sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A nova Sandy

Juremir Machado da Silva*

Crédito: Arte João Luis Xavier

Além de ser o melhor escritor brasileiro da atualidade (e o mais modesto), sou historiador, jornalista, radialista e sociólogo. Todo mundo sabe disso. Mas não custa lembrar. Meu doutorado e meu pós-doutorado na Sorbonne (quase seis anos de Paris) me autorizam o exame de certos assuntos delicados. Sou crítico de mídia, o Guy Debord de Palomas. Não sabe, caro leitor, quem é Guy Debord? Explico novamente. É o autor de "A Sociedade do Espetáculo", o mais importante livro de sociologia da comunicação já publicado no mundo. Como sociólogo cuidadoso, deixo um assunto repousar para só analisá-lo depois de madura reflexão. Meu tempo de espera costuma ser de uma semana. Foi o que deixei passar para me aventurar no "caso Sandy", a minha mais nova obsessão.
Sandy me fez pensar na mão invisível do mercado de Adam Smith. Na verdade, ela me fez pensar que tudo é nicho de mercado. Depois de ser a guriazinha assexuada da música insípida, o que lhe valeu milhões de admiradores, ela cresceu, casou-se e virou garota-propaganda da Devassa. A ex-virgem profissional virou devassa? O que vende mais uma Devassa: uma jovem que foi modelo de virtude ou uma modelo de virtude que assume seus desejos devassos? Sandy soltou a franga. Disse que sente prazer anal. Revelou que sonha em ir a um sofazão. Só não foi ainda, no exterior, of course, por ter medo da língua de alguma brasileiro. No sentido, claro, de ser vista e gerar falatório. Por fim, entregou o irmão, Júnior, chamado de "Mariquinha" no colégio, e contou que coleciona lingerie. Por exemplo, calcinhas fio-dental.
"Sandy me fez pensar na mão invisível
do mercado de Adam Smith. Na verdade,
ela me fez pensar que tudo
é nicho de mercado."
O pai da moça disse que nenhum pai gosta de ler essas coisas. O marido da moça garantiu que a mídia tirou do contexto a frase sobre o prazer anal. Ela disse que não disse, mas disse também isto: "Está valendo a brincadeira". Valeu! Sandy reposicionou-se no mercado? Colocou tempero no seu novo cardápio? Será tudo uma jogada de marketing combinada com especialistas em "enrolation"? Estará Sandy pensando em entrar na faixa de mercado da Lady Gaga e da Britney Spears? Certo é que a eterna menininha mexeu com o imaginário masculino e bombou na mídia, especialmente nas redes sociais. Que espertinha! Agora só resta a Xuxa, a rainha-mãe, a tia virgem, apesar da filha, de um filme comprometedor e de alguns romances gelados, como modelo de um passado assexuado capaz de encantar... A quem mesmo? Sei lá. As crianças. Ou os marmanjos bizarros? Sandy mudou. Como?
Adotou um choque de erotização, também conhecido como enfiar o pé na jaca. Mereço destaque internacional por essa leitura radical e inédita. As ideias de Guy Debord mostraram-se tão terrivelmente justas que ele se suicidou. É a minha hipótese. Não pretendo seguir o exemplo dele quanto ao desfecho. De qualquer maneira, a sociedade do espetáculo chegou ao fim. A nova Sandy, a devassa, representa certamente o pós-espetáculo. Agora só falta o Júnior fazer a sua revolução. O que poderá ele dizer para superar a irmã e ocupar um novo nicho de mercado? Nem imagino. O papai, claro, está de olho nele.
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* Sociólogo. Escritor. Tradutor. Prof. Universitário. Colunista do Correio do Povo
Fonte: Correio do Povo on line, 19/08/2011
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