Dulce Helfer / Divulgação
Obra do poeta gaúcho ficou esquecida na gaveta até editora descobri-la entre outros papéis
Depois de quase sete décadas engavetada, a versão de Mario Quintana
para um dos clássicos da literatura infantil universal poderá ser
finalmente conhecida. Acaba de chegar às livrarias a tradução de O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry (1900 – 1944), assinada pelo poeta gaúcho.
O
texto deve ter sido preparado por Quintana entre o final dos anos 1940 e
início dos 1950, época em que a Gallimard, editora do volume original
em francês, esteve aberta a propostas de publicadores brasileiros. A
Melhoramentos, que contava com Quintana no seu time de tradutores,
entrou no páreo, mas quem levou a melhor nas negociações foi a Agir, que
lançou o sucesso editorial em 1952. Foi assim que o Brasil conheceu a
tradução de Dom Marcos Barbosa. Já a de Quintana ficou inédita até
agora.
–
A tradução de Quintana ficou guardada, esquecida. Nos anos 1980, os
editores da Melhoramentos resolveram fazer uma faxina na empresa, aí
descobriram essa versão do Quintana entre outros papéis. Mas foi preciso
esperar mais 30 anos, até que a obra entrasse em domínio público, para
que finalmente fosse publicada – explica o poeta Armindo Trevisan, amigo
de Quintana e responsável pelo prefácio, notas de rodapé e glossário do
volume.
O clássico entrou em domínio público
em 2015, no entanto a Melhoramentos segurou a publicação até agora para
não competir com a avalanche de edições que chegaram ao mercado. De lá
para cá, quase uma dezena de editoras passaram a trabalhar a obra, com
traduções de nomes conhecidos na literatura brasileira, como Frei Betto
(pela Geração Editorial) e Ferreira Gullar (Agir).
Trevisan
não gosta de comparações entre tradutores, mas afirma que o poeta
gaúcho encontra soluções mais criativas para alguns trechos do livro:
–
Pela agilidade do fraseado, pela melodia e pela naturalidade com que o
livro flui, temos a impressão de estar lendo um texto transparente, com
um estilo muito parecido com o do próprio Saint-Exupéry.
Muito
conhecida na tradução de Dom Marcos, a frase "tu te tornas eternamente
responsável por aquilo que cativas", foi reescrita por Quintana como "És
responsável, para sempre, pelo que domesticaste". Para Trevisan,
trata-se de uma tradução correta, mas que deixa de lado o encantamento
do verbo "domesticar", da frase original em francês: “Tu deviens
responsable pour toujours de ce que tu as apprivoisé (domar, domesticar)”.
Para
muitos leitores, a faceta de tradutor de Quintana é desconhecida, mas
foi a principal fonte de sustento do autor por mais de 20 anos. Entre
1934 e 1955, trabalhou para a editora Globo, traduzindo Proust, Balzac,
Voltaire, Graham Greene, entre outros.
– Há
muitas anedotas acerca da vida de tradutor de Quintana, mas a verdade é
que era um perfeccionista, dedicado ao trabalho. Falava fluentemente
francês e espanhol, mas chegou a traduzir também do inglês, aprendendo a
partir do dicionário. Tinha o gênio do poeta para dar correção e
musicalidade ao que traduzia – avalia Trevisan.
Três olhares
Texto original
"Mon
dessin ne représentait pas un chapeau. Il représentait un serpent boa
qui digérait un éléphant. J'ai alors dessiné l'intérieur du serpent boa,
afin que les grandes personnes puissent comprendre. Elles ont toujours
besoin d'explications."
Tradução de Dom Marcos Barbosa
"Meu desenho não representava um chapéu. Representava uma jiboia digerindo um elefante. Desenhei então o interior da jiboia, a fim de que as pessoas grandes pudessem compreender. Elas têm sempre necessidade de explicações detalhadas."
"Meu desenho não representava um chapéu. Representava uma jiboia digerindo um elefante. Desenhei então o interior da jiboia, a fim de que as pessoas grandes pudessem compreender. Elas têm sempre necessidade de explicações detalhadas."
Tradução de Ferreira Gullar
"Meu
desenho não representava um chapéu. Representava uma jiboia que digeria
um elefante. Desenhei o interior da cobra para que os adultos pudessem
compreender. Eles estão sempre querendo explicações."
Tradução de Mario Quintana
"O
meu desenho não era nenhum chapéu. Era o desenho de uma boa digerindo
um elefante. Mas como os grandes não podiam compreendê-lo, eu fiz um
outro desenho: desenhei o interior da boa, de modo que eles pudessem ver
claramente. Os grandes sempre precisam que a gente lhes explique as
coisas."
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REPORTAGEM POR Alexandre Lucchese
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REPORTAGEM POR Alexandre Lucchese
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