Psicólogo paulistano conta como deixou a vida mundana, virou líder de um retiro de meditação e ioga na Índia e se tornou guia espiritual de celebridades
25 jan 2018
Quando estava prestes a completar 33 anos, o
psicólogo paulistano Janderson Fernandes de Oliveira foi surpreendido
por uma aparição: um guru o convocava para ir até um dos muitos retiros
de meditação e ioga de Rishikesh, na Índia, cidade célebre por ter
recebido os Beatles, em 1968. Ele foi, encontrou-se, dessa vez em carne
e osso, com o guru que apareceu em sua visão, tornou-se guia espiritual
e, em 2002, passou a se chamar Sri Prem Baba, o que, traduzido do
sânscrito, significa “pai de amor”. Hoje, aos 52 anos, tem mais de
550 000 seguidores somados no Instagram, no Facebook e no YouTube —
nessa última rede, há vídeo com mais de 600 000 visualizações. O centro
de meditação e ioga que ele agora comanda em Rishikesh já recebeu mais
de 10 000 visitantes. Sua fama ultrapassa fronteiras e seus adeptos vão
de celebridades como Will Smith, Alessandra Ambrosio e Reynaldo
Gianecchini a políticos como João Doria, Marconi Perillo e integrantes
de movimentos como o Agora!, do qual Luciano Huck faz parte. Prem Baba
falou a VEJA em seu retiro mantido em São Paulo, um dia antes de
embarcar para sua viagem anual de quatro meses à Índia.
Um movimento espiritual sempre precisa ter um líder?
Não necessariamente. Há grupos de pessoas com diferentes necessidades.
Algumas vão encontrar o caminho do autoconhecimento por elas mesmas.
Outras vão precisar de um guia. Eu precisei.
Por que as pessoas buscam gurus? Vejo mais as
pessoas buscando um caminho do que um guru. Hoje, nota-se uma ânsia
maior de encontrar um propósito para justificar a própria existência,
principalmente entre os mais jovens. Há uma mudança de cultura que tem
feito o processo de autoconhecimento chegar com naturalidade à vida de
uma pessoa, sem a necessidade de ser precedido por uma crise interna ou
de saúde. Mas chega um momento em que essa busca se torna árida. É como
andar em uma cidade desconhecida sem GPS, sem Waze. E um guia, como eu, é
um GPS, um Waze, que pode indicar caminhos por já ter percorrido boa
parte deles.
Essa é a principal razão que leva as pessoas a buscá-lo?
Há três razões principais. A primeira é o propósito. As pessoas estão
perdidas e não sabem por que acordam de manhã. E aí estou falando de
gente com um relativo sucesso no mundo, mas que carrega uma angústia que
não sabe explicar. A segunda é o relacionamento. Muita gente vem a mim
em busca de clareza para saber como se relacionar com o outro de maneira
construtiva, não egoísta. E há ainda os que vêm em busca de um mestre
espiritual porque querem desenvolver a espiritualidade.
Como surgiu a ideia de ser guru espiritual? Nasci
com uma tremenda curiosidade sobre as questões mais profundas da vida.
Com 7 anos, eu perguntava à minha mãe: “Quem criou o mundo?”. Ela dizia:
“Menino, não pense nisso, senão você vai ficar louco”. Conforme fui me
desenvolvendo, notei que o ser humano sofre demais. As pessoas brigam
muito, estão sempre tentando provar para o outro seu ponto de vista. Há
uma competição contínua. Em dado momento, entendi que meu objetivo era
encontrar respostas para esse sofrimento. Comecei a fazer ioga aos 13
anos, virei vegetariano. Aí me dediquei a estudar. Primeiro, por meio de
religiões e escolas de autoconhecimento. Depois, pela ciência. Estudei
física, matemática, mas nada disso era suficiente. Recorri à psicologia e
me formei psicólogo, seguidor de Carl Jung. Eu era relativamente
bem-sucedido, dava palestras, workshops, clinicava, mas ainda sentia que
não havia encontrado meu caminho. Então recebi um chamado e decidi ir
para a Índia. Foi aí que tudo fez sentido.
