CLÁUDIO MORENO*
Heródoto - Imagem da Internet
Um dos temas mais explorados da cultura ocidental sempre foi a fragilidade do homem diante da implacável passagem do tempo. Não são poucas as histórias que nos obrigam a enxergar esta incômoda mas simples verdade: nada existe para sempre – nem pessoas, nem impérios, nem mesmo as montanhas de puro granito. Cedo ou tarde, a gente se dá conta disso, e a literatura e a filosofia se encarregam de descrever as mil maneiras que existem de conviver com esta ideia.
Um exemplo famosíssimo foram as lágrimas de Xerxes, que Heródoto imortalizou numa passagem de suas Histórias. Quando os persas se preparavam para invadir a Grécia pela segunda vez, foram se concentrar diante do estreito do Helesponto (hoje, Dardanelos), última barreira a separá-los da Europa. Ali, conforme instruções, haviam construído um trono de mármore branco no topo de uma colina, de onde o grande Xerxes ia inspecionar suas tropas e dar a ordem definitiva de avançar. Daquele ponto elevado, que permitia descortinar mar e terra ao mesmo tempo, a vista era impressionante: as águas do estreito estavam coalhadas de navios persas, enquanto, em terra, as incontáveis formações de soldados e cavaleiros cobriam cada palmo da praia e da planície. Então Xerxes, que assistia ao desfile cheio de orgulho por seu próprio poder, subitamente irrompeu num choro incontrolável. Quando um velho conselheiro indagou o que havia, ele respondeu, em lágrimas, que acabava de lhe ocorrer que nem ele, nem qualquer daqueles homens – quase meio milhão! – estariam vivos passados cem anos...
Melhor ainda é a história recolhida por Borges: o rei Davi pediu a um ourives que criasse um anel que o lembrasse de não se deixar dominar pela soberba nos momentos de júbilo, nem se abater nos momentos de tristeza.
E como vou fazer isso?
– Tu deverás descobrir. Para isso és um artífice.
Ao sair do palácio, o velho, que não sabia como poderia satisfazer o soberano, trazia o semblante tão angustiado que um jovem veio perguntar que mal o estava afligindo. Ao saber do que se tratava, o rapaz, sem hesitar, aconselhou o velho a fazer um anel de ouro com a inscrição “Isso também passará” – e assim fez o ourives. O jovem, dizem, era o próprio Salomão, filho de Davi, que assombraria o mundo com sua sabedoria.
Suas palavras parecem muito mais adequadas para resumir nossa humana condição do que o triste lamento de Xerxes: queiramos ou não, tudo passará, e não somos donos nem mestres de nosso destino para controlar o eterno vaivém entre a alegria e a tristeza, entre o infortúnio e o bem-estar. Salomão, ao que parece, tinha entendido que essa passagem constante entre o que foi e o que vai ser é, simplesmente, o que a gente costuma chamar de “vida”.
------------------------* Escritor. Colunista da ZH
Fonte: ZH on line, 10/01/2012
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