“O que o título acima quer dizer?”, pergunta-me a
leitora assustada, nesta segunda-feira. Imagino-a levando a mão ao
ventre e sentido a dor que essa ideia traz consigo: “Arrancar o útero
fora”.
Passamos todos por processos na vida, como indivíduos e como grupos.
No caso específico das mulheres mais jovens, hoje em dia, intriga-me o
fato que, ao lado de expressões em que “útero” ocupa o lugar do “saco”
como exemplo de coragem (o que reconheço como verdade para as mulheres,
uma vez que dar à luz sempre foi um indício da força do sexo feminino
que me encanta), a tendência a recusar a função em si do útero (gerar
filhos) seja crescente.
Mas, para além do fato evidente de que as pessoas podem fazer o que quiserem com seus corpos (vamos deixar isso claro antes que algum inteligentinho venha encher o nosso saco), um novo fenômeno me chamou atenção nos últimos tempos: o antinatalismo.
Você não sabe o que é? Não, nada tem a ver com algo contra o Natal cristão, apesar de, sim, ter a ver com a ideia de ser contra o nascimento de crianças.
Antinatalismo, aparentemente, surgido entre europeias entediadas (como quase todo europeu), é o seguinte: mulheres jovens tiram o útero logo cedo a fim de marcar sua recusa à maternidade como ato ético sublime. Sim: arrancar o útero como ética.
Há algum tempo tenho evitado a palavra ética, como também as palavras energia e cabala, porque, de tanto serem usadas, já não significam nada. Mas confesso que o uso da palavra “ética” ao lado de “arrancar o útero” me parece incomum. Por que uma menina chegaria à conclusão que deve tirar o útero para ser ética?
Claro que não ter filhos pode ser visto como algo bom de várias formas, algumas confessáveis, outras inconfessáveis.
As confessáveis, que me soam falsas, são do tipo: não vou ter filhos porque já tem criança demais no mundo, melhor adotar uma pobre, a espécie humana é excessivamente predadora, logo, melhor sumir da face da Terra, deixemos o planeta para golfinhos e baratas, são tão fofos!
As inconfessáveis (que acredito serem mais verdadeiras) são do tipo: não vou ter filhos porque criança custa caro, dura muito tempo, enche o saco, atrapalha a Netflix, me impede de viajar quando quero e, pior, faz eu me sentir responsável por ela, e isso é uma forma da opressão patriarcal, além de que, é claro, filhos dão rugas, derrubam o seio e atrapalham o mercado de trabalho.
Devo ir com calma, porque a sensibilidade excessiva de uma humanidade que optou pelo retardo mental como “ética” pode entrar em agonia diante dos meus argumentos inconfessáveis para não ter filhos.
O fato é que os argumentos confessáveis aparecem no discurso de algumas antinatalistas. Há um interessante cruzamento delas com uma forma de veganismo radical.
A ideia é que as mulheres que procriam colocariam (antieticamente) mais humanos na Terra, que seguiriam com seus modos de torturar os pobres dos animais. Muito comumente, antinatalistas são veganas, mas não necessariamente o contrário é fato.
Para ouvidos atentos, os argumentos inconfessáveis soam machadianos: o niilista Brás Cubas, criação de Machado de Assis (1839-1908), afirma no final do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas” que pelo menos não teve filhos e, por isso, não passou adiante a herança da miséria humana.
Entretanto há no niilista uma certa dignidade que não há nas antinatalistas. O niilista acha a humanidade um lixo e se vê como um ser cruel e cínico. A antinatalista se leva muito a sério e se vê como um ser sublime que quer salvar o mundo através do que é, na verdade, pura preguiça, narcisismo, falta de amadurecimento, recusa de responsabilidade e por aí vai. A antinatalista é uma mimada que mente sobre o seu próprio ato. Mas há algo a mais por detrás do seu ato.
Orígenes (184-253), grande padre da patrística grega, um dos primeiros grandes filósofos do cristianismo, ficou conhecido não só pela sua obra mas também pela autocastração como forma de combate a concupiscência da carne. Isso meio que queimou o filme dele na tradição e com os parceiros. Vejo alguma semelhança entre a autocastração de Orígenes e a automutilação das antinatalistas. Em ambos os casos há um horror ao sexo e ao que é humano. Contra o que os inteligentinhos pensam, engravidar uma mulher é um ato muito erótico.
