André Serpa Soares*
"Esta gula do abstrato “crescimento
económico”, este permanente desejo insaciável, predador, de querer
sempre mais, muito para além do que é necessário,
é um pecado sim".
A gula aplica-se à sofreguidão de comer e de beber. Quem é guloso peca. Verdadeiramente, porque no cristianismo, a gula é um dos sete pecados capitais.
A gula é um permanente desejo insaciável por comida ou bebida. É nunca estar saciado, satisfeito. Querer sempre mais, sempre muito para além do necessário.
Gulosos são os que sofrem de gula.
Diria que já todos fomos gulosos várias vezes na vida.
Com comida, bebida ou, em sentido figurado, com qualquer outra coisa.
Sobretudo quando somos jovens, somos gulosos pela vida. Queremos conhecer tudo, experimentar tudo e, normalmente, acabamos por o fazer em excesso.
Vivemos na vertigem da satisfação, do prazer, mas quando podemos alcançá-lo, parece que não chega, não é suficiente, é preciso mais e mais e mais.
Na verdade, vivemos numa sociedade gulosa. A mensagem mediatizada que passa é a de que nunca nos devemos dar por satisfeitos, devemos sempre querer mais.
Até nos discursos aparentemente dissociados desta questão.
Tomemos, por exemplo, as referências quase diárias, ad nauseam mesmo, ao famigerado “crescimento económico”. Tal desiderato parece quase um fim em si mesmo. Crescer, crescer, crescer. É induzida a ideia de que, sem “crescimento”, não vamos a lado nenhum ou, pior, ficamos condenados à mais sórdida indigência material.
É preciso “crescer”.
Mas o “crescimento económico” é um fim em si mesmo? E quando é que chega? Quando é que é suficiente? Temos de crescer até que ponto?
Está o “crescimento económico” ao serviço dos homens, serve para “alimentar” os homens, ou são os homens que servem o crescimento económico, são escravizados por este?
Esta gula do abstrato “crescimento económico”, este permanente desejo insaciável, predador, de querer sempre mais, muito para além do que é necessário, é um pecado sim.
Está a conduzir à destruição do meio ambiente, do planeta Terra, o único em que podemos habitar. Pelo caminho, destrói pessoas, vidas e sociedades.
O crescimento económico não pode ser um fim em si mesmo.
Ele só se justifica e só deve existir se servir as pessoas. Se todos nós, o somatório do nosso bem-estar individual, for cada vez maior.
Mas um bem-estar holístico.
“Nenhum homem é uma ilha”. Nada é um facto isolado. O “crescimento económico” não pode correr desenfreadamente, gulosamente, por si próprio.
Temperança. É o que chega, progressivamente, com a idade.
Que chegue também, rapidamente, à economia e à política.
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*Integra a Direcção de Comunicação e Relações Públicas da TAP Portugal desde 2007.
FONTE: https://revistabica.com/gula-sofreguidao-e-excessos/
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