Clóvis Malta*
Que bom e estranho seria se esse
espírito do bem chamado de Natal baixasse sobre todas as pessoas, no
planeta inteiro, poderoso como o das forças da natureza num terreiro de
candomblé. Não importa sobre quem, se é cristão, ou ateu, ou nada, não
interessa a crença, nem se as pessoas a têm ou não, nem o nome das
pessoas, nem a cor, nem as escolhas, desde que estejam todas se sentindo
livres e às voltas com uns desejos saudavelmente malucos. Umas vontades
que, sob o clima de final de ano, nos deixam pensando se não seria
possível realizá-las, por que não?, pois, se ficarem para mais adiante,
talvez nem dê tempo.
Por exemplo: ir até uma praia distante, no
Guaíba mesmo. Ficar mirando-a por um tempo, até constatar que o
lago/rio, por ordem alfabética, para não abrirmos discussão com a
galera, é lindo. E apreciar a vista.
Talvez andar pelas ruas,
pelo prazer de andar. Parar sob uma árvore e prestar atenção no canto
das cigarras. Pensar, por exemplo, em tudo o que se vai dispensar no
mundo quando a tecnologia conseguir reproduzir esse e outros sons de
forma idêntica.
Se possível, andar um pouco mais, muito, nem que
seja só mentalmente, como quem caminha sobre um mapa imaginário. Andar
porque só andando, não importa como, se percebe nos detalhes a beleza do
mundo.
Se tiver dinheiro, tomar sorvete, comer pipoca. Tomar um
ônibus urbano, sem perguntar qual, e se deixar levar pela cidade, pela
vida, pelos bairros elegantes, pela periferia tão descuidada, pelos
campos com esses morros de cumes arredondados. Entender que a paisagem
tem tudo a ver com a dos nossos cadernos de infância. Demonstrar
gratidão por isso.
Se puder, andar, amar, andar. Andar sem se deixar levar pelos pensamentos, apenas permitindo que passem como nuvens ralas.
Andar, refletir, meditar, rezar, agradecer pelas pessoas, por você, por
nós, por todos, pelas oportunidades que esta existência nos dá. Ser
simples, mas tão simples na busca do realmente essencial, que nem
precisa dizer, pois todos vão notar.
Clamar por mais respeito
aos seres, todos os seres. Pensar no sofrimento daquele homem tão sereno
na cruz, no negrinho do pastoreio sendo consumido pelo formigueiro. Só
para não perdermos a dimensão de até onde pode ir o horror humano.
Imaginar que os dois, o da cruz e o do formigueiro, foram bebês formosos como o da manjedoura.
Perceber que há algo igual e comum a todos, que tudo nos conecta, até a
mente, até esse clima natalino, mesmo entre quem não consegue ter fé,
mas então passa a conseguir, e a sentir, a fé. Pois acabou de
descobri-la ali onde esteve o tempo todo, essa fé, como num milagre.
E, aí, tente imaginar o mundo inteiro nas ruas, defendendo a
fraternidade. Mentalize isso, para que aconteça. Gente de todo lado
possuída por esse espírito forte como Exu, com a bandeira do Natal. Do
Natal que é amor pleno, sem discriminações, pois apenas acolhe, abre os
braços e diz: vem.
Natal para todos.
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* Jornalista
Fonte: http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/acessivel/materia.jsp?cd=cd05aa1cda49177594fbe248ba902f54
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