quinta-feira, 23 de junho de 2011

Vaticano tenta reviver a adoração eucarística

Durante sete séculos, a adoração eucarística – o ato de rezar diante de
 uma hóstia consagrada exposta – foi uma das formas mais populares
de devoção na Igreja Católica Romana, o foco das orações e hinos,
e um símbolo distintivo da identidade católica.

Depois das reformas modernizadoras do Concílio Vaticano II (1962-1965), a prática caiu em desgraça, especialmente na Europa e nos EUA. Mas ao longo da última década, com os papas João Paulo II e Bento XVI, a Igreja tem encorajado fortemente um renascimento da prática.
"Ninguém come esta carne sem primeiro a ter adorado; pois pecamos se não a adoramos", disse Bento, citando Santo Agostinho, em um discurso no Vaticano em 2009.
Na próxima semana (20 a 24 junho), a Pontifícia Universidade Salesiana de Roma vai hospedar uma conferência acadêmica sobre a adoração eucarística, em que os palestrantes irão incluir seis proeminentes cardeais, com foco sobre a redescoberta da prática.
Ao mesmo tempo, no entanto, alguns teólogos objetam que a adoração é ultrapassada e desnecessária, e alertam que ela pode levar a mal entendidos e desfazer décadas de progresso na educação dos leigos católicos sobre o significado do sacramento.
A adoração eucarística pelos leigos originou-se no século XIII como um substituto para o recebimento da Comunhão na missa, disse o monsenhor Kevin W. Irwin, reitor da Escola de Teologia e de Estudos Religiosos da Universidade Católica dos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, disse, em que a Igreja muitas vezes incentivava o sentido de "indignidade pessoal" do fiel para receber o sacramento – que os católicos acreditam ser o corpo de Cristo –, muitas pessoas recorriam, ao contrário, à chamada "comunhão ocular".
A adoração eucarística também foi usada como uma ferramenta de ensino para reafirmar a doutrina da "presença real" de Cristo na Eucaristia, disse o Pe. Richard P. McBrien, renomado teólogo da Universidade de Notre Dame.
Por exemplo, disse McBrien, a devoção cresceu durante os séculos XVI e XVII da Contrarreforma, em resposta aos argumentos de alguns reformadores protestantes de que a Eucaristia era meramente um símbolo, não o corpo real de Cristo.
No tempo em que os padres celebravam a missa em latim, com uma participação mínima da congregação, os hinos e as orações associadas à adoração davam aos leigos católicos uma oportunidade para o louvor público, disse Irwin.

"A Santa Comunhão é algo que deve
ser comido, não adorado".
Por essa razão, McBrien disse
que a prática deveria ser
 "tolerada, mas não encorajada".
As reformas litúrgicas do Concílio Vaticano II aumentaram imensamente a participação dos leigos na Missa, o que, segundo Irwin, satisfez a "perceptível necessidade de participação na oração pública". Irwin chamou isso de uma "razão subjacente" para o declínio da prática.
Em sua última encíclica, Ecclesia de Eucharistia (2003), João Paulo lamentou o surgimento de uma "compreensão muito redutiva do Mistério Eucarístico", que desencoraja a adoração. Ele e Bento endossaram inequivocamente a prática.
Em 2005, de acordo com estatísticas do Vaticano, havia cerca de 2.500 capelas ao redor do mundo – incluindo 1.100 nos Estados Unidos – que ofereciam as chamada adorações "perpétuas", 24 horas por dia. Muitas outras paróquias oferecem agora as "horas santas", quando a hóstia consagrada é exposta para a oração silenciosa ou para serviços religiosos que incluem leituras e hinos.
A adoração também é central para a Renovação Carismática Católica, um dos movimentos mais dinâmicos e de mais rápido crescimento da Igreja, especialmente no mundo em desenvolvimento.
Estudantes universitários norte-americanos têm-se revelado particularmente receptivos à revitalização da adoração eucarística. A capela universitária da Universidade Católica dos EUA reúne regularmente 150 ou mais estudantes nas suas duas horas santas semanais de adoração, de acordo com o capelão do campus, o Pe. Jude DeAngelo.
"Há um pouco mais de intimidade" na oração diante da hóstia exposta, disse Brett Garland, estudante da Universidade Católica de Ohio, que estuda teologia e estudos religiosos. "Há uma diferença, também, porque você sabe que os outros estão ali pela mesma razão. É um chamado à oração".
A adoração tem apelo porque facilita uma "experiência espiritual passiva", disse Adam Wilson, representante da Sociedade Cardeal Newman, de Virginia. "É um lugar onde Nosso Senhor vai ao encontro da pessoa, e a pessoa não tem que fazer nada mais do que estar presente para Nosso Senhor", disse Wilson.
A Sociedade Cardeal Newman, que promove um sentido tradicional da identidade religiosa em faculdades e universidades católicas, promoveu uma exposição no campus sobre "Milagres Eucarísticos" e recentemente divulgou um vídeo online promovendo a adoração entre os estudantes universitários.
A adoração também é atrativa, disse Irwin, como uma "manifestação externa de uma identidade católica única", assim como outras práticas tradicionais que ganharam popularidade novamente, como as sextas-feiras sem carne.
Irwin também observou que há um apelo crescente à adoração entre os católicos divorciados e de segunda união, que estão proibidos de receber a Comunhão, mas podem participar da adoração. Além disso, as paróquias que não possuem párocos de tempo integral podem oferecer a adoração como uma forma de oração comunitária no lugar da missa.
McBrien reconheceu que alguns católicos consideram a adoração como "espiritualmente enriquecedora", mas disse que muitos liturgistas veem-na como um "retrocesso à Idade Média".
"Ela distorce o significado da Eucaristia", disse McBrien. "Ela corrói o aspecto comunitário e corrói o fato de que a Eucaristia é uma refeição. A Santa Comunhão é algo que deve ser comido, não adorado".
Por essa razão, McBrien disse que a prática deveria ser "tolerada, mas não encorajada".
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A reportagem é de Francis X. Rocca, publicada no sítio Religion News Service, 16-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: IHU on line, 23/06/2011

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