Como foi isso? Eu estava próximo de completar 33
anos e vivia um momento de muito ceticismo. Não acreditava em nada e
achava as questões espirituais uma grande bobagem, apenas criações da
mente humana. Mas vivia uma crise existencial tão profunda, uma
depressão tão terrível, que fiz uma oração: pedi que meu caminho se
revelasse, pois eu já não sabia mais o que fazer. Foi aí que tive uma
visão de um velho de barbas brancas, ao pé do Himalaia, que dizia: “Você
vai completar 33 anos, venha para a Índia, em Rishikesh”. Então me
lembrei que esse mesmo velho, que veio a ser o Maharaj Ji, meu mestre,
já havia aparecido em meus pensamentos quando eu tinha 13 anos, durante
uma aula de ioga, dizendo a mesma mensagem. Mas isso havia desaparecido
da minha cabeça. Com a segunda mensagem, não tive dúvida e fui. Estava
prestes a me casar e sugeri que a lua de mel fosse na Índia.
E como o senhor se tornou um guru? Não foi de
imediato. Na primeira vez que fui, em 1999, não fiquei, pois havia
acabado de me casar. Mas foi tão poderoso meu encontro com o Maharaj Ji,
em Rishikesh, que tive a certeza de que aquele era o meu caminho.
Voltei à Índia no ano seguinte e em todos os outros. E, em 2002, fui
reconhecido pelo Maharaj Ji como mestre da linhagem Sachcha. Então
deixei de ser Janderson e me tornei Sri Prem Baba. Em 2011, com a
passagem do Maharaj (ele evita a palavra “morte”), assumi seus trabalhos em Rishikesh.
O senhor continua casado? Eu me separei. Minha
mulher se tornou minha amiga, e minha energia foi se direcionando para o
trabalho espiritual, e aí não sobra energia para mais nada. Tornei-me
celibatário.
O sexo é incompatível com a espiritualidade? Não.
Tenho, inclusive, ensinado os caminhos do sexo tântrico, para levar a
meditação para a relação sexual. Dou valor à sexualidade dentro do
caminho espiritual. Mas, conforme a consciência vai se expandindo,
realmente a energia vai sendo direcionada para outro lado. É como uma
criança que ganha uma bicicleta. No início, não larga o presente. Depois
que brincou o suficiente, já não liga mais para ele. Não tem mais
aquele apego, aquela dependência. É nesse sentido que eu vejo a
sexualidade. Mas quero deixar claro que isso não acontece com todos.
Apenas com algumas pessoas, a minoria, eu diria.
As religiões falharam em promover autoconhecimento e espiritualidade?
Sem dúvida. É claro que há grupos dentro das religiões que ainda mantêm
alguma conexão com o espiritual. A cabala, no judaísmo, e o sufismo, no
islamismo, são alguns exemplos. Há cristãos sinceros que vivem o
ensinamento original do Cristo. Mas são poucos. De modo geral, percebo
que houve uma distorção da trilha proposta. É comum que isso aconteça.
Quando o mestre não está mais presente para guiar, o caminho muitas
vezes se perde.
Já houve grupos que propagaram suas ideias de forma deturpada?
Até agora, não. Mas sei que isso pode acontecer. Ao mesmo tempo, hoje
nós temos mais condições de proteger o discurso. Quem quer conhecer
nosso trabalho pega um livro, um vídeo, acessa o site. Está tudo ali, na
internet. Procuro ser o mais claro possível, falo de maneira simples,
objetiva, para não criar dúvidas. E sempre tomo o cuidado de evocar a
autorresponsabilidade, propondo que cada um ande com as próprias pernas.
Não digo a ninguém que faça o que eu falo, mas sim que ouça a si mesmo.
