O mesmo está acontecendo com os jornais. O francês Libération oferece a sua edição eletrônica por 1 euro no primeiro mês e 12 euros a partir do segundo.
No livro impresso ainda não dá para baixar tanto, mas os preços vão desabar. Em livrarias virtuais já é possível comprar livros usados, de todos os tipos, gêneros e autores, por valores irrisórios. Tenho adquirido preciosidades a R$ 5,00. Alguns nunca renunciarão ao impresso. Serão atendidos na sua preferência. O grosso dos novos leitores, segundo Mike McBue, criador do Flipboard, uma ferramenta de diagramação de publicações eletrônicas que as faz tomar a última vantagem das publicações em papel, só usará tablets. McBue é mais radical: dentro de dez anos só se lerá em tablets.
O gosto por histórias permanecerá. Mas um mundo está desaparecendo sob nossos olhos. O que fazer? Desesperar-se? Tornar-se definitivamente amador? Publicar só pela necessidade de expressar uma ideia ou um sentimento? A redução do preço é o caminho mais seguro para dar certo. O oráculo de Palomas enviou-me uma previsão na contramão de tudo o que está sendo dito: cada clique para baixar obras culturais integrais na Internet de amanhã será muito barato e sempre pago. Quem viver, se não vir, estará, ao menos, vivo, o que já é um baita negócio.
--------------------
* Sociólogo. Tradutor. Prof. Universitário. Colunista do Correio do Povo
Fonte: Correio do Povo on line, 04/02/2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário