Lya Luft*
Lendo um livro que me emociona, do
pensador canadense professor Jordan Peterson: 12 Rules for Life, An
Antidote for Chaos. Parece que está por ser publicado no Brasil. Corram e
leiam! Não é autoajuda, apesar do título, que talvez nos induza ao
erro. É um ensaio muito agradável de se ler, misturando filosofia,
mitologia, psicologia, antropologia, política: revoluciona um pouco o
conceito de democracia e liberdade, quando beiram a bagunça e o caos.
Naturalmente, não o resumirei aqui, mas comento algumas de suas ideias
de que compartilho inteiramente. Uma delas, o conceito ilusório de
liberdade como aquela cenoura na frente do jumento para que ele ande.
Liberdade como penso que deve ser, que nos faz crescer, conviver,
eventualmente progredir, construir e atingir certo grau disso que
chamamos "felicidade", num meio-termo entre o caos e a rigidez.
Rigidez, jamais. Nem mesmo a rígida ideia de liberdade como ausência de
regras, de disciplina, de concessões, de limitações. O ser humano, como
os outros animais, necessita de regras e ordem. Não para se punir ou
mutilar, mas para que veja alguma luz, enxergue algum caminho, e se
sinta bem progredindo enquanto ser humano.
No começo de minha
carreira, traduzi um livro de uma psicóloga americana (esqueci, nesse
longo tempo, nome e título) sobre crianças criadas praticamente sem
limites. Um menininho tanto atormentou a mãe, que certa vez ela lhe deu
uma palmada no traseiro. Para horror de certos educadores ultramodernos,
o menino suspirou aliviado, abraçou a mãe e disse algo como "até que
enfim você prestou atenção em mim". Sem limites, sem regras, seremos
piores do que os animais selvagens, que se guiam pelo instinto. Nós, que
tanto falamos em natureza, andamos bem longe dela, nossos instintos se
embotaram, e nem todos servem para conviver no mundo moderno: matar,
devorar o outro que nos incomoda, não são atividades que se prezem. No
fundo de cada um de nós, sobrevive um predador atávico, que precisa de
algumas regras para poder criar sua personalidade, sua vida, seu mundo.
Este mundo, em que se possa viver em paz. O caos conduz ao caos, provoca
profunda angústia, causa destruição e morte, e eventualmente loucura. E
não me refiro a um mítico caos total, mas a um nível preocupante de
desordem, violência, agressividade, zero empatia.
Então, como
tantas vezes nesses anos todos escrevendo em revista ou jornal, ou
falando nas palestras, que hoje raramente aceito, repito aqui,
incansável e convicta: tudo começa em casa. A educação, a formação, as
bases de uma vida feliz, conforme o sonho ou a possibilidade de cada um.
Viver decentemente, conquistar algumas coisas positivas, sentir-se bem
na própria pele exige que se fuja do caos, que pode parecer interessante
para alguns visionários ou ideólogos obstinados, mas é feio, burro, e
pobre. E se não recebermos desde pequenos algum senso de ordem, regras,
conceitos de vida, passaremos o resto da nossa lutando talvez de maneira
inglória para não sermos selvagens detestados ou temidos.
Assim
que o livro do doutor Peterson sair no Brasil (ou pela Amazon para quem
lê no idioma original), procurem por ele: faz bem à alma, abre a
cabeça, e de certa forma conforta saber que nós, que apreciamos alguma
ordem, não estamos sozinhos.
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* Escritora. Colunista da ZH. Cronista. Tradutora.
Fonte:http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/acessivel/materia.jsp?cd=6812447e101094f86b8bbcf140a3d4bd 03/03/2018
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