Em série de ficção científica dirigida por Ben Stiller, funcionários de uma empresa aceitam passar por um procedimento para dividir memórias do trabalho e da vida pessoal
Em “Severance” (ou “Ruptura”, em português), série do streaming AppleTV+ lançada em fevereiro que recentemente teve a segunda temporada anunciada, o desejo por uma divisão bem definida entre trabalho e vida pessoal é concretizado — mas logo fica claro que há um importante revés.
O programa apresenta os funcionários de uma empresa misteriosa chamada Lumon. Para trabalhar em um departamento altamente confidencial da firma, os trabalhadores aceitam passar por um procedimento cirúrgico (a “ruptura”) que divide o acesso que eles têm às suas memórias: quando estão no escritório, eles não se lembram de nada da vida lá fora; quando estão fora dele, não sabem o que fizeram durante as oito horas de trabalho.
O resultado é dividir o funcionário em dois: há o indivíduo “externo” e o “interno”. Essa proposta pode ser atrativa ao externo, que se vê livre de pensar sobre o trabalho. O interno, no entanto, vive o pesadelo de acordar sem lembranças em um ambiente corporativo no qual está permanentemente aprisionado. Seu corpo pode até sair pela porta, mas a impressão será de estar retornando já no próximo instante.
Mark (Adam Scott), o protagonista, é um viúvo que viu na ruptura uma oportunidade para esquecer a morte de sua esposa por parte do dia. Ao entrar em contato com um ex-funcionário da Lumon que diz ter revertido o procedimento, ele começa a descobrir os segredos escondidos pela empresa e alterar a dinâmica que têm com os seus colegas de trabalho.
Criada e roteirizada por Dan Erickson, a série teve vários episódios dirigidos por Ben Stiller, conhecido por seu trabalho como ator em filmes de comédia como “Zoolander”, mas que também dirigiu a premiada minissérie “Escape at Dannemora”, de 2018. Fazem parte do elenco Christopher Walken (“Prenda-me se for capaz”) e Patricia Arquette (“Boyhood”).
“Severance” cria terror ao exagerar elementos reais do universo corporativo — a começar pela ambientação,
que na série é criada com luzes fluorescentes cegantes, corredores
labirínticos e cubículos em escritórios de plano aberto estranhamente
vazios. A estética lembra a inquietação suscitada pelos “liminal spaces”
(ou “espaços liminares”) que se popularizaram na internet; locais
familiares mas com algum elemento fora do lugar, no geral abandonados.
Mas o terror está também na forma como a série retrata o trabalho em si: os funcionários aprisionados, a labuta incessante, o apagamento de suas identidades externas, as atividades sem propósito aparente (Mark e seus colegas fazem “refinamento de macrodados”, o que envolve clicar em números que nem eles sabem o que representam).
São fatores dos quais megacorporações como a Lumon tentam tirar proveito, que juntos formam uma espécie de parábola sobre a alienação e o mal-estar causados por muitos empregos de verdade. “O sofrimento no trabalho, e as tentativas fúteis das personagens de separar o trabalho de todo o resto, são a realidade vivida por milhões de nós no mundo real”, escreveu a crítica Caitlin PenzeyMoog ao site Vox.
Os funcionários da Lumon só passam a questionar e contrariar a estrutura opressiva da empresa quando se voltam ao único recurso que os resta: as conexões que formam entre si. “[A série] é sobre trabalhadores retomando o poder, o que obviamente é uma brutal e contínua luta humana”, disse o criador Dan Erickson ao site Inverse. “Eu acho que [cultivar a] solidariedade é um dos maiores desafios nisso, em especial quando aqueles em posição de poder tentam nos dividir”.
YOUtube: Severance — Official Trailer | Apple TV+ https://www.youtube.com/watch?v=xEQP4VVuyrY&t=6s
Fonte: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2022/04/19/Como-%E2%80%98Severance%E2%80%99-mostra-o-lado-sombrio-do-mundo-corporativo?utm_source=NexoNL&utm_medium=Email&utm_campaign=anexo
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