O mundo acadêmico está cada vez mais ligado nas grandes questões sociais da nossa época. Na última segunda-feira, meu orientando Wagner Machado da Silva defendeu, no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS, sua tese “A cor do conhecimento: Afronarrativas, racismos e (in)visibilidade dos doutorandos negros nos programas de pós-graduação em comunicação do Rio Grande do Sul”. Na banca, Jairo Ferreira (UFSM), Sara Feitosa (Unipampa), Deivison Campos (Famecos/PUCRS) e Melina Santos (RJ). Wagner está comigo desde 2010. Orientei seu trabalho de conclusão de graduação, sua dissertação de mestrado e seu doutorado.
No TCC, investigou a (in)visibilidade dos negros na televisão do Rio Grande do Sul. Agora, no doutorado, fez uma tomografia do lugar dos negros nos programas de pós-graduação. A cada vez, diagnostica o que se passou a chamar de racismo estrutural. No Brasil, a força das estruturas funciona pesadamente como uma agenda inercial. Parece um rio caudaloso arrastando o que encontra pela frente. Não se trata de apontar o dedo para esta ou aquela pessoa ou instituição, nem de denunciar conspirações secretas, mas de mostrar a autorreprodução de um sistema que se alimenta de uma longa cadeia de exclusão.
Wagner Machado da Silva termina o seu trabalho em tom otimista, pesando conquistas, resistência e esperança: “Na espiral da história, esta tese nos permite refletir sobre o lugar da comunicação na afirmação e na manutenção do racismo. Os dados, somados à discussão teórica, são indicadores consistentes de um cenário no qual estruturas ainda permanecem imóveis, em função de ideologias praticadas ao longo de séculos, afetando o reconhecimento da identidade negra como algo desejável em muitos locais e não seria diferente na universidade”.
Pesquisador mergulhado no universo da sua pesquisa, Wagner consegue fazer a ponderação de progressos e expectativas: “Há avanços efetivos e significativos rumo a uma comunicação antirracista, no que diz respeito à reivindicação por maior presença de pessoas negras na pós-graduação, especialmente no doutorado ou como docente. Mas as reflexões teóricas acerca do racismo, o pensar sobre a comunicação e seu lugar como elemento sociocultural nos dão a certeza de que estamos longe de sanar os danos feitos à construção de uma identidade negra brasileira. Isso porque a curva de pessoas não brancas tem trajetória irregular, demonstrando como as estruturas do racismo perduram e se sustentam no desequilíbrio das representações da negritude”.
A caminhada continua com seus saltos e sobressaltos: “Naturalmente, como toda a pesquisa, inclusive esta tese, não se pretende ter um ponto final, pois o que acaba é o tempo da escrita não o conteúdo. Aqui é apenas o término de um ciclo, no qual fica evidente que precisam surgir novos estudos sobre esse tema, assim como já fizeram as pensadoras Nilma Lino Gomes e Lelia Gonzalez, que propagam produções anti-hegemônicas, tentam democratizar e ampliar as possibilidades de conhecimento nas instituições de ensino. Mais do que isso, é urgente que haja uma transformação que possa partir da reflexão para a prática em nossa sociedade e que consiga desconstruir o pensamento colonial. Porém isso não ocorrerá de forma natural ou organicamente, mas nosso futuro tem raízes fortes e os frutos já estão sendo colhidos. Nada mais será sobre nós sem nós”.
A banca proporcionou um momento importante de análise, depoimento e até mesmo de diálogo entre os seus componentes.
*Sociólogo. Jornalista. Prof. Universitário. Escritor.
Fonte: https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/colunistas-matinal/juremir-machado/juremir-a-cor-do-conhecimento/
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