Emmanuel Macron deu um baile. Foi reeleito presidente da França com ampla margem de vantagem (58% dos votos) sobre a candidata da extrema direita, Marine Le Pen, versão francesa de Jair Bolsonaro. É uma lição para o Brasil. Na França, diante do extremo, todos votam no menos pior. Não se brinca com o perigo nem se elege antidemocrata.
Num segundo turno francês entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad certamente teria dado Haddad, pois a direita democrática teria votado no candidato da esquerda para não eleger um traste reacionário.
No Brasil, não. Direita dita republicana e centro (que vai da direita a extrema direita, mas faz de conta que é moderado para ganhar votos e se ver melhor no espelho deformado) caíram no colo do capitão. Farão isso novamente em caso de segundo turno entre Lula e Bolsonaro em 2022. A verdade é simples: parte do Brasil ama o pior.
Michel Temer, um dos mais nefastos presidentes que o Brasil já teve, aquele que chegou ao Planalto pelo golpe do impeachment, já sinalizou que votará no destrambelhado Bolsonaro se preciso for.
O brasileiro médio é antes de tudo um reacionário.
Foi assim que parte da classe média apoiou o golpe de 1964, chafurdou na ditadura e tem saudades dos coturnos e das mentiras dos fardados, como a de que não havia corrupção durante o regime militar.
A França deu o exemplo. Extrema direita, não. No Brasil, mercado, mídia e parte da classe média tendem ao conservadorismo.
O mercado é oportunista, sorrateiro. Só quer ganhar dinheiro. Vai de Pinochet a Bolsonaro sem arrependimentos. Quando fala em liberdade, pensa em liberdade de faturar, oprimir, tirar do caminho quem o atrapalhe. Ética política é uma expressão que desconhece.
A mídia, de modo geral, é uma fatia do mercado. Apoio o golpe de 1964, foi lavajatista até a alma, deu aval à derrubada de Dilma Rousseff, adota o mesmo discurso anticomunista do bolsonarismo.
Parte da classe média confunde ética com falso moralismo. Mais do que o legítimo combate à corrupção, aposta é no anticomunismo.
Acha que socialdemocracia é marxismo-leninismo.
Se a mídia e o mercado brasileiro são neoliberais de carteirinha, há um eleitorado sempre prontinho a comprar a esparrela do perigo vermelho, da ameaça comunista e outras tralhas do gênero.
O presidente francês Emmanuel Macron não é o paladino dos pobres. Ao contrário, é conhecido como “presidente dos ricos”. Quer aumentar a idade da aposentadoria para 65 anos. Na França, onde se vive mais do que no Brasil, ainda não se concretizou o que aqui já é realidade graças a devastadora reforma da Previdência de 2019.
Ao menos, Macron não é racista nem xenófobo e homofóbico. No Brasil, até Eduardo Leite, agora ex-governador do Rio Grande do Sul, que teve a louvável coragem de se assumir publicamente como gay ao longo do mandato, apoiou, com ineficazes ressalvas, Jair Bolsonaro, campeão da homofobia e de todos os preconceitos possíveis.
Se a França elegesse Marine Le Pen envergonharia o mundo e trairia a sua tradição de pátria do iluminismo. Não o fez. Que sirva de orientação para o Brasil na eleição de outubro deste ano. Combater Bolsonaro não é fazer militância partidária. Trata-se de um compromisso com a democracia. Luta pela preservação da regra do jogo.
*Jornalista. Escritor. Prof. Universitário.
Fonte: https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/colunistas-matinal/juremir-machado/juremir-licao-francesa/
Nenhum comentário:
Postar um comentário