terça-feira, 14 de agosto de 2018

Jöel Dicker, um fenómeno literário sem mistério, só talento, em entrevista

 O Desaparecimento de Stephanie Mailer
Jovem suíço, Joël Dicker volta a criar mistério numa cidade dos Estados Unidos. Porque lá há muito espaço, muitas histórias para contar, como refere à SÁBADO. Stephanie Mailer é a sua Laura Palmer
30 de julho de 1994, em Orphea, nos Hamptons, prepara-se a inauguração do primeiro festival de teatro. Um crime horrendo acontece na cidade: o presidente da Câmara, mulher, filho e uma transeunte que está a passar pela sua casa são assassinados. Depois, um salto, para 20 anos à frente. 23 de Junho de 2014: Jesse Rosenberg, o polícia que resolveu o caso de 1994 prepara-se para se reformar. Em Orphea, começam os preparativos do 21º festival de teatro. Uma jornalista, Stephanie Mailer, visita-o e diz-lhe que o caso foi mal resolvido, pois a polícia viu mal as provas. Nessa noite, Mailer desaparece. Afinal, O Desaparecimento de Stephanie Mailer começa a 23 de Junho de 1994 ou 20 anos antes? Este é o caso que Jesse Rosenberg, Derek Scott e Anna Kanner irão investigar. Um Twin Peaks em potência. Sim, daria uma boa série de televisão.

O quarto romance do suíço Joël Dicker (Genebra, 1985) adensa a trama através de um jogo constante entre o passado e o presente da vida de três personagens (ou quatro, se se considerar Mailer), enquanto o relógio conta os dias que faltam para a inauguração do festival de teatro.

Dicker tem estatuto de fenómeno, jovem, com um talento fora do comum para a escrita do mistério literário. A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert, o seu segundo romance, valeu-lhe um contrato chorudo com a Penguin. Resultado? Quatro milhões de exemplares vendidos em 33 países. Em 2016 publica O Livro dos Baltimore e, este ano, O Desaparecimento de Stephanie Mailer reafirma-o como um dos grandes nomes do género. É licenciado em Direito.

E é mesmo por aí que começa esta entrevista telefónica. Joël Dicker justifica-se: "Era uma espécie de plano B, caso a escrita falhasse. Escrevo desde criança e era isso que queria fazer. Mas, se não conseguisse, seria também muito feliz se fosse advogado. Tudo o que fazemos nos influencia e se torna útil. É como quando tem de se explicar às crianças que não querem estudar Matemática que isso lhes vai ser útil na vida, mesmo que não sigam algo relacionado com números. Penso que o curso de Direito me permitiu afinar a minha habilidade para criar narrativas, contar histórias. Um advogado tem de saber contar histórias a um juiz."

Orphea, cidade pequena nos Estados Unidos, é cenário habitual dos romances de Joël Dicker. Parece estranho, mas não se pensarmos que, durante 20 anos, passou todas as férias com um tio, no Maine, em Massachusetts. Isso influenciou-o: "Viajei muito pela Costa Este, o que me deu uma percepção da paisagem, dos locais, que não encontro na Suíça. Nos Estados Unidos há muito espaço, podes conduzir durante horas sem ver ninguém. Creio que esse espaço te oferece a ideia de que é possível criar histórias maiores ali."

A pequena Orphea tem, ainda por cima, características de local onde há famílias a passar férias, mas que vivem noutro lado. Pergunta-se se há algo nestas cidades norte-americanas que atraem a criação de romances e dá-se o exemplo de Provincetown/Cape Cod, no Massachusetts, cuja presença na ficção é desproporcional ao tamanho da cidade - que se atravessa a pé em apenas 45 minutos: "É a sensação que uma cidade pequena te dá, pensas que há sempre uma história para contar. E são lugares onde as pessoas, que lá têm casas, passam férias, provavelmente só vão lá no Verão e isso cria um ambiente muito específico. As pessoas juntam-se, há vizinhos que se cumprimentam, mas só se vêem durante as férias. Só conheces as pessoas de lá durante uns dois meses por ano, quando estão numa disposição diferente do resto do ano. Isso cria uma espécie de vazio nesses lugares, quando passas por lá sentes que está a faltar uma parte da história e começas a imaginá-la."

Três personagens, três perspectivas. Anna foi um ponto de partida para o autor porque "desta vez queria ter uma ou duas personagens femininas fortes." Mais: "Imaginei a Anna como uma mulher que habita num mundo de homens, a polícia, e que seria mais interessante colocá-la numa cidade pequena."

No fim da conversa, Dicker resolveu olhar para o futuro, confessando que lhe apetece abraçar novos desafios, tentar géneros diferentes: "Lancei três livros em cinco, seis anos. Sinto os anos a passar, estou a ficar mais velho. Quero tentar algo novo. Tenho a certeza que se dará uma evolução no meu trabalho." Quem sabe, fazendo crescer, ainda mais, este fenómeno movido a talento.
O Desaparecimento de Stephanie Mailer
Ed. Alfaguara
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Reportagem por André Santos 
Fonte: http://www.sabado.pt/gps/detalhe/jel-dicker-fenomeno-sem-misterio-so-talento?utm_campaign=Newsletter&utm_content=1498473353&utm_medium=email&utm_source=diaria_ON

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