Não há doutrina. O trabalho do mestre espiritual é acordar a intuição
do indivíduo.
Celebridades como Reynaldo Gianecchini, Alessandra Ambrosio e
Juliana Paes são seus seguidores. Por que o senhor caiu no gosto dos
artistas? Isso começou no início de 2013, quando percebi que
tinha de sair para a rua, aumentar nosso alcance. A primeira atitude que
tive foi me organizar e criar um movimento, chamado Awaken Love. No dia de sua inauguração, em Fortaleza, no Beach Park, um amigo convidou alguns artistas (estavam presentes Juliana Paes, Astrid Fontenelle, Marina Ruy Barbosa, entre outros).
A partir daí, foi um desdobramento natural. Um falou para o outro.
Fizemos em Fortaleza porque, naquele momento, ali vivia a pessoa que
estava podendo nos patrocinar (o empresário João Gentil, dono do Beach Park, é um dos grandes doadores do Awaken Love).
Há muitos políticos que vão aos seus retiros? Um ou
outro. Mais os jovens, em especial esses grupos de jovens lideranças
que estão surgindo. Eles estão bem próximos de mim. Acredito que muitas
pessoas que partilham comigo esse trabalho de desvendar o propósito
estão se reconhecendo como lideranças políticas e decidiram entrar nesse
mundo, como os jovens do Agora!. E assumi a função de empoderá-los.
Luciano Huck aposta nesses movimentos, mas nunca me encontrei com ele.
Todos os seus cursos e retiros são pagos (um curso de três
dias custa em torno de 1 500 reais, com alimentação e hospedagem). A
renda interfere na busca por espiritualidade? Tenho feito um
esforço para popularizar o autoconhecimento e fazer com que a renda não
seja um obstáculo. Criamos conteúdo on-line, o livro Propósito tem uma
versão mais barata, a 15 reais, tentamos estar em todas as mídias. Mas
há também o ditado: “Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”.
Eu mesmo, quando queria ir para a Índia, em uma das ocasiões, fiquei sem
dinheiro. Fiz uma oração sincera ao universo, focando o Maharaj. No dia
seguinte, uma pessoa veio e me deu a viagem de presente. Disse que
sonhou comigo e sentiu que tinha de me dar esse presente. Dei uma grande
gargalhada. E olhe que naquela época eu nem era o Prem Baba, era só o
Janderson.
Como o senhor se mantém? Por meio de doações e
cursos. Muito desse dinheiro se destina a alimentar a obra. Algumas
palestras, eu dou de graça. Em outras, faz parte do esquema de
organização do evento pagar aos palestrantes, e o dinheiro é direcionado
para o movimento. Há também subsídio em passagens, e, às vezes, quando
não pagam cachê, pagam passagens e hotel. Isso eu exijo, senão não vou.
Não dá. É o mínimo.
Qual objetivo o senhor ainda não alcançou? Tornar o
autoconhecimento uma política pública. Tenho me esforçado muito para
isso, pois só assim ele vai acontecer em escala. E um dos melhores
caminhos para iniciar esse processo é no ensino fundamental, na
disciplina que chamamos de desenvolvimento das habilidades
socioemocionais, que vai constar da base nacional curricular comum a
partir de 2019. Com isso, a criança poderá desde cedo aprender a
gerenciar a emoção, meditar, encontrar dentro dela os recursos para
lidar com as dificuldades da vida.
O senhor acha que o currículo incluiu a disciplina por sua causa?
Penso que a própria criação dessa disciplina na base curricular é fruto
de nosso trabalho, já que nos reunimos com algumas pessoas que estavam
elaborando o documento. Então, considero que estou influenciando de
alguma maneira.
--------Foto: (Antonio Milena/VEJA)
Publicado em VEJA de 31 de janeiro de 2017, edição nº 2567
Fonte: https://veja.abril.com.br/revista-veja/guru-e-como-o-waze/
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