por Luís Nassif*
Papel do economista não é seguir a Bíblia do mercado, como crentes da financeirização: é buscar soluções para grandes princípios da economia.Os juristas principiológicos são aqueles que defendem a importância dos princípios jurídicos na interpretação e aplicação do Direito. Para eles, os princípios não são apenas regras gerais, mas sim normas fundamentais que orientam o ordenamento jurídico como um todo. São essenciais para mostrar o rumo do direito e impedir a manipulação dos conceitos.
Já existem princípios claros para as políticas sociais: há que se criar instrumentos de compensação que reduzam as disparidades sociais e as oportunidades desiguais aos brasileiros.
O mesmo deveria servir para a política econômica. Os princípios deveriam ser:
- promoção do desenvolvimento interno;
- prioridade ao que é produzido internamente;
- prioridade à geração de bons empregos;
- criação de ambiente propício ao desenvolvimento dos negócios;
- defesa da empresa nacional.
Definidos os princípios, haveria o questionamento de quais medidas atenderiam a essas prioridades.
Por exemplo, política de conteúdo nacional. A industrialização brasileira dos anos 80 foi fundamentalmente estimulada pela crise do petróleo e da balança comercial, que obrigou a Petrobras a investir pesadamente na substituição de equipamentos. O resultado foram polos industriais vigorosos, que se mantiveram mesmo depois da crise.
A alegação de que o produto nacional seria mais caro que o importado e, portanto, reduziria a competitividade da empresa compradora, é facilmente contornada por outro princípio: o Estado deve apoiar indústrias nascentes, e que demonstrem competitividade em um prazo determinado.
Por exemplo, a indústria naval renasceu com um produto mais caro que o importado, é evidente. Mas há uma linha de aprendizado. A legitimação da indústria nascente depende dessa linha, da diferença inicial de preço em relação ao importado e do tempo necessário para se tornar competitiva.
Outro ponto relevante é em relação à concorrência predatória de produtos importados. Tome-se o caso do aço chinês. Sobre o brasileiro há a vantagem do câmbio chinês – muito mais desvalorizado -, e da escala. Se deixar solto, liquida com a indústria siderúrgica nacional. Por outro lado, há indústrias que dependem de aço mais barato para se tornarem exportadoras.
A solução é antiga? o drawback verde-amarelo.
O Drawback Verde-Amarelo foi um regime aduaneiro especial que consistia na suspensão ou isenção de tributos incidentes dos insumos importados e/ou nacionais vinculados a um produto a ser exportado.
O Drawback Verde-Amarelo era dividido em duas modalidades:
- Modalidade I: Insumos importados.
- Modalidade II: Insumos nacionais.
Na modalidade I, o exportador podia suspender ou isentar o pagamento do Imposto de Importação (II), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), ICMS, AFRMM e demais taxas para a emissão de Licença de Importação (LI) e outras que não correspondessem à efetiva contraprestação de serviços.
Na modalidade II, o exportador podia suspender ou isentar o pagamento do PIS, COFINS e IPI na aquisição de insumos nacionais para a fabricação de produtos destinados à exportação.
Para ter direito ao Drawback Verde-Amarelo, as empresas precisavam atender aos seguintes requisitos:
- Ser exportadora regular;
- Estar habilitada no regime aduaneiro especial de drawback;
- Ter o produto exportável registrado no Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex).
Qual o problema de se retomar esse modelo? Simplesmente a superstição econômica, a ideia malfadada e desmentida a toda hora que o mercado consegue o equilíbrio naturalmente.
Outro instrumento que tem que ser repensado: os estoques reguladores. Quando explodiu o preço do arroz, fui conferir e os estoques reguladores tinham virado fumaça a partir do governo Temer-Bolsonaro. E sempre foram instrumentos de combate a quebras de safra e de defesa dos agricultores, em caso de produção excessiva.
Nos anos 50, com o país vivendo uma crise cambial intermitente, coube a um médico – Oswaldo Aranha – criar um sistema de câmbio múltiplo que assegurou o crescimento da economia, mesmo em meio a marolas gigantescas. Do Plano Real em diante, procurou-se o equilíbrio, e obteve-se a estagnação.
O papel do economista não é seguir a Bíblia do mercado, como crentes da financeirização: é buscar soluções para os grandes princípios que devem reger a economia.
*Jornalista brasileiro. Foi colunista e membro do conselho editorial da Folha de S.Paulo, escrevendo por muitos anos sobre economia neste jornal. Wikipédia
Fonte: https://jornalggn.com.br/coluna-economica/a-hora-dos-economistas-principiologicos-por-luis-nassif/
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