Bolsonaro serve café para John Bolton, assessor de Trump.
Ex e futuro presidente acenaram para mercado, optaram por chanceleres ideológicos e turbinaram pasta da Justiça
“Isso de sair e abraçar as pessoas deu problema com a segurança, mesmo antes da posse”, lembra Ricardo Kotsho, que foi secretário de Imprensa de Lula.
No mesmo dia em que fez churrasco, Bolsonaro passou em quiosques na
Barra da Tijuca, onde cumprimentou eleitores. Fotos da mesa do café da
manhã do presidente eleito, com pão e leite condensado, além da recepção
nada formal ao assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, John
Bolton, com cafeteira de plástico e embalagem de iogurte, reforçaram a imagem de homem simples de Bolsonaro —a exemplo de Lula.
“São dois políticos pouco formais e que se deixam mostrar em momentos
de relaxamento”, diz Sérgio Praça, cientista político e professor da
FGV.
Há mais semelhanças: vencida a eleição, Lula e Bolsonaro buscaram
aplacar a desconfiança de investidores com declarações que deram no
passado nomeando pessoas bem aceitas pelo mercado.
O petista dividiu essa função entre duas pessoas: Antônio Palocci para a Fazenda e o ex-banqueiro Henrique Meirelles para o Banco Central. Bolsonaro concentrou tudo em Paulo Guedes.
“Palocci era tão próximo do Lula quanto Bolsonaro é do Guedes. Não
são íntimos, mas aparentemente trabalham bem juntos e se entendem”,
afirma Praça.
Neste ano, como em 2002, o cenário era de crise econômica e a
transição foi um jogo de sinalização para o mercado, na avaliação de
Spektor.
“Ambos organizaram suas transições para mandar uma comunicação para o
mercado de que o governo será economicamente responsável, ou seja, fará
um ajuste fiscal. O mercado, mesmo quando não confia no conhecimento
econômico do presidente eleito, confia no seu guru.”
Há diferenças, contudo. Enquanto Guedes é o “posto Ipiranga” de
Bolsonaro, Lula tinha uma equipe de economistas e nomes do próprio PT a
quem recorria na formulação de políticas. “Lula abastecia álcool com
[José] Dirceu e gasolina com Palocci”, diz Praça.
“Palocci não tinha a autonomia que Guedes vai ter, ele era mais um executor”, avalia o ex-ministro Gilberto Carvalho.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque é doutor em economia por Harvad e comandará a Secretaria-Geral de Previdência e Receita Federal.
Os dois presidentes também buscaram um canal com os EUA ainda durante
a transição. Dirceu, que virou ministro da Casa Civil, foi a
Washington, e Palocci se encontrou com o FMI. Já Bolsonaro, além do
encontro com Bolton, enviou seu filho aos EUA.
Se na economia ambos procuraram passar imagem moderada, o oposto
ocorreu na política externa. Lula e Bolsonaro escolheram chanceleres a
dedo para agradar às suas bases, como num movimento compensatório.
Ernesto Araújo quer o fim da “ideologia marxista” na diplomacia. Já Celso Amorim era a favor de aproximação com Cuba e da multipolaridade.
O ex e o futuro presidente também se assemelham na escolha para outra
pasta-chave, a da Justiça. Ambos optaram por figuras midiáticas e de
peso.
Bolsonaro nomeou Sergio Moro como superministro; Lula optou pelo mais importante criminalista da época, Márcio Thomaz Bastos.
Segundo Praça, Bastos foi incumbido de fortalecer a Polícia Federal
e, de fato, ampliou o órgão e valorizou a carreira. “A meta de combate à
corrupção começou ali”, diz.
Ataques à imprensa também perpassam discursos dos dois presidentes. Bolsonaro criticou a mídia dez vezes por semana em outubro. Lula também adotou uma política de enfrentamento, mas a tensão se intensificou no governo.
Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/12/opostos-politicamente-bolsonaro-e-lula-tem-aspectos-em-comum.shtml
Bolsonaro | Lula | |
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Calmante para o mercado | Paulo Guedes, economista liberal, foi apelidado de posto Ipiranga por responder a tudo que se refere a economia no governo de Bolsonaro, que já admitiu não dominar o tema. A nomeação de Guedes foi uma sinalização ao mercado | Tinha em Antonio Palocci, seu primeiro ministro da Fazenda, a principal ponte com o mercado. Egresso do BankBoston, Henrique Meirelles tinha papel equivalente no Banco Central |
Superministro da Justiça | Para apontar comprometimento com o combate à corrupção e agradar ao eleitorado, Bolsonaro anunciou o ex-juiz Sergio Moro, da Lava Jato, como superministro, que também terá a missão de reduzir a violência | Escolheu Márcio Thomaz Bastos, renomado advogado criminalista. A função era a mesma de Moro: fortalecer a Polícia Federal e torná-la instrumento de combate à corrupção |
Chanceleres ideológicos | Escolheu Ernesto Araújo, que condiz com ideias bolsonaristas ao criticar a adesão da diplomacia brasileira ao que considera pautas abortistas e anticristãs. É entusiasta de Donald Trump, presidente dos EUA | Escolheu Celso Amorim, num afago aos setores da esquerda, já que o ministro pregava o fortalecimento de alianças Sul-Sul e era crítico da política de isolamento de Cuba |
Churrasco e futebol | Aparece frequentemente vestido com camisetas de time e é torcedor do Botafogo e do Palmeiras. Eleito, foi ao banco sacar dinheiro para comprar a carne de um churrasco com seguranças | Torcedor do Corinthians, Lula jogou bola na Granja do Torto ainda durante a transição e manteve o hábito durante o governo. Antes da posse também recebeu FHC para um churrasco |
Descontração | Como Lula, também aposta na imagem de líder popular, postando fotos e vídeos à vontade em casa, com camisetas de time e pão com leite condensado | Construiu sua imagem de líder popular desde os anos 1980. Tomava “banhos de povo”, quando se afastava dos seguranças para cumprimentar apoiadores |
Tensão com a imprensa | Criticou a imprensa dez vezes por semana em outubro. Em sua primeira entrevista coletiva, selecionou quais veículos entrariam. Sobre a Folha, afirmou: “Esse jornal se acabou” | Ataques à mídia se intensificaram ao longo do governo. Criticava a imprensa “partidarizada” e privilegiou blogueiros e veículos alinhados com o PT |
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