Muitos baby boomers têm um longo histórico de uso de drogas, maconha e álcool, e isso está afetando números de saúde de pacientes idosos. Foto: Claire Merchlinsky/The New York Times
Muitos baby boomers idosos têm uma longa história com medicamentos, maconha e álcool. “O campo não estava preparado para isso”, disse um especialista
THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando o Dr. Benjamin Han, um geriatra e especialista em medicina do vício, atende novos pacientes na Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, ele fala com eles sobre os problemas de saúde comuns que os idosos enfrentam: doenças crônicas, capacidade funcional, medicamentos e como eles estão funcionando.
Ele também pergunta sobre o consumo de tabaco, álcool, maconha e outras substâncias não prescritas. “Os pacientes tendem a não querer revelar isso, mas eu pergunto dentro de um contexto de saúde”, disse Han.
Ele diz a eles: “À medida que você envelhece, há mudanças fisiológicas e seu cérebro se torna muito mais sensível. Sua tolerância diminui à medida que seu corpo muda. Isso pode colocar você em risco.”
É assim que ele descobre que alguém reclamando de insônia pode estar usando estimulantes, possivelmente metanfetaminas, para acordar de manhã. Ou que um paciente que toma há muito tempo um opioide para dor crônica teve problemas com uma receita adicional de, digamos, gabapentina (remédio para dor).
Quando uma paciente de 90 anos, uma mulher em boa forma capaz de pegar o metrô para o hospital em que ele estava anteriormente na cidade de Nova York, começou a relatar tonturas e quedas, Han demorou um pouco para entender o motivo: ela tomava seus comprimidos prescritos, um número crescente à medida que envelhecia, com uma dose de conhaque.
Ele teve pacientes mais velhos cujos problemas cardíacos, doenças hepáticas e comprometimento cognitivo provavelmente foram exacerbados pelo uso de substâncias. Alguns tiveram overdoses. Apesar de seus melhores esforços, alguns morreram.
Até alguns anos atrás, mesmo durante a epidemia de opioides, os profissionais de saúde e pesquisadores prestavam pouca atenção no consumo dessas substâncias por adultos mais velhos; as preocupações se concentravam nas vítimas mais jovens e em idade ativa que eram as mais afetadas.
Mas conforme os baby boomers completaram 65 anos, idade em que normalmente se qualificam para o Medicare, os transtornos por uso de substâncias entre a população mais velha aumentaram acentuadamente. “Há grupos com hábitos relacionados ao consumo de drogas e álcool que permanecem ao longo da vida”, disse Keith Humphreys, psicólogo e pesquisador de vícios da Faculdade de Medicina da Universidade de Stanford.
Os boomers mais velhos “ainda usam muito mais substâncias do que seus pais, e o campo não estava pronto para isso”.
As evidências de um problema crescente estão se acumulando. Um estudo sobre transtorno do uso de opioides em pessoas com mais de 65 anos inscritas no Medicare tradicional, por exemplo, mostrou um aumento de três vezes em apenas cinco anos - de 15,7 casos por 1.000 em 2018, a 4,6 casos por 1.000 em 2013.
Tse-Chuan Yang, coautor do estudo, sociólogo e demógrafo da Universidade de Albany, disse que o estigma do consumo de drogas pode levar as pessoas a subnotificá-lo, então a verdadeira taxa do distúrbio pode ser ainda maior.
As overdoses fatais também dispararam entre os idosos. De 2002 a 2021, a taxa de mortes por overdose quadruplicou de 3 para 12 por 100.000, relataram Humphreys e Chelsea Shover, coautora, na JAMA Psychiatry em março, usando dados dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças. Essas mortes foram intencionais, como suicídios, e acidentais, refletindo interações medicamentosas e erros.
A maioria dos transtornos por uso de substâncias entre idosos envolve medicamentos prescritos, não drogas ilegais. E como a maioria dos beneficiários do Medicare toma vários medicamentos, “é fácil ficar confuso”, disse Humphreys. “Quanto mais complicado o regime, mais fácil cometer erros. E aí ocorre uma overdose.”
Os números até agora permanecem comparativamente baixos - 6.700 mortes por overdose de substâncias em 2021 entre pessoas com 65 anos ou mais - mas a taxa de aumento é alarmante.
