Pedro Vaz Patto*
Vi recentemente um documentário de um realizador italo-sueco, Erik Gondini, de 2015, sobre a Suécia, intitulado A teoria sueca do amor.
Este
país é muitas vezes apresentado como modelo de progresso social, onde o
Estado de bem-estar é mais completo, onde os direitos laborais e
sociais são respeitados, onde o trabalho pode ser conciliado com a vida
pessoal e familiar, onde as desigualdades não são chocantes, onde os
migrantes e os refugiados são acolhidos com generosidade. São grandes os
sacrifícios por que estes passam para alcançar a Suécia, que muitos
vêem quase como um paraíso na Terra.
Ora,
esse documentário apresenta o outro lado da Lua, um lado bem pouco
paradisíaco. Um aspeto que pode sintetizar-se nas conclusões de um
estudo realizado pela Cruz Vermelha: na Suécia cinquenta por cento das
pessoas vivem sós e das restantes, quarenta por cento sentem-se sós. E
um em cada quatro suecos morre sozinho; com frequência estas mortes só
são conhecidas muito tempo depois de ocorrerem.
Este
fenómeno não é casual, é – de acordo com a visão do realizador, bem
documentada – consequência de uma estratégia ideológica, de um programa
de “engenharia social” que remonta aos anos setenta do século passado e
aos governos sociais-democratas de Olof Palme. A ideia central dessa
estratégia era a de promover a autonomia, a auto-suficiência e a
independência individuais: independência do indivíduo em relação à
família, da mulher em relação ao homem e vice-versa, dos filhos em
relação aos pais e vice-versa.
O resultado dessa estratégia conduziu à solidão generalizada.
E
reflete-se ainda num fenómeno também referida no documentário: o das
mulheres que escolhem ser mães prescindindo dos homens, mães solteiras
não por acidente ou desgraça, mas por escolha deliberada, num propósito
de independência. Uma possibilidade também aberta pelas mais recentes
alterações da nossa lei da procriação medicamente assistida, aprovadas
numa indiferença quase geral. E que na Suécia é cada vez mais frequente,
com recurso a bancos de esperma e até a uma auto-inseminação praticada
em casa (“home made”).
No
documentário, é apresentada uma escala de países de acordo com a
predominância de valores tradicionais, de um lado, e de valores
secularistas, do outro, onde a Suécia ocupa o lugar extremo. Uma
personagem do documentário, um médico, descobre num dos países mais
pobres do mundo, a Etiópia (onde ninguém morre sozinho), riquezas
humanas que a Suécia perdeu.
No
final, é entrevistado o famoso sociólogo polaco Zygmund Baumannn
entretanto falecido. Afirma ele que a independência não conduz à
felicidade, mas ao vazio, à ausência de sentido e ao tédio. Os suecos
deveriam redescobrir o valor da interdependência, o valor do cuidado de
uns para com os outros, mais do que o do Estado para com todos.
As
propostas de legalização da eutanásia e do suicídio assistido, que
estão na ordem do dia em Portugal, também refletem a sobrevalorização da
autonomia individual, uma autonomia que chega ao ponto de justificar a
morte provocada, diante da qual a sociedade se demite, como se fosse
essa a resposta a dar à doença e ao sofrimento
Na verdade, a visão da pessoa individualista, em absoluto autónoma e solitária, não corresponde ao desígnio natural da pessoa.
E
ainda menos ao da antropologia bíblica e cristã, desde o relato da
Criação no Génesis: «Não é bom que o homem esteja só…». Esta é uma
máxima que vale para a aliança entre homem e mulher, para a família e
para toda a sociedade (de que a família é o núcleo fundamental). Disse
Joseph Ratzinger (o Papa Bento XVI) que a pessoa é um “ser-com” e um
“ser-para”. Dizia Santa Teresa de Calcutá que cada pessoa nasce para
amar e ser amada. E dizia Chiara Lubich que a pessoa humana, criada à
imagem e semelhança de Deus, só se realiza quando ama, quando dá, à
imagem de Deus, que é Amor.
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* Advogado. Presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP ). cnjp.png/Portugal.
Vídeo: https://vimeo.com/144493870
Fonte: http://www.vozdaverdade.org/site/index.php?cont_=ver2&id=6968
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