Se o resultado das eleições de 2022 tivesse sido ditado pelos eleitores evangélicos, Jair Bolsonaro estaria no Palácio do Planalto.
Afinal, as pesquisas de intenção de voto —e mesmo as que continuaram
medindo a preferência dos brasileiros depois de abertas as urnas—
confirmam a resistente simpatia que parcela daqueles fiéis nutre pelo
ex-capitão.
Somada ao comportamento de parlamentares da chamada bancada evangélica,
essa constatação tornou sabedoria convencional afirmar que pentecostais e
neopentecostais seriam
o arrimo mais entusiasmado do discurso e das iniciativas políticas da
extrema direita sobre segurança, educação e normas de conduta privada.
A pesquisa do Datafolha,
realizada entre 24 e 28 de junho com paulistanos de fé evangélica,
desaconselha generalizações apressadas. Além de constatar a diversidade
de opiniões naquele grupo, a sondagem atestou que a maioria está
distante das posições extremadas dos bolsonaristas raiz.
De fato, parcela majoritária dos evangélicos repudia o porte de armas
pelos cidadãos (66%); é contra o ensino em casa (77%); rejeita a
condenação e a prisão da mulher que resolve abortar (53%); declara-se a
favor de que as escolas ofereçam educação sexual (74%) e de que suas
igrejas acolham homossexuais e pessoas trans (86%); enfim, considera que
homens e mulheres devem ter papel igual na família (81%) e na sociedade
(89%).
A parcela que adere à agenda extremista varia conforme o assunto, mas
raramente ultrapassa 1 a cada 4 entrevistados, tamanho estimado do
bolsonarismo irredutível.
Os entrevistados também preferem que a disputa eleitoral não seja levada aos cultos. A maioria não gosta que pastores apoiem e
indiquem candidatos, recomendem em quem não votar ou se valham do
púlpito para falar de assuntos relacionados a eleições. Oito em cada dez
dizem que jamais votaram em alguém indicado por pastor.
Por se limitar ao município de São Paulo, a pesquisa obviamente não
permite que se extrapolem os seus resultados para todo o país. Mas, com a
cautela necessária, é plausível dizer que, no conjunto, os fiéis
evangélicos não parecem destoar da maioria dos brasileiros, conservadora
e profundamente religiosa. Afinal, esse é o país onde "vá com Deus" e
"fique com Deus" são expressões de amabilidade que mais se ouvem no dia a
dia, substituindo o "bom trabalho" ou o "bom descanso".
Em resumo, a extrema direita,
da qual os evangélicos são parte significativa, é barulhenta, porém
minoritária. Majoritário é o conservadorismo enraizado na pluralidade
religiosa que caracteriza o país.
Eis o verdadeiro limite à agenda progressista.
* Professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, é pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)
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