“Em 1998, isso é o que as pessoas teriam dito sobre mortes por overdose em geral - o número absoluto era pequeno”, disse Humphreys. “Quando você não reage, você acaba chegando a um estado muito triste.” Mais de 100.000 americanos morreram por overdose de substâncias no ano passado.
O álcool também desempenha um papel importante. No ano passado, um estudo sobre transtornos por uso de substâncias, baseado em uma pesquisa federal, analisou o que os americanos mais velhos estavam usando, observando as diferenças entre inscritos no Medicare com menos de 65 anos (que podem se qualificar por causa de deficiências) e aqueles com 65 anos ou mais.
Dos 2% dos beneficiários com mais de 65 anos que relataram um transtorno ou dependência de uso de substâncias no ano passado - o que equivale a mais de 900.000 idosos em todo o país - mais de 87% abusaram do álcool. (O álcool foi responsável por 11.616 mortes entre idosos em 2020, um aumento de 18% em relação ao ano anterior.)
Além disso, cerca de 8,6% dos distúrbios envolviam opioides, principalmente analgésicos prescritos; 4,3% envolviam maconha; e 2% envolviam medicamentos não opioides prescritos, incluindo tranqüilizantes e ansiolíticos. As categorias se sobrepõem porque “as pessoas costumam usar várias substâncias”, disse William Parish, principal autor e economista da saúde do RTI International, um instituto de pesquisa sem fins lucrativos.
Embora a maioria das pessoas com problemas de uso de substâncias não morra de overdose, as consequências para a saúde podem ser graves: lesões por quedas e acidentes, declínio cognitivo acelerado, câncer, doenças cardíacas e hepáticas e insuficiência renal.
“É particularmente doloroso comparar as taxas de ideação suicida”, disse Parish. Os beneficiários mais velhos do Medicare com transtornos por uso de substâncias têm três vezes mais probabilidades de relatar “sofrimento psicológico grave” do que aqueles sem tais transtornos - 14% versus 4%. Cerca de 7% tiveram pensamentos suicidas, em comparação com 2% que não relataram transtornos por substâncias.
No entanto, muito poucos desses idosos foram submetidos a tratamento no ano passado - apenas 6%, em comparação com 17% dos beneficiários do Medicare mais jovens - ou mesmo fizeram um esforço para procurar tratamento.
A cobertura desigual do Medicare também apresenta obstáculos. A legislação de paridade federal, exigindo a mesma cobertura para saúde mental (incluindo tratamento de dependência) e saúde física, garante benefícios iguais no seguro privado do empregador, nos intercâmbios de saúde estaduais, mercados Affordable Care Act e na maioria dos planos Medicaid.
Mas nunca incluiu o Medicare, disse Deborah Steinberg, advogada sênior de políticas de saúde do Legal Action Center, uma organização sem fins lucrativos que trabalha para expandir a cobertura equitativa.
Os advogados fizeram algumas incursões. O Medicare cobre exames para o rastreio de uso de substâncias e, desde 2020, programas para tratamento de uso de opioides, como clínicas de metadona. Em janeiro, na sequência de uma ação do Congresso, cobrirá o tratamento por uma gama mais ampla de profissionais de saúde e cobrirá o “tratamento ambulatorial intensivo”, que normalmente oferece de nove a 19 horas semanais de aconselhamento e educação. A expansão dos benefícios de telessaúde, estimulados pela pandemia, também ajudaram.
Mas o tratamento mais intensivo pode ser difícil de acessar e o tratamento residencial não é coberto. Os planos Medicare Advantage, com suas redes de profissionais mais limitadas e requisitos de autorização prévia, são ainda mais restritivos. “Vemos muito mais reclamações de beneficiários do Medicare Advantage”, disse Steinberg.
“Na verdade, estamos fazendo progressos”, acrescentou ela. “Mas as pessoas estão tendo overdoses e morrendo por falta de acesso ao tratamento.” Seus médicos, desacostumados a diagnosticar o abuso de substâncias em idosos, também podem ignorar os riscos. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES
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Fonte: https://www.estadao.com.br/lifestyle/o-abuso-de-substancias-esta-aumentando-entre-idosos-americanos/
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