Juremir Machado da Silva*
O tão esperado e comemorado por muitos aconteceu: Lula está preso.
Talvez nunca antes na história deste país se tenha soltado foguete
pela prisão de um homem. Os ansiosos tiveram de suportar 26 horas de 50
horas de espera até Lula se entregar à Polícia Federal. Uma decisão do
juiz Sérgio Moro frustrou expectativas: não foi possível usar algemas.
Não é que Lula pudesse representar perigo, mas, do ponto de vista da
sociedade do espetáculo, no entender de parte da população, a imagem, a
foto, ficaria muito melhor. O que vem agora? O que vem por aí?
O jornal francês “Le Monde” publicou editorial, espaço reservado para
os assuntos mais importantes, sobre esse desfecho e sobre o futuro com
um título de romance: “A desgraça de um presidente”. No texto, uma frase
soa épica: “Grandeza e decadência de uma nação. Graça e desgraça de um
Estadista”. O jornal louva o combate à corrupção da Lava Jato, mas se
permite algumas observações: “A operação deve demonstrar ao país que a
prisão de Lula não é um ato político. Que a prisão daquele que
permanecerá como um dos líderes mais notáveis do país não significa o
fim das ações. Depois de atingir figuras do Partido dos Trabalhadores
até chegar ao seu líder histórico, a ‘Lava Jato’ deve atacar com igual
severidade os outros caciques dos partidos do centro ou da direita”. Vai
fazer isso?
O célebre e influente jornal francês, um dos mais respeitados do
mundo por sua seriedade e por sua coragem, questiona as diferentes
velocidades de investigação no contexto mais amplo das instituições
brasileiras: “Aécio Neves, candidato à presidência em 2014 contra Dilma
Rousseff, é suspeito de corrupção passiva e obstrução da justiça. Mas
seu caso ainda não foi examinado pela Suprema Corte, apesar do pedido da
Procuradora-Geral da República (…) há várias acusações contra Michel
Temer. Mas estas permanecem bloqueadas pelo Congresso Nacional”. Vale
lembrar quando o STF quer ele quebra o “foro privilegiado”. Exemplos não
faltam. Quando não quer, deixa o parlamento decidir.
A abertura do editorial certamente não agradará a muitos brasileiros:
“A tentação é grande de confundir o destino de Luiz Inácio Lula da
Silva com o do Brasil. Uma nação emergente que, sob a presidência do
ex-sindicalista, entre 2003 e 2010, embriagada de petróleo e
empanturrada de soja, cana-de-açúcar e café, reduziu drasticamente a
desigualdade, melhorou a educação e brilhou no cenário internacional.
Hoje, o país está retornando à extrema violência, a miséria persiste,
enquanto escândalos de corrupção pontuam as notícias políticas”. A
prisão de Lula suscita reflexões quase por toda parte.
O jornal francês de direita, “Le Figaro”, escreveu: “Quando deixou o
cargo em 1º de janeiro de 2011, Luiz Inácio Lula da Silva estava no auge
de sua popularidade. Ao final de seus dois mandatos de quatro anos,
oito em cada dez brasileiros tinham uma opinião favorável do ex-torneiro
mecânico, que reduziu as desigualdades mais flagrantes, presidiu um
forte crescimento e impôs o gigante sul-americano no cenário mundial”.
Não se vive de passado, mas se pode morrer dele. Pelo jeito, Lula
continuará sendo odiado e amado com intensidade. No STF a batalha vai
continuar. Nesta quarta-feira terá jogo de novo?
Rosa Weber decidirá. Outra vez.
Consta que 15 dias antes de votar contra Lula em nome da
colegialidade, ou seja, da jurisprudência em vigor desde 2016, ele votou
em favor de um HC alegando que seria preciso esperar o julgamento das
controversas ADCs 43 e 44, as ações declaratórias de constitucionalidade
para saber se pode ou não prender depois da segunda instância. A rosa
não tem porquê. Ou tem? Ainda saberemos.
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*Jornalista. Sociólogo. Escritor. Coordena o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS.
Apresenta diariamente, ao lado de Taline Oppitz, o programa Esfera
Pública, das 13 às 14 horas, na Rádio Guaíba. Colunista do Correio do Povo.
Fonte: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/2018/04/10781/le-monde-comenta-prisao-de-lula/
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