Sylvio Ferraz Mello*
A história das aplicações da ciência básica desde a Antiguidade é repleta de descobertas feitas por cientistas movidos apenas pela sua curiosidade, que mudaram a história da humanidade.
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Contam
que Michael Faraday, grande experimentalista do século XIX, descobridor
da indução eletromagnética, princípio em que se baseiam os
transformadores e geradores elétricos, recebeu em seu laboratório a
visita da rainha Victória. Depois de acompanhar várias demonstrações dos
fenômenos descobertos por Faraday, a rainha lhe perguntou se aquelas
descobertas tinham alguma utilidade. Faraday teria respondido ‘Ainda não
sei. Mas dia virá em que Vossa Majestade cobrará impostos sobre elas’.
Essa pequena história, e suas várias versões, é um dos mais populares
fake news sobre o desenvolvimento da ciência no século XIX. Mas como diz
um célebre ditado italiano, “si non è vero, è bene trovato”.
A história das aplicações da ciência básica
desde a Antiguidade é repleta de descobertas feitas por cientistas
movidos apenas pela sua curiosidade, que mudaram a história da
humanidade. Para ilustrar com exemplos atuais, é só lembrar que sem a
abstrata e quase onírica teoria da relatividade de Einstein, o GPS, que
hoje guia os passos de uma fração importante da humanidade, não poderia
existir. E a grande maioria dos produtos eletrônicos só existem graças
aos conhecimentos da Física Atômica e das teorias quânticas do século
XX.
Para dar exemplos domésticos, podemos
lembrar que a riqueza criada pela EMBRAER e desfrutada pela nação
brasileira já superou, e de muito, tudo o que foi gasto pelo Brasil para
criar e manter o Instituto Tecnológico de Aeronáutica. E se o ITA não
tivesse existido, também não teria existido a EMBRAER.
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De repente, alguns iluminados passaram a fazer campanha contra as vacinas, utilizando à larga os meios modernos de comunicação.
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A muitos pode parecer ridículo insistir em exemplos mostrando como a ciência pervade e molda a sociedade contemporânea. Afinal, 2,5 bilhões de pessoas na Terra passam horas por dia em seus smartphones! Mas a questão colocada é atual. Um grande número de pessoas movidas por doutrinas extravagantes insiste em questionar a importância da ciência. E não me refiro aos cidadãos mais simples. Esses, em sua grande maioria, sabem que, quando precisarem, as novas tecnologias a serviço da medicina irão beneficiá-los e lhes permitirão viver bem por muito mais tempo do que seus antepassados.
A muitos pode parecer ridículo insistir em exemplos mostrando como a ciência pervade e molda a sociedade contemporânea. Afinal, 2,5 bilhões de pessoas na Terra passam horas por dia em seus smartphones! Mas a questão colocada é atual. Um grande número de pessoas movidas por doutrinas extravagantes insiste em questionar a importância da ciência. E não me refiro aos cidadãos mais simples. Esses, em sua grande maioria, sabem que, quando precisarem, as novas tecnologias a serviço da medicina irão beneficiá-los e lhes permitirão viver bem por muito mais tempo do que seus antepassados.
Eles também sabem que, se for preciso,
poderão um dia ter algum de seus órgãos substituído por órgãos
artificiais produzidos com os novos materiais descobertos pela ciência,
às vezes melhores que os órgãos originais de nascença. Os
questionamentos mais importantes vêm de “intelectuais”. São oposições
incompreensíveis. Em algumas esferas intelectualizadas, às vezes parece
que a coisa mais importante é ser diferente dos outros. Não existe
nenhum mal em se adotarem dietas exóticas. Há mesmo cientistas que se
dedicam a aperfeiçoá-las. Mas dietas exóticas não resolvem o problema de
alimentar 7,5 bilhões de pessoas.
Para alimentar a humanidade, são
necessárias tecnologias modernas que permitam a produção de alimentos em
grandes quantidades. Cabe decidir o que é mais importante: alimentar o
maior número possível de pessoas ou seguir as regras estritas
preconizadas por uma casta intelectualizada. É papel da ciência fornecer
meios para que a produção de alimentos possa aumentar, para que os
alimentos produzidos sejam da melhor qualidade, e que os modos de
produção sejam menos agressivos à natureza.
Essa é a meta, mas enquanto isso é preciso
ter em mente que os 7,5 bilhões de humanos precisam comer todos os dias e
que é preciso produzir os alimentos de que necessitam. E de maneira
abundante, porque as regiões mais pobres são dominadas por políticos e
vão continuar com fome mesmo que os alimentos existam. Cabe à ciência
aprimorar ainda mais as tecnologias de produção para que a fome possa
ser erradicada.
A atualidade da questão colocada neste
artigo pode ser sentida na atual crise das vacinas. De repente, alguns
iluminados passaram a fazer campanha contra as vacinas, utilizando à
larga os meios modernos de comunicação. Uma campanha que foi silenciosa,
mas bem sucedida. O resultado foi o que se viu. Doenças já largamente
erradicadas, como o sarampo, voltaram a matar pessoas! E o fantasma do
retorno da poliomielite atemoriza os profissionais da saúde. Em ambos os
casos a medicina dispõe de vacinas modernas e de comprovada eficiência e
as mortes verificadas ocorrem por culpa daqueles que irresponsavelmente
difundem inverdades para a população.
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* Sylvio Ferraz Mello é físico, professor emérito e ex-diretor do Instituto de Astronomia,Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP
Fonte: https://jornal.usp.br/artigos/ciencia-e-tecnologia-para-o-desenvolvimento-de-um-pais/
Imagem da Internet
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