“No Brasil, o embate político principal já não é entre direita e esquerda, apesar de tudo que se diz. O embate é religioso.
É busca do poder como meio de impor ao conjunto da sociedade os valores desses grupos culturalmente
minoritários, conservadores e frequentemente intolerantes. Está
surgindo aqui uma religião do poder e por meio dela se firma o poder da
religião. Nessa metamorfose, a democracia sucumbe, não o catolicismo”,
escreve José de Souza Martins,
sociólogo, professor Emérito da Faculdade de Filosofia da USP,
pesquisador Emérito do CNPq e membro da Academia Paulista de Letras.
Entre outros livros, autor de A Política do Brasil Lúmpen de Místico (Contexto) em artigo que nos foi enviado pelo autor. O artigo foi publicado originalmente por Valor, 24-01-2020.
Segundo o sociólogo,
“várias das religiões que estão se disseminando entre nós
expressam o homogenismo materialista do pensamento único, o que torna
cada vez mais difícil ser crítico e autodefensivo em relação à crescente incapacidade de muitos de ver a decisiva diferença entre Deus e poder. Entre as igrejas da caixa da esmola e as igrejas da caixa registradora.
Na nova unidade dos cristãos, a polarização não é entre católicos e evangélicos, mas entre fé e poder. Um retorno ao cristianismo da insurgência contra os vendilhões do templo e a desumanização do homem”.
Eis o artigo.
Não passa semana sem que jornais e revistas divulguem dados e análises que mostram o declínio numérico dos católicos em relação ao conjunto das outras religiões. Ou, mais especificamente, em relação aos evangélicos. Agora mesmo,- uma nova análise prevê que em 2035
- o catolicismo deixará de ser a religião da maioria da população brasileira. Os evangélicos serão maioria.
- esvazia as religiões do que lhes é próprio
- e anula seu tema essencial que são o sagrado e os ritos por meio dos quais se expressa.
- as análises, nessa perspectiva, descosturam as religiões,
- o ecumenismo junta o catolicismo e diferentes religiões, protestantes e ortodoxas numa outra unidade, de uma nova religiosidade.
- De oposição e de revisão crítica das crenças que sucumbiram à mentalidade de supermercado e ao afã de poder.
- mas a maioria evangélica dessa reflexão é apenas nominal,
- já que dividida em diferentes igrejas, que competem entre si pela alma dos pecadores.
- E até pela natureza dos pecados que congregam os respectivos membros.
Não é estranho, pois, que
- o simbolismo das vestes cerimoniais do celebrante anteponha um bispo neopentecostal revestido de paramentos judaicos
- a um missionário neopentecostal de outra igreja, que no púlpito não usa o quipá, mas o chapéu de vaqueiro dos filmes de faroeste.
O catolicismo continuará a ser a religião da maioria dos brasileiros, mesmo depois de 2035.
É que,
- se o catolicismo é tratado como uma religião,
- cada uma das igrejas evangélicas concorrentes é também única.
- Nesse sentido, é cada uma delas muito minoritária.
- as igrejas neopentecostais
- nem mesmo podem ser reduzidas às pentecostais, bem diferentes.
O que os analistas não têm mencionado é que
- o catolicismo, apesar de suas diferenças internas,
- mantém sua unidade centrada na autoridade simbólica e doutrinária do Papa.
- Estas tendem a expressar os anseios de ascensão social da classe média
- que vem se evadindo da Igreja Católica, mas também de algumas igrejas protestantes tradicionais
- e mesmo de outras igrejas neopentecostais e pentecostais.
- expressam os sentimentos comunitários e a religiosidade dos simples,
- os que carecem de vida e vida em abundância.
- No Brasil, o embate político principal já não é entre direita e esquerda, apesar de tudo que se diz.
- O embate é religioso.
- É busca do poder como meio de impor ao conjunto da sociedade os valores desses grupos culturalmente minoritários, conservadores e frequentemente intolerantes.
- Está surgindo aqui uma religião do poder e por meio dela se firma o poder da religião.
Para o catolicismo e para as igrejas cristãs tradicionais, como se vê nos esforços e nos valores religiosos do movimento ecumênico,
- o que está em jogo não é a disputa entre as religiões.
- O que está em disputa é a vitalidade e o sentido do sagrado.
- Está em disputa, também, a religião contra a coisificação dos seres humanos na cultura da pós-modernidade.
- expressam o homogenismo materialista do pensamento único,
- o que torna cada vez mais difícil ser crítico e autodefensivo
- em relação à crescente incapacidade de muitos de ver a decisiva diferença entre Deus e poder.
- Entre as igrejas da caixa da esmola e as igrejas da caixa registradora.
- a polarização não é entre católicos e evangélicos, mas entre fé e poder.
- Um retorno ao cristianismo da insurgência
- contra os vendilhões do templo e a desumanização do homem.
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