André Bello*
Jair Bolsonaro nas eleições de 2018: atual presidente beneficiou-se
da polarização política e do fim do 'eleitor médio'Sérgio Lima/Poder360
‘Eleitor mediano’ deixou a cena em 2018
Antipetismo tornou-se fator definidor
Centro-direita precisa se reagrupar
O resultado da eleição presidencial de 2018 colocou em xeque o
teorema do eleitor mediano, formulado pelo economista Antonhy Downs, em
1957, e amplamente usado na ciência política para definir o
comportamento político das pessoas. Considerando a hipótese de que o
eleitorado está distribuído em uma escala normal da esquerda à direita, o
teorema diz que o candidato ganha a eleição se conquistar o eleitor
mediano. O candidato da esquerda e o da direita já recebem,
respectivamente, os votos dos eleitores posicionados mais à esquerda e
mais à direita em face da proximidade das preferências. Portanto, a
disputa está em conquistar os eleitores localizados mais ao centro da
escala, de modo que os candidatos caminham nessa direção sutilmente em
busca dos votos.
Essa teoria encontrou solo fértil no Brasil, pois
houve por aqui uma tendência à centralidade política entre 1994 e 2014.
Durante o predomínio do eleitor mediano no Brasil, consolidou a crença
de que o comportamento político dos brasileiros baseia-se em duas
ideias: inclusão social e responsabilidade fiscal. O PSDB e o PT
buscaram, no exercício do poder e na construção da imagem dos
candidatos, responder a esse tipo de eleitor mediano, cujo comportamento
não é fortemente vinculado à ideologia e à identificação partidária. A
avaliação da economia e a sensação de mobilidade social pesavam mais
para a decisão do voto. No entanto, a eleição de 2014 rompeu com esse
paradigma, criando, pela primeira vez, uma polarização política que
extrapolou a esfera política e ganhou as ruas.
O antipetismo
cresceu fortemente de 2014 a 2018, inclusive ultrapassou o petismo e
tornou-se o sentimento indutor das atitudes dos eleitores. Pesquisas
recentes mostram que o antipetismo é um importante definidor do voto
para o político que faz oposição ao PT. Por este motivo, assume-se que o
presidente Bolsonaro foi favorecido pelo crescimento da rejeição ao PT.
Por sua vez, a evolução do petismo é constituída por um forte
crescimento até a eleição de 2002, estabilidade durante os mandatos de
Lula e uma queda a partir de 2013 que se acentuou nos anos seguintes.
Esse tipo de evolução do petismo e antipetismo criou uma divisão
política no país, forçando com que os eleitores se posicionassem em um
dos lados e os eleitores medianos submergissem. A confirmação da
polarização política acontece quando a população caminha na direção das
extremidades e o centro desaparece, logo a origem da polarização
política no Brasil está encastelada na separação entre petismo e
antipetismo.
A
polarização política é a antítese do pensamento brasileiro, marcado
pela ideia do homem cordial e de um país avesso às guerras. Um abalo
sísmico ocorreu para quebrantar a estrutura da afabilidade e
cordialidade entra as pessoas e produzir os conflitos políticos, a
rejeição ao PT, o fortalecimento da extrema direita e, por fim, a
polarização política. As pesquisas empíricas que fiz sobre o tema
mostram que a Lava Jato e o Bolsa Família foram determinantes para a
polarização política por serem fatores que aumentaram o antipetismo ao
longo do tempo. Os sentimentos relativos ao futuro da economia do ponto
de vista pessoal e do país, bem como a inflação e o PIB, produziram
também polarização política. Particularmente, o medo pessoal com o
futuro da economia gerou um forte antipetismo, enquanto a avaliação
retrospectiva acerca da situação econômica do país provocou uma
identificação com o petismo. Assumindo a divisão entre petismo e
antipetismo como a origem da polarização política, descobre-se, em um
passo adiante, portanto, que a Lava Jato, o Bolsa Família e outros
indicadores da economia são as causas da polarização.
A
crise pela qual o país atravessa atualmente é fruto da polarização
política, cujas consequências são danosas ao funcionamento da
democracia. Alguns efeitos da polarização sobre a democracia consistem
no impasse legislativo, na baixa produtividade do Congresso e na
paralisia do governo que não consegue aprovar reformas e leis. Outro
aspecto da consequência da polaridade está na quebra da confiança nas
instituições e normas democráticas e na falta de urbanidade e
civilidade. A principal desvantagem da polarização centra-se na
elaboração e implementação de políticas públicas com fortes implicações
sobre a representação política.
Em uma sociedade polarizada, o
presidente em exercício com a ajuda do Congresso pode aprovar medidas ou
políticas públicas que favoreçam somente os eleitores identificados com
o governo, colocando a outra parte da sociedade em risco por não ter
proteção social e do Estado. A erosão da representação política, como
consequência da polarização, é um movimento que, ao longo prazo e
gradualmente, pode matar a democracia. Grupos minoritários podem ter
direitos negados, não reconhecerem mais os caminhos da representação
como uma via democrática e, em última análise, sofrerem perseguições
políticas.
É preciso sair da armadilha na qual alguns juristas,
políticos e eleitores contra-iluministas colocaram o país. O eleitor
mediano, esteio da estabilidade e racionalidade, precisa retomar o seu
lugar, ou seja, ele precisa emergir sobre os conflitos políticos
existentes. Desse modo, penso ser necessário uma unidade da esquerda com
o movimento ao centro com a suavização da radicalização interna. Ao
mesmo tempo, a esquerda precisa apresentar um candidato moderado com
capacidade de recolocar o tema da desigualdade social na agenda central
do país sem desconsiderar os problemas que ganharam a atenção da
população nos últimos anos, como a falta de segurança. A esquerda nunca
conseguiu debater de forma convincente o tema da segurança e perdeu
espaço para a onda mais conservadora na última eleição, o que sustentou
ideias mais extremadas.
A direita brasileira precisa deixar de
namorar –para usar um vocabulário do presidente– com o precipício da
extrema direita e se reagrupar como um movimento de centro-direita por
meio de propostas que já foram capazes de garantir duas eleições
presidenciais ao PSDB. O eleitorado brasileiro é moderado e as pesquisas
sobre a opinião pública confirmam esse comportamento. Esse eleitor
típico espera uma formulação de agenda política que envolva ações
concretas no combate à pobreza, ao desemprego e ao crescimento
econômico. Esses temas unem a sociedade e são fundamentais para o país
voltar a crescer.
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* André Bello, 34 anos, é doutorando em Ciência Política pela Universidade
de Brasília (UNB) por onde finalizou o seu mestrado. Foi pesquisador
visitante na University of Texas at Austin e University of Pittsburgh. É
pesquisador do Laboratório de Pesquisa em Comportamento Político,
Instituições e Políticas Públicas (LAPCIPP/UNB).
Fonte: https://www.poder360.com.br/opiniao/governo/origem-causas-e-consequencias-da-polarizacao-politica-explica-andre-bello/
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