E isso tudo acontece nas barbas dos psicanalistas que ficam brincando de cientistas políticos enquanto o horror ao sexo cresce.
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Mas, para além do fato evidente de que as pessoas podem fazer o que quiserem com seus corpos (vamos deixar isso claro antes que algum inteligentinho venha encher o nosso saco), um novo fenômeno me chamou atenção nos últimos tempos: o antinatalismo.
Você não sabe o que é? Não, nada tem a ver com algo contra o Natal cristão, apesar de, sim, ter a ver com a ideia de ser contra o nascimento de crianças.
Antinatalismo, aparentemente, surgido entre europeias entediadas (como quase todo europeu), é o seguinte: mulheres jovens tiram o útero logo cedo a fim de marcar sua recusa à maternidade como ato ético sublime. Sim: arrancar o útero como ética.
Há algum tempo tenho evitado a palavra ética, como também as palavras energia e cabala, porque, de tanto serem usadas, já não significam nada. Mas confesso que o uso da palavra “ética” ao lado de “arrancar o útero” me parece incomum. Por que uma menina chegaria à conclusão que deve tirar o útero para ser ética?
Claro que não ter filhos pode ser visto como algo bom de várias formas, algumas confessáveis, outras inconfessáveis.
As confessáveis, que me soam falsas, são do tipo: não vou ter filhos porque já tem criança demais no mundo, melhor adotar uma pobre, a espécie humana é excessivamente predadora, logo, melhor sumir da face da Terra, deixemos o planeta para golfinhos e baratas, são tão fofos!
As inconfessáveis (que acredito serem mais verdadeiras) são do tipo: não vou ter filhos porque criança custa caro, dura muito tempo, enche o saco, atrapalha a Netflix, me impede de viajar quando quero e, pior, faz eu me sentir responsável por ela, e isso é uma forma da opressão patriarcal, além de que, é claro, filhos dão rugas, derrubam o seio e atrapalham o mercado de trabalho.
Devo ir com calma, porque a sensibilidade excessiva de uma humanidade que optou pelo retardo mental como “ética” pode entrar em agonia diante dos meus argumentos inconfessáveis para não ter filhos.
O fato é que os argumentos confessáveis aparecem no discurso de algumas antinatalistas. Há um interessante cruzamento delas com uma forma de veganismo radical.
A ideia é que as mulheres que procriam colocariam (antieticamente) mais humanos na Terra, que seguiriam com seus modos de torturar os pobres dos animais. Muito comumente, antinatalistas são veganas, mas não necessariamente o contrário é fato.
Para ouvidos atentos, os argumentos inconfessáveis soam machadianos: o niilista Brás Cubas, criação de Machado de Assis (1839-1908), afirma no final do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas” que pelo menos não teve filhos e, por isso, não passou adiante a herança da miséria humana.
Entretanto há no niilista uma certa dignidade que não há nas antinatalistas. O niilista acha a humanidade um lixo e se vê como um ser cruel e cínico. A antinatalista se leva muito a sério e se vê como um ser sublime que quer salvar o mundo através do que é, na verdade, pura preguiça, narcisismo, falta de amadurecimento, recusa de responsabilidade e por aí vai. A antinatalista é uma mimada que mente sobre o seu próprio ato. Mas há algo a mais por detrás do seu ato.
Orígenes (184-253), grande padre da patrística grega, um dos primeiros grandes filósofos do cristianismo, ficou conhecido não só pela sua obra mas também pela autocastração como forma de combate a concupiscência da carne. Isso meio que queimou o filme dele na tradição e com os parceiros. Vejo alguma semelhança entre a autocastração de Orígenes e a automutilação das antinatalistas. Em ambos os casos há um horror ao sexo e ao que é humano. Contra o que os inteligentinhos pensam, engravidar uma mulher é um ato muito erótico.
E isso tudo acontece nas barbas dos psicanalistas que ficam brincando de cientistas políticos enquanto o horror ao sexo cresce.
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