Luis Felipe Pondé*
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Muitas vezes você deve ter se perguntado para que serve um deputado
estadual no Brasil. Uma resposta que deve vir à sua mente é: para nada.
Mas, você pode, infelizmente, estar errado.
Para além da inutilidade estrutural de grande parte dos políticos no
Brasil, a organização política do Brasil determina a quase inutilidade
dos deputados estaduais porque tudo é decidido em Brasília.
Como disse um amigo meu, se você cometer um crime no Brasil e se
esconder na Assembleia Legislativa estadual, provavelmente, o crime
prescreverá, porque quase ninguém vai lá.
As coisas sempre podem piorar: alguns entre os muitos inúteis podem
resolver "legislar" e aí, a emenda sai pior do que o soneto. Inúteis são
menos perigosos quando ficam quietos.
Por incrível que pareça, alguém parece estar tentando proibir
restaurantes e bares de vender produtos de carne às segundas-feiras no
Estado de São Paulo, em nome da defesa animal.
Temos em Brasília as bancadas da bala, da Bíblia, do boi, e agora, em
São Paulo, temos a bancada da rúcula. Para essa bancada, a humanidade de
sete bilhões de Sapiens pode sim se alimentar de rúcula com alface,
apesar de toda a história da seleção natural dizer o contrário.
Tudo bem, modas são modas, e vivemos uma era de modas ridículas,
principalmente entre jovens riquinhos. Veganos de todos os tipos,
seguindo o guru Peter Singer e seu "Animal Liberation" de 1975, afirmam
que comer animais é "especismo". O termo é cunhado como analogia a
"racismo". Bicho também é gente.
Partilho da sensibilidade de cuidado com os animais e desconfio de quem
maltrata animais. Mas, como seres naturais que somos, precisamos nos
alimentar.
Não existe a natureza que os veganos imaginam em suas vidinhas
protegidas e cheias de pequenos luxos alimentares presentes em
restaurantes descoladinhos. A natureza é uma besta fera que devora tudo.
Câncer é tão natural quanto uma praia maravilhosa e deserta. Entrega um
vegano desses pra besta fera que é a natureza e você verá o que
acontece: os vermes carnívoros comerão os veganos, assim como comerão os
frequentadores de churrascarias. A riqueza material corre o risco de
deixar todo mundo abestalhado.
Afora o fato evidente de que as pessoas podem gostar ou não de carne,
sentir-se bem comendo carne ou não, ter nojo ou não (e ninguém deve se
meter nessa questão de gosto pessoal), a ideia de transformar em lei
algo assim (proibir as pessoas de comer carne em locais públicos num dia
da semana) só pode passar pela cabeça de algum fascista verde radical.
Ou de alguém financiado por algum grupo de interesse em "dinheiro
verde". Ou de um neoidiota contra a carne.
Se leis assim passarem um dia, teremos chegado ao fundo do poço de uma tendência contemporânea que é o fascismo de butique.
O que é fascismo de butique? É gente que transforma suas pequenas manias
em pautas universais, do tipo: "A humanidade tem que viver como eu acho
que ela deve viver".
Jovens que vêm de boas famílias, normalmente, compõem o grosso desse
fenômeno. Na Europa, como bem dizia o sociólogo Zygmunt Bauman
(1925-2017), esse tipo de jovem é produto do Estado de bem-estar social,
mas no Brasil e nos EUA são frutos de pais com razoável grana que pagam
escolas caras que abraçam árvores.
Eduque seu filho para ser uma "pessoa com outra qualidade de
consciência" e terá um idiota pra sempre a ser sustentado em suas manias
narcísicas de comportamento "puro". Nunca se prepararam tão mal os
jovens para a vida real como nos últimos anos. Jovens assim não
enfrentariam desafios, dos Neandertais a Hitler.
Faça um teste consigo mesmo: se você achar que sabe como as pessoas
deviam viver para serem melhores, a chance de você ser um fascista de
butique é enorme.
Enfim: alguém quer proibir você de comer um churrasquinho na
segunda-feira. Quer ir jantar à noite? Estaria a fim de comer um steak
com molho poivre e fritas? A Assembleia Legislativa de São Paulo, do
alto da sua infinita utilidade, quer proibir.
A bancada da rúcula vai obrigar a você a comer o que ela quer que você coma.
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*Filósofo, escritor e ensaísta, pós-doutorado em epistemologia pela
Universidade de Tel Aviv, discute temas como comportamento, religião,
ciência.
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2018/01/1950426-proibir-carne-em-certos-dias-da-semana-so-pode-ser-ideia-de-fascista.shtml
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