Luiz Felipe Pondé*
Todos ficam preocupados com o direito dos bandidos. E os direitos de quem trabalha?
A população está entregue às traças, enquanto nos palácios, gente
inteligentinha de todo tipo (com o mesmo caráter da aristocracia
pré-revolucionária de Versailles) discursa sobre "direitos humanos dos
bandidos", toma vinho chileno, paga escola de esquerda da zona oeste de
São Paulo que custa 3 mil reais mensais e vai para Nova York brincar de
culta.
A inteligência ocidental está podre, mergulhada em seus delírios de
reconstrução do mundo a partir de seus três gnomos Marx, Foucault e
Bourdieu.
Nós, desta casta de ungidos, desprezamos o povo comum porque pensamos que o que eles pensam é coisa de gente ignorante.
Outro dia fui abordado por um frentista num posto perto da minha casa na
zona oeste (perto daquela praça destruída aos domingos pelas bikes
--"bicicletas" na língua de pobre). Ele disse: "O senhor não é aquele
filósofo da televisão?". E continuou: "Não pense que porque somos
proletários, não entendemos o que o senhor fala na televisão".
Quem advinha do que ele queria falar? Este posto sempre foi 24 horas e
agora não é mais. Por quê? Disse ele que estavam todos, do dono aos
funcionários, cansados de serem assaltados toda noite. Disse ele: "O
ladrão vem na sua moto, para, põe a arma na nossa cara, rouba tudo,
ameaça nos matar e vai embora. Nada acontece".
E mais: "E fica todo mundo preocupado com o direito dos bandidos. Onde ficam os direitos de quem trabalha todo dia?".
Vou dizer uma blasfêmia, dirão alguns dos meus amigos da casta
inteligentinha: se preocupar com direitos dos bandidos é apenas um modo
chique de continuar se lixando para o "povo", assim como os coronéis
nordestinos sempre se lixaram, a diferença agora é que a indiferença
para com o destino das pessoas comuns vem regada a vinho chileno e
leituras de Foucault.
A "elite branca letrada" é completamente indiferente para com o destino desse frentista.
Ele pede para que a polícia "acabe com os bandidos para ele poder
trabalhar e a mulher e filhos dele não serem mortos". Ingênuo?
Simplista? Talvez, mas nem por isso menos verdadeiro na sua demanda "por
direitos".
A verdade é que estamos mergulhados num blá-blá-blá pseudocientífico das
razões que levam alguém a ser bandido, seja qual for a idade, e
enquanto isso esse frentista se ferra.
O que terá acontecido, que de repente a elite letrada e pública ficou
tão "sensível ao sofrimento social" e tão indiferente ao sofrimento
desta "pequena gente honesta"? Até escuto alguns de nós dizer: "São uns
mesquinhos que só pensam nas suas vidinhas". Quem sabe alguns mais
anacrônicos arriscariam: "Isso é resquício do pensamento pequeno
burguês".
A verdade é que nós estamos pouco nos lixando para o que essa gente que
anda de metrô, trem e quatro ônibus sofre. Todo mundo muito "alegrinho"
com a PEC das empregadas domésticas, mas entre elas e os bandidos a
vítima social são os bandidos.
A pergunta que não quer calar é: por que em países islâmicos, por
exemplo, com alto índice de pobreza, não existe criminalidade endêmica?
Será que tem a ver com medo da terrível punição corânica?
Dirão os inteligentinhos que a causa da criminalidade é social. Hoje em
dia, "causa social" serve para tudo, como um dia foram os astros e
noutro a vontade dos deuses.
Não nego que existam componentes sociais de fome e sofrimento na causa
do comportamento criminoso, mas ninguém mais leva em conta que a maioria
que vira bandido porque não quer trabalhar todo dia como esse
frentista.
Ser bandido é, antes de tudo, um problema de caráter. E esse frentista,
pobre também, sabe disso muito bem, só quem não sabe é minha casta de
inteligentinhos.
O que dirão os inteligentinhos quando esse contingente de verdadeiras
vítimas sociais do crime começarem a se organizar e matar os bandidos a
sua volta? Pedirão a alguma ONG europeia para proteger os bandidos dessa
gente "mesquinha" que só pensa em sua casinha, seus filhinhos e seu
dinheirinho?
Acusarão essa gente humilhada e assaltada de não ter "sensibilidade
social"? Dirão que soltar bandidos na rua é "justa violência
revolucionária"?
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* Filósofo. Prof. Universitário. Escritor.
Fonte: Folha on line, 13/05/2013
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