Rosane de Oliveira*
Cronista completa 87 anos na terça-feira e sinto falta da sua inteligência nos jornais em que escrevia
Querido Verissimo
Falta-me intimidade para chamá-lo de Luis Fernando. Sou apenas uma fã que sente sua falta mas não tem coragem de pedir a Lucia para fazer uma visita na terça-feira e dar um abraço apertado nos seus 87 anos. Diante de um ídolo, fico sem palavras. No seu caso, que escreve com tanto talento, tenho medo de que qualquer texto pareça piegas como uma composição de adolescente, mas arrisco-me a cometer esta crônica porque é preciso falar da falta que você me faz. Seus espaços nos jornais seguem como uma área de silêncio.
Para mim, querido Verissimo, você é imortal mesmo jamais tendo se candidatado à Academia Brasileira de Letras. Não combina com seu senso de humor aquele fardão bordado de fios dourados, os chás com gente que nunca produziu nada de relevante na literatura, mas está lá por força da política. Acredito que em outros tempos você, que sempre falou pouco, teria dificuldade para emendar uma conversa com alguns dos acadêmicos, por falta de assunto. Não falo de Ligia Fagundes Telles e de Moacyr Scliar que foram para outra dimensão. Hoje até poderia passar uma tarde com Fernanda Montenegro e Gilberto Gil, mais ouvindo do que falando.
Quando éramos colegas em Zero Hora, houve um dia em que me escalaram para entrevistá-lo num evento interno transmitido por live. Nos dias que antecederam a conversa, suei frio, perdi o sono. Lembrava do alemão que foi seu intérprete numa viagem e que anos depois me conduziu pelos caminhos de Berlim, Dresden e outras cidades da antiga Alemanha Ocidental. O alemão cujo nome agora não recordo me contou que foi um dos trabalhos mais difíceis dele ser seu tradutor porque “o senhor Verissimo não falava”. E que, felizmente, a Lucia falava pelos dois.
No dia combinado, sentamos num palquinho diante das câmeras, eu e o professor Ruy Carlos Ostermann, e a conversa fluiu. Depois, com outros colegas, em uma Feira do Livro, fui convidada a conduzir uma conversa no Centro Cultural Erico Verissimo, e já não tive medo. Sabia como quebrar seus silêncios e tinha certeza de que a presença da Lucia e do Pedro na plateia me dariam a força necessária para garantir que as palavras sairiam de sua boca como se fossem dos dedos no teclado.
Lucia, seu amor de uma vida, é hoje o nosso elo quando quero notícias de sua saúde. É uma mulher extraordinária, que com seus filhos e netos estará a seu lado nesses 87 anos.
Você faz tanta falta, Verissimo. Sinto saudade dos seus personagens inesquecíveis. Da Dorinha ravissante com seus incontáveis maridos e perrengues chiques, do analista de Bagé, terror dos psicanalistas com seus diagnósticos impiedosos, da velhinha de Taubaté, de quem me considero sucessora quando acredito nas boas intenções dos seres humanos. Seus livros são para sempre, suas crônicas estão no universo virtual ao alcance de um clique, mas falta a surpresa dos textos na Zero Hora e no Globo.
Fico imaginando se você perderia seu tempo precioso com as irrelevâncias que estão nos trending topics ou se escreveria um texto repleto de ironias sobre o fim do namoro da Luísa Sonza com Chico (o Moedas, não o Buarque, seu amigo) ou faria como o Lobão de 2023 (não o de 2019) e daria de ombros dizendo que não tem interesse nos amores alheios e prefere falar de jazz, de Paris ou de suas musas.
Para terminar, Verissimo, quero me declarar incompetente para falar de um homem do seu tamanho. Falta-me estatura. Então, recomendo a quem lê esta carta aberta que procure pela homenagem que lhe fez Eduardo Afonso em O Globo. É só buscar no Google pelo título: Salve, Verissimo.
* Jornalista
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