José de Souza Martins*
A
transformação da questão ambiental em vômito de ignorância no templo da
natureza preocupa a parte humana do mundo cujo cérebro não foi corroído pelos
gases tóxicos da voracidade incondicional de lucros incendiários. Os obtidos à
custa do presente e do nosso futuro. Justificar a transformação da Amazônia em
dinheiro súbito, porque o país se tornou um entreposto de commodities, não é
próprio de verdadeiros empresários e menos ainda de competentes governos. O
tempo do desenvolvimento econômico e social não é o tempo do imediato, é o
tempo histórico da prudência. Sem consciência do futuro, o atual é pressa tola.
No Brasil, no entanto, não é incomum que o governo e as autoridades, que devem fiscalizar e reprimir os crimes e as atividades antissociais, tenham sempre uma desculpa para o indesculpável. É o caso em relação às queimadas destrutivas do meio ambiente. Este é um momento particularmente significativo dessa violação do dever governativo.
No Brasil, no entanto, não é incomum que o governo e as autoridades, que devem fiscalizar e reprimir os crimes e as atividades antissociais, tenham sempre uma desculpa para o indesculpável. É o caso em relação às queimadas destrutivas do meio ambiente. Este é um momento particularmente significativo dessa violação do dever governativo.
Quando governantes
acham que consumir o meio ambiente com a motosserra e as chamas é lícito, para
assegurar os ganhos dos poucos em prejuízo dos muitos, e que disso depende o
PIB, confessam que o dinheiro de poucos é mais importante do que a vida de
todos. Quando dizem que o trabalho escravo, um item amazônico, não é escravo,
confessam que a liberdade não é um valor essencial desta sociedade. O que dessa
liberdade faz mera liberdade condicional.
Quando
proclamam e asseguram que possam armar-se os que quiserem, especialmente no
meio rural, onde é alta a violência dos que podem contra os que não podem,
revogam o princípio de que é das Forças Armadas o monopólio da violência, para
cumprir as leis e assegurar os direitos de todos. E os da própria nação, como
sujeito coletivo da nacionalidade.
Os
problemas destes dias são apenas a ponta flamejante de um conjunto de
desorientações conexas que nos põem aquém da civilização. Estamos no rumo da
desordem e da barbárie. Adeus, ordem e progresso.
Bravata e ignorância não resolvem problemas sociais e problemas ambientais. Além dos prejuízos econômicos que no curto prazo acarretará, a conduta brasileira em relação à questão ambiental afetará o setor produtivo, do lucro ao emprego. A desorientação do governo indica uma inclinação que, pelas consequências possíveis, poderá ser interpretada como genocida.
Bravata e ignorância não resolvem problemas sociais e problemas ambientais. Além dos prejuízos econômicos que no curto prazo acarretará, a conduta brasileira em relação à questão ambiental afetará o setor produtivo, do lucro ao emprego. A desorientação do governo indica uma inclinação que, pelas consequências possíveis, poderá ser interpretada como genocida.
A pátria
está em perigo. Atualizando a palavra do botânico Saint-Hilaire, que conheceu o
Brasil inteiro como ninguém antes de o Brasil ser independente: ou o Brasil
acaba com a saúva da criminalidade ambiental, ou a saúva da criminalidade
ambiental acaba com o Brasil.
O
empresariado brasileiro, não só o do agronegócio, tem não só o direito, mas o dever
de se insurgir contra os negocistas desse novo capitalismo, o neocapitalismo do
prejuízo que lhes virá. Capitalismo só vale um: o do lucro com responsabilidade
social. O capitalismo é um sistema político de coadjuvantes, não só quem
investe e lucra, mas também quem ajuda e quem trabalha. Ao que parece, é possível
ganhar muito dinheiro,
rapidamente, com a mentalidade anticapitalista desse neocapitalismo emergente, o do lucro de hoje no lugar do lucro de sempre.
rapidamente, com a mentalidade anticapitalista desse neocapitalismo emergente, o do lucro de hoje no lugar do lucro de sempre.
A
ignorância palavrosa produziu em poucas horas, nestes dias, para o capitalismo
brasileiro, um retrocesso e um prejuízo cujo tamanho não será indicado pelos
índices da bolsa. O liberalismo econômico de botequim gera uma democracia de
bêbados, mas não supre nem sustenta a carência de inteligência e de prudência
política e governativa.
Essa
espécie de pacto com satanás, de que nos fala Guimarães Rosa, que disso soube
como capanga de Manuelzão para aprender as coisas do sertão, como a que se
esconde na ambição de dinheiro e de poder, é coisa de gente que não enxerga o
que faz.
Disso, ouvi muito nos sertões do Brasil central, caboclos me demonstrando, tim-tim por tim-tim, cumaé que o coisa ruim, o pactário de encruzilhadas e cemitérios, ensina o muito do poder de ganhar em troca da alma do vivente, o prejuízo do finalmente. Mesmo quem não sabe que fez o pacto, está nele em pensamento, palavras e obras. O dinheiro existe para ser possuído e usado, e não para possuir as pessoas que o usam.
Disso, ouvi muito nos sertões do Brasil central, caboclos me demonstrando, tim-tim por tim-tim, cumaé que o coisa ruim, o pactário de encruzilhadas e cemitérios, ensina o muito do poder de ganhar em troca da alma do vivente, o prejuízo do finalmente. Mesmo quem não sabe que fez o pacto, está nele em pensamento, palavras e obras. O dinheiro existe para ser possuído e usado, e não para possuir as pessoas que o usam.
Aqueles
que se omitem e debocham dos dramas do mundo, em nome do dinheiro fácil,
parecem não saber dessas coisas e de seus silêncios ruidosos. Cada árvore
tombada e queimada indevidamente, pensando o queimador que o que é de todos é
só daquele um, é um ponto a mais para a cota de azeite fervente no tacho em que
penam os que mandam derrubar a mata para endinheirar-se. Quando chegar a hora
quente dos confins e dos confinamentos, o muito dinheiro não vai refrigerar o
modo anticapitalista de ganhar e de gastar. É só esperar.
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José de Souza Martins é sociólogo. Pesquisador Emérito do CNPq. Membro da Academia Paulista de Letras. Entre outros livros, autor de Fronteira - A Degradação do Outro nos Confins do Humano (Contexto).
Fonte: https://www.valor.com.br/cultura/6413647/jose-de-souza-martins-transformar-amazonia-em-dinheiro-subito-nao-e-proprio-de-verdadeiros-empresari 30/08/2019
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José de Souza Martins é sociólogo. Pesquisador Emérito do CNPq. Membro da Academia Paulista de Letras. Entre outros livros, autor de Fronteira - A Degradação do Outro nos Confins do Humano (Contexto).
Fonte: https://www.valor.com.br/cultura/6413647/jose-de-souza-martins-transformar-amazonia-em-dinheiro-subito-nao-e-proprio-de-verdadeiros-empresari 30/08/2019
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