O ultraliberal Javier Milei tomou posse como presidente da Argentina no último domingo, 10 de dezembro de 2023. Uma data para não esquecer. Excesso de Estado traz problemas. Falta de Estado também. Por que é tão difícil buscar o equilíbrio? Milei é economista, não pode se considerar, como Jair Bolsonaro, ignorante no assunto. Ele se apresenta como uma anarquista de direita, um “libertariano”.
Aparentemente nada mais fácil do que diminuir gastos encolhendo o tamanho do Estado. O problema é que essa medida tão simples costuma aumentar o tamanho das necessidades a descoberto. As pessoas vivem mais? Como garantir-lhes uma aposentadoria digna? Com previdências privadas? Doce ilusão. Exemplos concretos, como o do Chile, mostram que os buracos são muitos. O mercado é instável. Na hora de receber, o bolo pode ter abatumado. Só um Estado equilibrado salva a pátria.
Argentinos são dramáticos. O tango é essa expressão máxima desse imaginário da vida no limite. Não fazem nada pela metade. Tiveram Maradona, Cortázar e Borges. Agora têm Messi e o Papa Francisco. Produziram a ditadura mais violenta da América do Sul no século 20. Viveram um período de crise política com uma penca de presidentes. Inventaram o peronismo, que pode ser de direita, de esquerda e até, se for preciso, mais ou menos de centro. Milei não tem meio termo. Prometeu dolarizar a economia, fechar o Banco Central, ignorar presidentes “comunistas”, como Lula. Certamente não vai “entregar” tudo isso. Mas vai fazer muito barulho. É do seu DNA de rede social.
A família Bolsonaro correu para Buenos Aires. A capital argentina é a nova “Meca” da extrema direita. O capitão foi acompanhado de luminares da República, como o presidente do PL, o impoluto Valdemar da Costa Neto, aquele que foi, voltou e ficou no poder. Os Bolsonaro estão encantados com Milei. Sonham que o governo dele abra caminho para o retorno do bolsonarismo ao poder no Brasil. Como tudo se mistura e confunde, Michele Bolsonaro poderia ser a futura Evita brasileira, uma Evita antiperonista, antipetista e fiel ao novo roteiro da velha direita, fazer menos com menos Estado.
A esquerda argentina fez por merecer a derrota que sofreu contra Milei. Alberto Fernández deixou a presidência com modestos 80% de reprovação popular. Dificilmente Javier Milei conseguirá batê-lo em desaprovação. Há, porém, quem aposte na destituição do novo presidente antes do final do seu mandato. Tudo pode acontecer. Até dar certo? Em tese, sim. Na prática são outros quinhentos, em dólar. Eleitorado é volátil. Se não dá com um lado, vai com o outro. Acerta e erra, erra e erra, tenta de novo. O peronismo ficará de tocaia. Quatro anos passam lentamente para quem espera, rapidamente para quem governa, lenta e rapidamente para os eleitores, dependendo das suas expectativas.
Milei é o famoso elefante na loja de cristais. Nunca vi um. Sei, por ouvir dizer, que esse tipo de visita é inesquecível. Ninguém espera que Milei passe quatro anos no poder sem quebrar nada. Alguns até, ao contrário, esperam que quebre tudo. A oposição, por óbvio, espera que ele se quebre. Será certamente um governo de fraturas. Milei, por seu turno, acha que já está tudo quebrado e que lhe cabe juntar os cacos, não para colá-los, mas para jogá-los no lixo. O bravo Javier não quer remendos. Promete um novo desenho político. A Argentina torna-se o primeiro grande laboratório de teorias econômicas muito discutidas em colóquios com patrocínios fartos e longos verbetes na Wikipédia. É hora de ver como tudo isso “performa” na prática.
Ao som de Carlos Gardel.
*Jornalista. Escritor. Prof. Universitário
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