Lya Luft*
As virgens loucas do Novo Testamento -
não preciso verificar e citar ao pé da letra porque aqui só me interessa
a metáfora - não cuidaram do azeite de suas lamparinas e sofreram algum
castigo (talvez o noivo que escolheria uma delas se perdesse na
escuridão, deixando-as mais loucas ainda).
Mas gosto da
expressão, da loucura, do quanto reflete a nossa condição atual, o
tsunami de confusões, ameaças, protestos, coisas honradas e outras
distorcidas, nem tantas tão dignas.
O chamado povo brasileiro,
que alguns qualificam de preguiçoso, desatento, conformado, eu o vejo
como heroico, honrado, sacrificado, em parte desinformado e por isso
iludido. É o meu povo. Há cinco ou seis gerações, minha família vive
aqui, ajudou com sacrifício a construir esse gigante de momento tão
atrapalhado.
Quem somos? O que sabemos? O que queremos?
Oscilamos entre os pregadores da esculhambação, os oradores complicados
que ninguém entende, os gritalhões adolescentes eternos e
irresponsáveis. Mas, de repente, vejam só: num tribunal de
desembargadores aqui, em Porto Alegre, minha amadíssima cidade adotiva
(Gramado é a outra, sendo Santa Cruz meu berço), magistrados
relativamente jovens, preparadíssimos mas não metidos a eruditos, sem
rasgados falsos elogios mútuos, começam a botar as coisas em seus
devidos lugares e a apresentar a verdade - devidos, porque é justo,
porque é questão de justiça. Não há política nem politicagem, não há
exibicionismo de erudição jurídica, não há nada palavroso nem olhares
fulminantes ou peitos estufados.
Apenas, com a simplicidade de
quem de verdade sabe e sabe que está com a verdade, fizeram uma faxina
moral e conceitual nas nossas cabeças. Isto é, de quem quis ou soube
escutar.
Um velho professor com quem muitíssimo aprendi sempre
me dizia: "Só quem sabe o mais consegue dizer com clareza e verdade o
menos". De modo que, assim, aprendi então que o caminho da sabedoria é
também o da simplicidade, sobre as calçadas da verdade.
Difícil,
sim. Na vida pessoal, mais ainda na vida pública. Não quero nenhum
imitador de Cristo populista, não quero incitação à desobediência, não
quero irresponsabilidade nem borbulhas de champanhe francês atrás dos
bastidores enquanto nós, o povo brasileiro, trabalhamos até o fim para
pagar contas e impostos, morremos nas filas, no chão dos hospitais, na
pobreza e falta de higiene nos nossos barracos, porque nem esgoto
decente nos deram, muito menos escola boa, e próxima.
Quero,
sobretudo, paz. Decência. Honradez. Alguma liderança de cara e mãos
limpas, que nos dê esperança de não estarmos nos últimos lugares em
quase todas as avaliações globais: infraestrutura, educação, saúde,
Previdência, orgulho natural disto que somos.
Deus nos ajude.
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* Escritora. Colunista da ZH.
Fonte: http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/acessivel/materia.jsp?cd=9ea06a8d8fab507a3061e3b60382bc96
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